Presidente do Inhotim: “Movimento de mulheres na liderança de museus é global"

7 de maio de 2024
Ana Clara Martins

Paula Azevedo passou pelo Instituto Tomie Ohtake, pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo e pelo Instituto de Arte Contemporânea antes de chegar ao Inhotim

O Instituto Inhotim está inserido em um contexto rural, em Minas Gerais, fora do eixo São Paulo-Rio. “Não é um museu de passagem, é um destino. Você precisa se programar para ir”, diz a diretora presidente, Paula Azevedo. Ainda assim, foi esse o destino escolhido por ela para comemorar o seu aniversário de 40 anos, muito antes de sonhar estar à frente do maior museu a céu aberto da América Latina. “É de uma força hiperbólica: o verde é muito verde, as plantas são gigantes e as obras, monumentais.”

É a primeira mulher no cargo, em meio a um movimento de figuras femininas à frente de importantes instituições artísticas no Brasil, na América Latina e em todo o mundo. “A desigualdade de gênero é histórica, mas o meu caso é um exemplo de mudança. E, assim como eu, há mulheres assumindo cargos de direção em diversos museus do mundo”, afirma, citando as lideranças do Louvre, em Paris, do Malba, em Buenos Aires, e do Brooklyn Museum, em Nova York. “É um movimento mundial em diversas áreas, e com os museus não é diferente.”

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Azevedo construiu sua carreira em grandes instituições e tem experiência em gestão de coleções privadas. Antes de assumir a presidência do Inhotim, passou pelo Instituto Tomie Ohtake, pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo – trabalhando ao lado da sua mentora Milu Villela, que presidiu o MAM por 24 anos – e pelo Instituto de Arte Contemporânea.

Museu (a céu) aberto

Ainda como vice-presidente, a executiva ajudou a estruturar o programa “Inhotim de Todos e Para Todos”, com foco na democratização do acesso ao museu e na sustentabilidade a longo prazo. “O museu é para todos quando a gente não cobra ingresso e dá acesso a todos os tipos de pessoas.”

O ponto de virada partiu da maior doação individual da história da cultura brasileira, feita pelo fundador, Bernardo Paz, que transferiu ao museu 326 obras da sua coleção de arte contemporânea. Além de um contrato com a Vale, que vai destinar R$ 400 milhões ao Instituto ao longo de 10 anos.

Azevedo e Lucas Pessôa, então presidente do Inhotim, formaram um conselho com 30 membros, entre eles Roberto Setubal, copresidente do conselho do banco Itaú, Fabio Barbosa, CEO da Natura &Co, e Jandaraci Araújo, cofundadora do Conselheira 101. “Estabelecemos as diretrizes necessárias para uma instituição perene e alinhada com seu tempo. Agora, o meu desafio é fazer a implementação”, diz Azevedo.

Fundado em 2006, o museu continua inovador e repercutindo pautas atuais graças aos olhares de artistas diversos. Das 18 galerias com exposições permanentes no Inhotim, 50% são dedicadas a artistas mulheres, como Adriana Varejão, Doris Salcedo, Claudia Andujar e Yayoi Kusama. Neste ano, as exposições temporárias incluem nomes como Grada Kilomba, Rebeca Carapiá, Rivane Neuenschwander e Pipilotti Rist. No ano passado, também foi formado um comitê de equidade racial.

A presidente está à frente dos acervos artístico, botânico e de arquitetura. “Acima de tudo, sou uma pessoa muito relacional, e acho que o nosso principal acervo são as pessoas”, diz ela, citando tanto os visitantes quanto os funcionários.

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Arte como carreira e terapia

A habilidade com pessoas veio de casa, circulando entre os círculos sociais dos pais. Enquanto a mãe, modelo, vivia cercada de artistas, o pai trabalhava no mercado financeiro. “Eles eram muito diferentes e eu sempre convivi com grupos opostos.”

Azevedo iniciou a carreira no mundo das artes trabalhando em uma galeria, mas foi inserida nesse universo desde cedo. “Minha mãe incentivou meu interesse pela arte de maneira geral.”

O networking, importante para qualquer carreira, foi especialmente relevante para ajudar a captar investimentos para as organizações em que atuou. Hoje, ela é responsável pelo Anoitecer Inhotim, evento anual de fundraising do Instituto. Também faz parte do conselho de administração do IAC (Instituto de Arte Contemporânea).

