20% das mulheres consideram sair ou saem do emprego por menopausa

1 de fevereiro de 2023
Divulgação/Bayer

Quando sentiu os primeiros calores e falhas de memória, Erica Barbagalo, líder jurídica da Bayer, não conseguia relacionar com a menopausa

A empreendedora Miriam Paoli estava no melhor momento da sua vida profissional quando começou a ter os primeiros sintomas da perimenopausa, a transição do corpo para a menopausa, o que geralmente dura alguns anos. Ela era consultora estratégica de comunicação de uma multinacional do setor industrial quando teve os famosos “brainfogs”, ou névoas mentais, durante o trabalho. “A primeira vez foi quando eu estava defendendo um orçamento. E durante três segundos eu não sabia nem onde estava nem o que estava falando.”

Paoli entrou no climatério aos 47 anos. “Não sabia que existia essa palavra nem que existia uma etapa chamada perimenopausa”, diz ela, hoje CEO e cofundadora da No Pausa, organização latino-americana com o objetivo de visibilizar a menopausa, na sociedade e no ambiente corporativo. 

Globalmente, as perdas de produtividade relacionadas à menopausa podem exceder US$ 150 bilhões (R$ 764 bilhões) anualmente, segundo a consultoria americana Frost & Sullivan. 

E as grandes organizações, principalmente nos Estados Unidos e Europa, estão começando a pensar nisso e garantindo não só que haja espaço para falar sobre o assunto, mas que as mulheres tenham licenças e outros benefícios relacionados a esse momento da vida. “As políticas de menopausa no trabalho têm baixo custo e alto impacto”, diz Paoli.

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Licença-menopausa e outros benefícios

A No Pausa trabalha com empresas, principalmente multinacionais, com o programa Menopausa no Trabalho, para ajudar as companhias a gerar políticas para reter as profissionais 40+. “A gente não pode ter uma política de climatério e menopausa se essa empresa ainda não falou de amamentação e menstruação, por exemplo”, diz a cofundadora. 

Miriam Paoli, CEO e cofundadora da No Pausa, ajuda empresas a desenhar políticas voltadas para a menopausa no ambiente corporativo

Para a gigante química Quaker Houghton, por exemplo, elas desenharam uma campanha de conscientização, mudaram o tecido dos uniformes das mulheres nas fábricas, adicionaram dispensers de água e criaram políticas que permitem que as funcionárias tenham flexibilidade no trabalho durante os sintomas. “Precisamos ser muito cuidadosas para não mostrar isso como uma barreira e sim uma oportunidade”, diz Paoli.

Em janeiro deste ano, propostas para mudar as leis do Reino Unido e dar direitos às mulheres na menopausa foram, em partes, rejeitadas pelo governo, com o argumento de que poderiam ser discriminatórias. Mas o prefeito de Londres, Sadiq Khan, introduziu a licença-menopausa para as funcionárias da prefeitura em março do ano passado e afirmou que os espaços de trabalho seriam inclusivos, com áreas com temperatura controlada, por exemplo.

O Banco da Irlanda passou a oferecer licença remunerada de 10 dias por ano para as funcionárias com sintomas físicos ou psicológicos relacionados à menopausa. Assim como a varejista britânica ASOS, que anunciou que suas funcionárias teriam flexibilidade no trabalho e poderiam pedir licença sem aviso prévio ou trabalhar de casa. Enquanto isso, aalguns dos maiores sindicatos da Austrália protestam para obter licenças menstruais e de menopausa.

O custo da menopausa para a liderança feminina

Até 2030, a população mundial de mulheres na menopausa e pós-menopausa deverá chegar a 1,2 bilhão, com 47 milhões novas mulheres a cada ano. Nos EUA, 20% da força de trabalho está vivendo a menopausa, de acordo com a associação de RH Society for Human Resource Management. 

