Vamos ser honestos: a maioria de nós identificou ter ou que pode ter algum transtorno mental em meio a essa pandemia. Doenças mentais não têm nada a ver com insanidade ou tristeza, muito embora algumas delas envolvam essas condições de alguma forma. Elas não são exclusivas de nenhum grupo ou sexo. Acho que isso ficou bem claro durante a quarentena. Ao contrário: elas são universais e complexas.
Os transtornos mentais sempre existiram, mas antes do coronavírus eles estavam meio escamoteados. Explico: o ritmo de vida antes da quarentena era, por assim dizer, tão intenso, todos vivíamos em uma roda-viva tão louca que ninguém se dava conta de que, talvez, a ansiedade não fosse causada pelos mil e um compromissos agendados, que a insônia talvez não tivesse nascido apenas do estresse de ficar horas preso ao trânsito todos os dias e de que o uso de certas substâncias, como o álcool, há muito deixara de ser algo normal.
O que a pandemia e a quarentena fizeram foi desacelerar um pouco as nossas vidas e nos colocar mais próximos de nós mesmos. Foi nesse momento que muitos passaram a atentar para o fato de que “epa, há algo errado comigo”. E “epa, meu irmão e meu vizinho também não estão tão bem”.
Tudo bem se houver alguma coisa que não esteja bem com você ou com um conhecido seu. Diferentemente do que muitos ainda querem crer, transtornos mentais não são loucura ou fraqueza moral.
Pense neles como uma ampla gama de condições. Cada um de nós está num ponto desse espectro, que vai desde a plena saúde mental até doenças mentais mais graves, como a depressão severa e a esquizofrenia. A maior parte de nós está em algum ponto entre esses dois extremos, um ponto em que geralmente enfrentamos ou lutamos para enfrentar os problemas que surgem em nossas vidas. A bem da verdade, nos movemos para lá e para cá ao longo de nossas vidas, umas vezes para cima, outras para baixo.
Em 10 de outubro, o mundo celebra o Dia Mundial da Saúde Mental. Esta é uma iniciativa promovida pela Federação Mundial da Saúde Mental e outras entidades de saúde ao redor do mundo cujo objetivo é despertar a atenção das pessoas para a questão das doenças mentais. É também um dia para refletirmos sobre como nos encontramos e o que virá pela frente.
Este mundo que se apresenta agora – com um número significativo de pessoas se dando conta de que estão em algum ponto da régua dos transtornos mentais – é um mundo mais real, menos pasteurizado. Isso é uma coisa boa.
Como médico que trabalha com a dimensão subjetiva da mente, sei que a aceitação é o primeiro passo para que consigamos evitar que alguma doença mental afete o modo como lidamos com a vida, as nossas relações e o nosso trabalho. É possível prevenir que isso aconteça. Mas tudo começa com aceitar a nossa condição imperfeita. Afinal, não somos todos?
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
Siga FORBES Brasil nas redes sociais:
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Siga Forbes Money no Telegram e tenha acesso a notícias do mercado financeiro em primeira mão
Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.
Tenha também a Forbes no Google Notícias.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.