Azevedo se reveza entre São Paulo e Brumadinho, próximo a Belo Horizonte, onde fica o Instituto. Seu trabalho também envolve viajar pelo Brasil e pelo mundo, visitando feiras e conhecendo novos museus. “Sou uma dessas pessoas privilegiadas que trabalha com o que gosta. Assim como os cariocas vão à praia ver o mar, quando eu preciso estar comigo, eu vou ao museu.”

Conheça outras mulheres que lideram grandes museus no mundo

Teresa Bulgheroni, presidente do Malba (Argentina) Teresa Bulgheroni preside o Conselho de Administração e, desde 2020, é a presidente da Fundação Malba, na Argentina. Bulgheroni tem passagens pelo Teatro Colón, onde também foi presidente, e pelo Comitê Internacional da Fundação ArteBA. Ainda integrou diversos conselhos de administração e comitês de museus e instituições culturais no país e no exterior, como The Metropolitan Opera House e El Museo del Barrio, ambos em Nova York, e o Museu do Prado e o Teatro Real de Madrid, na Espanha. “É um processo natural que as mulheres ocupem espaços importantes no mundo da arte e isso está acontecendo em todas as áreas profissionais. Aqui no Malba, temos como uma das políticas de aquisição e incorporação de obras de artistas mulheres ao acervo para maior igualdade de gênero. Além disso, temos realizado muitas exposições com o objetivo de revalorizar artistas mulheres esquecidas pelo tempo ou não levado em conta pela história da arte”, diz Bulgheroni. more
Laurence des Cars, presidente do Louvre (França) Em 2021, Laurence des Cars se tornou a primeira mulher a assumir a presidência do Museu do Louvre, um dos cargos mais importantes do mundo das artes, em mais de dois séculos. Ela estudou História da Arte na École du Louvre, a escola do museu. Sua carreira envolveu a liderança do projeto do Louvre Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, por meio de um licenciamento da marca. Também foi nomeada diretora do Musée d’Orsay e do Orangerie, ambos em Paris.more
Eliana Hidalgo Vilaseca, diretora da Fundación EACHEVE (Equador) A historiadora de arte Eliana Hidalgo Villaseca começou a carreira como assistente do departamento de arte latino-americana da Sotheby's em Nova York e, ao retornar ao Equador, fundou e assumiu a posição de diretora da Fundação Eacheve, em 2014. "Nos últimos anos tem havido um crescimento nas nomeações de mulheres para liderar os cargos mais altos nas instituições”, diz Villaseca. Antes disso, foi coordenadora do Museu Municipal de Guayaquil e cofundou e codirigiu a galeria de arte contemporânea NoMíNIMO, projeto focado na formação de públicos e colecionadores de 2010 a 2013.more
Mariet Westermann, diretora do grupo de museus Guggenheim Vice-reitora do campus da N.Y.U. em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, Westermann foi nomeada diretora e diretora-executiva do grupo de museus. É a primeira mulher no cargo, supervisionando a Fundação e a instituição em Nova York, além dos museus em Veneza, Bilbao, na Espanha, e o futuro Guggenheim Abu Dhabi.more
Amalia Amoedo, fundadora e presidente da Fundación Ama de Amoedo (Uruguai) Amalia Amoedo, fundadora da Fundação Ama Amoedo, quer incentivar a presença de artistas da região e ampliar sua visibilidade no cenário artístico global. Nascida na Argentina, Amoedo vive e trabalha no Uruguai. "A liderança na arte requer visão, compromisso e um profundo respeito pela diversidade de vozes e perspectivas. Quero continuar lançando o caminho de outras mulheres líderes que sabem fortalecer o panorama da arte latino-americana e da indústria cultural”, diz Amoedo. Atualmente, ela é membro do Comitê de Aquisições do Círculo Internacional da América Latina do Centro Pompidou (Paris), do Comitê do Fundo de Arte Latino-Americano e Caribenho do MoMA (Nova York), do Comitê Internacional e ex-presidente da Fundação arteBA (Buenos Aires), da Associação de Amigos do Museu de Arte Moderno de Buenos Aires e do Conselho Consultivo Internacional da Sociedade das Américas (Nova York).more
Kimberly Panicek Trueblood, presidente do Brooklyn Museum (EUA) Kimberly Panicek Trueblood foi anunciada como presidente e diretora de operações do Brooklyn Museum em 2021. É o segundo maior museu de arte na cidade de Nova York, e um dos maiores nos Estados Unidos. Trueblood atuou como chefe de gabinete da União Americana pelas Liberdades Civis e como diretora de operações da Casa Branca na Administração Obama de 2013 a 2015. Ela se formou na Universidade de Washington e obteve um mestrado em políticas públicas no Instituto de Estudos Políticos de Paris.more