Morre Rita Lee, um dos maiores ícones do rock nacional, aos 75 anos

9 de maio de 2023
Guilherme Samora

Rita Lee lançou 315 músicas, nove livros e se dedicou a causas animais e políticas

Ícone pop, cantora e uma das pioneiras do rock nacional, Rita Lee morreu na segunda-feira (8), em São Paulo, aos 75 anos. Segundo comunicado no Instagram da cantora, ela “faleceu em sua residência, em São Paulo, capital, no fim da noite, cercada de todo o amor de sua família, como sempre desejou.”

Rita Lee havia sido diagnosticada com um tumor no pulmão esquerdo em maio de 2021. Depois de um ano de sessões de imunoterapia e radioterapia, seu filho Beto Lee anunciou em abril de 2022 que ela estava curada. Em fevereiro deste ano, foi internada e saiu do hospital em 4 de março. 

A artista, uma das maiores do país, foi destaque da lista 50 Over 50 da Forbes em 2022, que reúne grandes nomes que chegaram à maturidade com mais relevância e influência

Carreira

Em mais de 50 anos de carreira, Rita lançou 315 músicas, que foram regravadas 638 vezes. A mais tocada e regravada da última década é “Mania de Você”, segundo o Ecad (Escritório Central de Arrecadação de Direitos). Das dez músicas mais tocadas, quatro são em parceria com o marido, Roberto de Carvalho. 

Nos últimos dez anos, Rita teve mais de 80% de seus rendimentos em direitos autorais vindos de rádio, TV e shows. Sua última música inédita, “Change”, foi lançada em setembro de 2021, depois de um hiato de nove anos.

Em 2022, o Grammy Latino homenageou a cantora pelo conjunto de sua obra, que tem mais de 30 álbuns solo e com o grupo Os Mutantes, que a alçou ao sucesso e ao status de estrela do rock. Rita foi indicada a sete prêmios da academia e venceu em 2001 na categoria Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa, por “3001”.

Longe dos palcos, ela se dedicou à literatura. Lançou nove livros desde 2016, incluindo histórias infantis e sua autobiografia, que se tornou um best-seller. Em 2017, foi a autora brasileira que mais vendeu livros na categoria não-ficção no país – um total de 98 mil exemplares só naquele ano. 

Suas obras de literatura infantil, como a série “Dr. Alex” e “Amiga Ursa”, trazem temáticas de meio ambiente e do mundo animal. Rita era vegana e foi uma amante e defensora dos animais – teve diversos bichos de estimação, como gatos, cachorros, pássaros e adotou até mesmo uma jaguatirica vítima de maus tratos.

Origem

Filha de imigrantes, com pai americano e mãe italiana, a artista nasceu em São Paulo, em 31 de dezembro de 1947. Começou a tocar piano como uma permuta entre o pai, dentista, e a pianista Magdalena Tagliaferro, e logo mostrou seu talento. 

Quando se formou no colégio, tentou ser secretária. Mais tarde, iniciou o curso de comunicação da USP, mas nunca terminou.

Aos 15 anos, começou a tocar bateria e foi backing vocal e integrante de grupos musicais durante a adolescência. Mas seu sucesso começou no grupo Os Mutantes, em 1966, durante o Movimento Tropicalista, ao lado dos irmãos Sérgio Dias e Arnaldo Baptista, com quem se casou. O grupo ganhou notoriedade após acompanhar Gilberto Gil na apresentação de “Domingo no Parque” no 3º Festival de MPB da TV Record, em 1967. 

Após o fim do relacionamento com Arnaldo em 1972, Rita foi expulsa da banda pelo ex-marido. Em seguida, passou a integrar a banda Tutti Frutti. Entre os hits com o novo grupo estão “Agora Só Falta Você”, “Esse Tal de Roque Enrow” e “Ovelha Negra”, do disco “Fruto Proibido”, de 1975, um sucesso estrondoso que rendeu a Rita o título de Rainha do Rock Brasileiro, apelido do qual não era fã.

Nesse momento, Rita já vivia um relacionamento com o guitarrista Roberto de Carvalho e, a partir de 1979, os dois começaram a fazer discos e shows juntos. São dessa época os sucessos “Chega Mais”, “Doce Vampiro” e  “Mania de Você”, do álbum “Rita Lee”.

Em 1982, é lançado “Rita Lee e Roberto de Carvalho”, mais conhecido como “Flagra”, em que o casal estampa a capa e traz os sucessos “Flagra” e “Cor-de-Rosa Choque”.

Ativismo

Além da causa animal, Rita foi voz ativa para outras questões políticas, especialmente durante a ditadura militar. 

Suas músicas se referiam à sexualidade feminina e abordavam temas considerados tabus à época, como menstruação e menopausa. A artista teve muitas de suas letras censuradas e chegou a ser presa em 1976, grávida do primeiro filho, condenada a um ano de prisão domiciliar por porte e uso de maconha. Ela passou 15 dias detida e foi solta após uma visita da cantora Elis Regina.

Segundo Rita, sua prisão foi um truque do regime, incomodado com uma figura que representava a liberdade feminina em um período de muito conservadorismo. A artista chegou a dizer que preferia um apelido que relembre esse seu papel do que o de “rainha do rock”, como é conhecida por muitos. “Gosto mais de ser chamada de ‘padroeira da liberdade’ do que ‘rainha do rock’, que acho um tanto cafona”, disse em entrevista à revista Rolling Stone Brasil. 

Rita revolucionou na música e na política, mas também deixou um legado no mundo da moda. Seus figurinos extravagantes, metalizados e cheios de cores e estampas são sua marca registrada – assim como os cabelos e a franja ruivos e os óculos redondos. 

Em meados de 2014 começou a deixar os cabelos brancos e abandonou o icônico visual ruivo. Em entrevista de 2015 disse “Adorei ter sido ruiva, mas encheu o saco”. No ano seguinte, lançou sua autobiografia.

Rita deixa o marido, Roberto de Carvalho, e três filhos. O também guitarrista Beto, nascido em 1977, João (1979) e Antônio (1981) , e os netos Izabela e Arthur.

4. Ativismo Ela era feminista nas músicas e na postura, mas não se declarava assim. "Nunca carreguei bandeira de feminismo. Eu era a única menina roqueira no meio de um clube só de bolinhas, cujo mantra era: para fazer rock tem que ter culhão. Eu fui lá com meu útero e meus ovários – e me senti uma igual, gostassem eles ou não. Sou do tempo em que o feminismo era queimar sutiã no meio da rua, e eu nunca tive peito suficiente para sequer usar sutiã. Talvez eu seja uma feminista gauche."more
Rita Lee, 1972
Rita Lee, 1972
3. Pioneirismo Temas que eram tabu na época em que ela surgiu no cenário da música, como sexo, drogas e menstruação, viraram algumas das músicas mais tocadas nos rádios. Lança Perfume, Mania de Você e Cor de Rosa Choque trazem esses temas.more
Rita Lee se apresentando no Coliseu dos Recreios em julho de 2008 em Lisboa, Portugal
Rita Lee no Credicard Hall em 2010
Caetano Veloso, Rita Lee e Gilberto Gil em carro alegórico da Escola de Samba Águia de Ouro durante carnaval de 2012 no Sambódromo do Anhembi, em São Paulo