Logo no início de sua carreira como engenheiro de software, em 2015, o mineiro Bruno Gomes já se deparou com algumas das faces da homofobia no mundo corporativo. Na startup onde trabalhava, em Recife (PE), ele conta que os colegas frequentemente faziam piadas sobre a sexualidade alheia. Por influência da mãe, decidiu não se assumir homossexual. “Ela dizia que isso poderia prejudicar o meu crescimento profissional”, lembra.
Durante essa primeira experiência profissional, Gomes trabalhou no processo de expansão da empresa e precisou morar no Rio de Janeiro e em São Paulo para ajudar na estruturação dos times nesses locais. “Meu chefe era homofóbico”, afirma. “Trabalhávamos juntos desde Recife e tivemos de dividir apartamento nessas mudanças de cidade.”
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Por causa do desconforto de não conseguir ser quem ele realmente era, Gomes decidiu sair em 2016 – atitude que não o livrou do preconceito do ex-gestor. “Fiquei sabendo que, quando ele descobriu que eu era gay, fez vários comentários jocosos sobre eu ter algum tipo de interesse pessoal nele no tempo em que moramos juntos.”
Depois de passar por uma edtech entre 2016 e 2018, o engenheiro de software foi contratado para trabalhar no Nubank, um dos unicórnios brasileiros, com valor de mercado estimado em US$ 25 bilhões. Na fintech, encontrou um outro tipo de ambiente de trabalho. “Fui muito bem recebido e comecei a fazer tudo o que minha mãe mandava eu não fazer, como me autodeclarar gay e fazer tatuagens, entre outras coisas”, conta. “Meu bem-estar e essência eram valorizados e ser gay não era um problema, como parecia no meu primeiro emprego.”
Três anos após sua chegada ao Nubank, o mineiro, que começou como engenheiro de software do time de fraude, logo se tornou gerente sênior. Morando em Berlim, na Alemanha, desde 2019, Gomes diz que seu trabalho é gerenciar pessoas e projetos para facilitar processos. Um dos times do seu guarda-chuva de gestão, por exemplo, é responsável por desenvolver a plataforma de dados do banco digital, que é utilizada por todas as outras áreas para análise de informações e tomadas de decisão.
O desafio de simplificar o emaranhado de dados do Nubank para os demais departamentos da empresa, para ele, é o que alimenta a inovação da fintech. “Inovação é, olhando para o ambiente tecnológico, criar algo novo que facilite a vida e o trabalho das pessoas”, diz Gomes. E é exatamente esse o desejo dele para o futuro próximo: continuar ajudando outros gestores e setores da companhia. “Vejo muito espaço para gerar impacto ainda mais positivo aqui.”
Ao falar especificamente sobre o ecossistema de inovação, Gomes expressa o desejo de que todos pudessem se sentir bem por serem quem realmente são nos locais onde trabalham. “Você nunca sabe se uma empresa vai receber bem alguém LGBTQIA+. É uma roleta-russa”, diz. Para ele, algumas companhias apregoam a diversidade e a inclusão para o mundo externo, mas esquecem de monitorar o ambiente interno. “Muitas vezes, é preciso consultar os colegas para descobrir como se portar. Esse é um dos grandes problemas da retenção.”
Além de trabalharem para a permanência de colaboradores LGBTQIA+, construindo um ambiente de trabalho confortável e inclusivo, as startups brasileiras, para Gomes, devem focar também nas etapas de seleção e contratação. “Um ponto a se considerar é a representatividade de pessoas da empresa contratante no processo seletivo”, diz Gomes. “[Dessa forma] você percebe que se sente mais confortável ou acolhido.”
O maior sonho de Gomes é que um dia não sejam mais necessárias cotas ou ações afirmativas para contratar ou reter comunidades minorizadas. “Gostaria muito que todas as empresas mundo afora fossem saudáveis e diversas de uma forma natural”, afirma. “Entendo que essa não é uma realidade no Brasil e até mesmo em outros países do mundo.” Enquanto esse momento não chega, Gomes reafirma a importância de a comunidade LGBTQIA+ continuar reivindicando seus espaços e necessidades nas empresas.
Em um nível mais pessoal, o engenheiro de software mineiro quer aproveitar mais a cidade onde vive. Como ele conta, não conseguiu se integrar totalmente à comunidade da capital alemã por conta da pandemia de Covid-19. “Quando decidi vir para Berlim trabalhar, fui motivado pelo sonho de conhecer o mundo”, diz. “Estou aprendendo o idioma e quero conseguir entender tudo o que está ocorrendo a minha volta e absorver mais da cultura local.”
Este perfil faz parte de um especial que aborda as vivências de pessoas da comunidade LGBTQIA+ no ecossistema de inovação brasileiro, que a Forbes Tech veiculará nas próximas semanas. Para saber mais sobre os desafios e oportunidades relacionados a este público nas empresas de tecnologia, leia a reportagem que deu início à série.
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