Três aberturas de exposição agitam Inhotim, um dos maiores museus a céu aberto do mundo

28 de agosto de 2021
Divulgação/Inhotim

“PROPAGANDA”, Lucia Koch

Um saco de carvão, uma queijeira e uma caixa de cogumelos – todos vazios, fotografados por dentro e ampliados em grandes dimensões. A obra “PROPAGANDA”, da artista Lucia Koch, é uma das três inaugurações abertas hoje (28) para o público no Instituto Inhotim, em Brumadinho, a 60 km de Belo Horizonte (MG). Um dos maiores museus de arte contemporânea a céu aberto do mundo, Inhotim completa 15 anos com 560 obras expostas de 60 artistas de 38 países. Seguindo protocolos contra a Covid-19, ele está abrindo para receber mil pessoas por dia (em tempos normais são cinco mil) – ótimo programa para uma atividade ao ar livre.

Outros cinco outdoors de Lucia Koch, em pontos de grande visibilidade, com fotos de embalagens conhecidas pelos moradores, foram espalhados pela cidade que viveu a tragédia do rompimento de uma barragem da Vale, em janeiro de 2019, matando pelo menos 270 pessoas.

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“Vamos ver como a população reage”, comentou ontem (27) a gaúcha radicada em São Paulo sobre o fato de as imagens ocuparem um espaço normalmente dedicado à publicidade. “Esse tipo de perturbação me interessa, pois você não entende o que aquele negócio está fazendo ali. E, para ter estranhamento, precisa ter familiaridade com o produto”, continua a artista, dizendo que fez pesquisa no mercado local para se inteirar dos itens mais vendidos, processo semelhante ao das obras feitas na França (2011) e em Marrocos (2019). “Com as indenizações pagas aos moradores de Brumadinho e as empresas que chegaram para minerar na lama [do desastre de 2019], a cidade parece que ficou histérica, uma certa convulsão, com propaganda de carros e condomínios de luxo.”

O outdoor da caixa de cogumelo, com alguns buracos preenchidos por fotos produzidas na casa de Lucia, fica em uma língua de terra de um lago de Inhotim – bom lugar para apreciar uma característica tão única do Instituto. Como se não bastassem obras de cair o queixo, ele está inserido em um Jardim Botânico, com 4.300 espécies raras de todos os continentes, entre dois biomas: Mata Atlântica e Cerrado.

“Eu estou eufórico”

IsisMedeiros

“O espaço físico pode ser um lugar abstrato, complexo e em construção”, Rommulo Vieira Conceição

Outro artista (e professor universitário de geologia) com obra inaugurada hoje para o público é o baiano radicado em Porto Alegre, Rommulo Vieira Conceição. Ele mal piscava ontem, acompanhando os últimos ajustes da obra “O espaço físico pode ser um lugar abstrato, complexo e em construção”, instalado no Jardim Sombra e Água Fresca. “Eu estou eufórico, mas o grande momento é quando as pessoas se apropriarem da obra”, disse a respeito do trabalho composto por arcos coloridos de superfície brilhante, cúpulas, paredes, grades, andaimes e referências de diferentes religiões. “É meu grande momento.”

A concepção da instalação é de 2018, mas a semente da sua essência é de 2013, ano que Rommulo cita como “um marco no crescimento da intolerância no país”. “A primeira noção que você tem é de fantasia, de parquinho infantil. Mas, ao começar a caminhar pela obra, o fluxo é interrompido, existem bloqueios, peças que vão causando desconforto.” De fato, há uma completa desorientação ao andar pelo espaço em estado de construção.

“Os arcos, por exemplo, perdem a sua funcionalidade estrutural arquitetônica e passam a sustentar o nada, ou talvez deixem de sustentar a representação do céu das arquiteturas sacras para deixar o céu real ser visto através deles”, explicou Douglas de Freitas, curador de Inhotim. Douglas também contou o desafio que foi montar a obra sem poder remover algumas espécies raras e delicadas que não poderiam ser retiradas e replantadas em outro lugar, como um buriti e alguns palmeiras.

Do preto ao cinza

Lucia e Rommulo fazem parte do programa Comissionamentos Inhotim, que convida artistas a criarem obras inéditas a partir de suas experiências no local e suas adjacências. O trabalho de Lucia ficará exposto por um ano, já o de Rommulo deve seguir de forma permanente. O eixo de pesquisa proposto para o biênio 2021-2022 é Território Específico, que valoriza ainda mais a relação da instituição com o seu entorno: Lucia teve seu trabalho exposto em outdoors “de verdade” de Brumadinho; Rommulo contou com mão de obra local para produzir as peças de sua obra.

Divulgação/Inhotim

Série “Mediterranean”, Aleksandra Mir

Este fim de semana também traz a estreia de Aleksandra Mir, polonesa radicada em Londres, que pintou de canetinha Sharpie quatro desenhos de grande escala para a série “Mediterranean” em 2007, momento em que vivia na Sicília (de 2005 a 2010). “A obra foi adquirida por Inhotim em 2008, e, desde então, está em nossa reserva técnica”, conta Douglas sobre os painéis com tons de canetinha que vão de preto ao cinza. “Resolvemos trazê-la agora por causa do tema Território Específico”, continua o curador sobre a artista que passou por quatro migrações e está habituada a cruzar fronteiras desde a infância. Os quatro painéis enormes (e lindos!) da mostra individual “Entre Terras” estão expostos na Galeria da Praça – uma das quatro (entre 23) galerias de Inhotim dedicadas a exposições temporárias.

Independente das três aberturas de exposição deste fim de semana, Inhotim é destes lugares no Brasil essenciais para quem gosta de arte e de natureza – que tal as duas coisas juntas em doses cavalares? Com um time formado por Adriana Varejão, Tunga, Cildo Meireles, Miguel Rio Branco, Matthew Barney, Carroll Dunham, Lygia Pape, Doug Aitken, William Kentridge e outras dezenas de nomes de peso, é possível adiantar algo muito provável, caso você vá visitar o local pela primeira vez: prepare-se para voltar. Inhotim é irresistível. A dica de hospedagem em Belo Horizonte é o hotel Fasano, no bairro de Lourdes.

Veja, na galeria abaixo, as obras inauguradas hoje e mais outras de Inhotim:

PROPAGANDA, Lucia Koch, 2021
PROPAGANDA, Lucia Koch, 2021
PROPAGANDA, Lucia Koch, 2021
O espaço físico pode ser um lugar abstrato, complexo e em construção, Rommulo Vieira Conceição, 2021
Mediterranean  Iceage, Aleksandra Mir, 2007
Mediterranean Heatwave, Aleksandra Mir, 2007
Mediterranean Heartbreak, Aleksandra Mir, 2007
Mediterranean Headache, Aleksandra Mir, 2007 
Cildo Meireles, Desvio para o vermelho: Impregnação, Entorno, Desvio, 1967 – 1984
Vista interna da Galeria Adriana Varejão
Matthew Barney, De lama lâmina, 2009
Chris Burden, Beam drop Inhotim, 2008
Dan Graham, Bisected triangle, Interior curve, 2002

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