Quando sentiu os primeiros sintomas da menopausa, fogachos e falhas de memória, Erica Barbagalo, head jurídica da Bayer, tinha em torno de 50 anos e ainda não conseguia dar um nome para aquilo, nunca havia falado sobre o assunto com sua mãe ou as tias. A falta de informação atravessa não só a vida pessoal, mas a profissional também. “A fase em que as mulheres chegam na menopausa é também o momento em que elas estão no ápice profissional”, diz a executiva. 

O climatério, a fase de transição da fase reprodutiva da mulher para a não-reprodutiva, tem início por volta dos 40 anos e se estende em média até os 65 anos. E coincide com o momento em que muitas mulheres estão assumindo – e até recusando – cargos de liderança enquanto vivem diversos sintomas, de cansaço à depressão – muitas vezes sem entender de onde eles vêm.  

Segundo pesquisa da empresa americana Biote, 40% dizem que os sintomas interferem na performance e produtividade e uma em cada cinco deixaram ou consideraram deixar seus empregos. “As empresas não podem abrir mão de ter essas profissionais, essa experiência e esse peso de economia fora dos seus quadros”, diz Barbagalo.

Sem informação suficiente para entender as mudanças pelas quais seus corpos estão passando, muitas mulheres se sentem constrangidas ao ter ondas de calor e brainfogs no trabalho, com receio de que isso possa prejudicar suas carreiras – e podem chegar a abandonar seus empregos por isso. 

Um estudo conduzido no Reino Unido mostrou que 1 em 10 mulheres deixaram seus trabalhos devido a sintomas da menopausa.  “A gente ainda vive isso de uma maneira muito vergonhosa, mas a menopausa não tem nenhum impacto no nosso trabalho e não impede a nossa capacidade de liderar”, diz Paoli, CEO da No Pausa. 

Mulheres e líderes precisam falar sobre

Mulheres na menopausa parecem menos confiantes e estáveis emocionalmente, segundo uma pesquisa  publicada na revista Academy of Management, duas características importantes para a liderança. Isso a menos que elas falem abertamente sobre o assunto. “Quando eu assumo que estou com um calorão ou que tive uma enxaqueca relacionada à menopausa e continuo trabalhando, sendo eficiente e entregando, eu sou uma referência não só para a minha equipe, mas para outras mulheres”, diz Barbagalo.

Uma pesquisa da startup de benefícios de fertilidade Carrot Fertility mostra que 77% das mulheres se sentem desconfortáveis em falar com os executivos das empresas em que trabalham sobre menopausa e 63% em discutir o tema com o departamento de RH. “Quando a organização e os gestores não falam sobre o assunto, os vieses inconscientes sobre envelhecer prevalecem e acabam por isolar e até excluir a mulher de momentos importantes na organização e até da sua própria carreira”, diz Fabi Granzotti, gerente de projetos da Maturi, voltada para o mercado de trabalho 50+.

Etarismo e menopausa

Para além do mundo corporativo, a menopausa é um mercado em expansão que foi avaliado em US$ 15,4 bilhões (R$ 78,5 bilhões) em 2021 e que deve chegar a US$ 24,4 bilhões (R$ 124,4 bilhões) em 2030, segundo relatório da empresa de pesquisa Grand View Research.

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Ainda falta informação e apoio para o que já representa 30% da vida de uma mulher moderna – no Brasil, a expectativa de vida de uma mulher é de cerca de 80 anos. “Envelhecer é um processo natural a todos os seres vivos, mas sabemos que o etarismo é muito mais acentuado em relação às mulheres”, diz Fabi Granzotti, que vê esse assunto sendo mais debatido hoje. 

A executiva Erica Barbagalo defende fazer as pazes com o tema, que atravessa a vida das mulheres assim como a puberdade e, para algumas, a maternidade. “A menopausa é mais um ciclo e tem que ser encarada desta forma: sem mitos, vergonhas e tabus que sempre existiram, mas que minha geração está ajudando a quebrar.”