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No paulistano Tuju – do jovem Ivan Ralston, de 32 anos, filho dos sócios- fundadores da bem-sucedida rede Ráscal – a experiência com ingredientes inusitados começa na porta de entrada. As paredes de vidro do moderno salão dão vista para a horta suspensa. O restaurante funciona com menus fechados (de três, cinco e 12 tempos, que custam R$ 85, R$ 150 e R$ 320, respectivamente). A entrada, um buquê de Panc, surpreende: parece um ramalhete decorativo colhido no jardim de casa. Tem até folha de violeta e umas florezinhas miúdas chamadas capuchinhas. Muitos frequentadores ficam em dúvida se aquele bonito arranjo é mesmo para comer. É, e vale a pena. A folha de violeta tem gosto adocicado, e a capuchinha, a picância do agrião. Nos demais pratos, as Panc aparecem de forma menos evidente, misturadas à composição de receitas mais elaboradas, como uma sobremesa de mandioca amarela (a convencional é branca) com leite de coco ou o bacalhau com ovo poché, vôngole e taioba, uma Panc que virou hit de vários restaurantes.
"Não é necessário usar ingredientes caros. A sofisticação está na capacidade humana de transformar algo em emoções", Alex Atala, chef e proprietário do D.O.M.Outra adepta das Panc é Helena Rizzo, do Maní, um dos 50 melhores restaurantes do mundo segundo a bíblia da gastronomia, a revista britânica The Restaurant. Conhecida pela culinária fresca e inventiva, Rizzo também usa a taioba como base de um purê que acompanha uma bochecha de boi.
A moda das plantas comestíveis não convencionais começou na Europa. Buquês como o citado no início desta reportagem, por exemplo, já estiveram no cardápio do Noma, do renomado René Redzepi, na capital dinamarquesa. Temporariamente fechada, a casa servia o mix em um vaso para degustação. As reações do público eram divertidas: a maioria hesitava em fazer o certo: pegar as folhas com as mãos e comê-las.
Considerado o melhor restaurante do mundo, a Osteria Francescana, do chef Massimo Bottura, em Modena, na Itália, também tem sua atração Panc. Chamada de caesar salad – que não lembra em nada a salada homônima dos restaurantes do Brasil–, leva brotos de mostarda, pontas de folhas crespas de cenoura selvagem, trevos, azeda de madeira (também conhecida como azedinha) e botões de szechuan (a delicada flor de jambu, que lembra uma minimargarida). A salada faz parte do menu degustação de nove estações (€ 220 a € 250).
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“Usar apenas ingredientes caros já está vulgarizado. As pessoas procuram por novas experiências”, diz Ailin Aleixo, jornalista e autora do Gastrolândia, site de referência em gastronomia e turismo gastronômico. “Por muitos anos, os chefs brasileiros importaram ingredientes, o que gerou um certo empobrecimento de sabores. A diversidade do país é um verdadeiro tesouro para a gastronomia nacional.” Ailin lembra de uma Panc que ela adora, chamada lambari. “Tem gosto de peixe, é incrível”, diz. “Empanada, parece mesmo um peixinho frito.”
Para alguns, a nova moda remete à mais tenra memória afetiva. “Meus pais são da roça, cresci no Paraná. Cultivávamos taioba no fundo do quintal, e minha mãe costumava fazer um refogado muito gostoso,” diz a nutricionista Neide Rigo, autora do blog Panc na City e uma das disseminadoras dessa onda. “Sempre que sinto o cheiro da planta, lembro da minha infância.” Há muito tempo ela pesquisa e cataloga os “matinhos” que encontra pelo caminho, o que fez dela uma referência na área.
“A alta gastronomia é um projeto de eterno aprendizado”, diz Ailin, da Gastrolândia. “Apesar do desconhecimento e até de certo preconceito, as Panc estão em nossos quintais, nossas calçadas, nossas florestas. Fazem parte da nossa biodiversidade”, completa Atala. “Podemos ser o ponto de partida para um consumo mais consciente. Utilizar as Panc na alta gastronomia faz parte disso.”
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