Quase uma década separa a Tássia Magalhães de 25 anos eleita Forbes Under 30 em 2015 e a Tássia de hoje. Em menos de dez anos, a chef deixou de trabalhar para os outros e focou nela mesma. Abriu o Nelita, seu restaurante de comida italiana autoral, em 2021. Desde então, só sucesso: o primogênito ocupa a 21ª posição entre os melhores restaurantes da América Latina, e a paulista de 34 anos que conduz a orquestra só de mulheres na cozinha levou o prêmio de “New Talent Award 2024” da francesa La Liste.
Com os prêmios e sua carreira no auge, Tássia é uma das chefs mais importantes da nova geração e tem viajado mundo afora para mostrar a sua cozinha. No dia em que nos vimos, a chef acabava de voltar da Europa, onde assinou jantares na Turquia e na Grécia. Semanas depois, já estava em Londres no estrelado Michelin Humo. “Faço pelo menos duas viagens por mês, às vezes são muito rápidas. São tantas que até precisei cancelar algumas esse ano”, conta ela.
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No meio do agito e do reconhecimento, para celebrar as conquistas e os três anos de Nelita completados este ano, Tássia quis voltar às origens. Buscou inspirações na sua cidade natal, Guaratinguetá, no interior de São Paulo, para compor o novo menu degustação do restaurante.
“Usamos alguns dos ingredientes do Vale do Paraíba desde a abertura do Nelita, mas esse menu foi todo pensado para valorizar a terra de onde vim, a sua história e os pequenos produtores do interior de São Paulo, uma região muito rica”, afirma ela.
Um conterrâneo da chef, dos moradores mais ilustres da sua pequena cidade, também a inspirou: Di Cavalcanti, com sua pintura Cinco moças de Guaratinguetá, hoje parte do acervo do MASP. “Todos os pratos foram pensados nas cores do quadro”, explica sobre os tons de rosa, verde, azul e vermelho que colorem o menu de 11 etapas.
E assim se constrói uma experiência cheia de técnicas e referências cosmopolitas, mas muita memória e verdade. À mesa, insumos como o leite de búfala de Pindamonhangaba, que aparece como coalhada no snack de flor de tomate com água de tomate e baunilha. Ou o arroz de altitude de Guaratinguetá, no arancini. As ovas de truta do Vale do Paraíba decoram o linguini com suco de cenoura, alho-poró e algas, enquanto a acerola da tartelete que finaliza a refeição vem do sítio da mãe da chef.
No clima intimista do Nelita, nada mais apropriado do que sentar no balcão, como se Tássia te recebesse e cozinhasse em sua própria casa. É apenas ali, de frente para a equipe feminina que trabalha com pinças da forma mais delicada possível, que a degustação (R$ 590 por pessoa) é servida para poucos comensais por noite.
Entre os destaques da refeição, a etapa da beterraba impressiona os olhos e a boca. Finos pedaços de beterraba e rabanete fermentados são graciosamente combinados como um lindo mosaico de pétalas de flor, montados sobre um creme de beterraba. Um molho de iogurte com azeite de menta e folhas frescas de poejo dão o toque final. “É meu prato favorito da degustação”, admite a chef. “É super refrescante. As pessoas não costumam comer muita beterraba nos restaurantes, mas se surpreendem com a nossa”.
Os vegetais, aliás, têm vez e voz na cozinha de Tássia. É o que o digam outros dois pratos que impressionam: a mini abobrinha marinada e braseada com creme de abobrinha e beurre blanc e a massa feita com cogumelos, recheada com compota de berinjela e tomate e finalizada com caldo translúcido de berinjela defumada. Todos eles podem ser pedidos também à la carte.
Já vislumbrando o quarto ano de vida do Nelita, a chef diz estar vivendo o auge. Mas para aquela menina que adorava reproduzir receitas da Palmirinha em uma pequena cidade do interior paulista, e hoje brilha com sua comida autoral pelo Brasil e pelo mundo – e com certeza já inspira os novos cozinheiros, mais jovens –, é só o começo.