O cérebro intriga grandes pensadores da humanidade há séculos. Na Grécia Antiga, o filósofo Aristóteles, por exemplo, o via como uma espécie de sistema de refrigeração: mantinha o corpo frio e evitava o superaquecimento do coração – que, para ele, era a sede da inteligência e do pensamento. O médico Erasístrato chegou a estudar a anatomia cerebral (embora um “mapa” do cérebro só fosse aparecer quase 2 mil anos depois, feito pelo médico inglês Thomas Willis). Ainda na Antiguidade, os egípcios se dedicaram a estudar o órgão, descrevendo, por exemplo, a enxaqueca, epilepsia e as sequelas de traumas na cabeça (embora o retirassem dos corpos a serem mumificados).
As patologias que envolvem diretamente o cérebro são alvo preferencial desta busca por conhecer melhor aquela que é (com justiça) classificada como a estrutura mais complexa que existe. A pandemia de Covid-19 (que, vale lembrar, ainda não acabou), por sua vez, colocou em evidência a saúde mental, dada a carga de estresse a que parte significativa das populações de todo país esteve sujeita nos últimos dois anos. E, no contexto da saúde mental, a demência tem grande relevância.
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Dados da Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde referentes a 2021 mostram que, no Brasil, cerca de 1,2 milhão de pessoas vivem com alguma forma dessa doença e aproximadamente 100 mil casos são diagnosticados a cada ano. No mundo, são cerca de 50 milhões de pessoas. Até 2050, a Alzheimer’s Disease International, organização fundada para ajudar a combater o Alzheimer, estima que esse número possa superar os 131,5 milhões.
Três estudos recentes, segundo reportagem do The New York Times, investigaram quais exercícios físicos, em que intensidade e duração, poderiam ser indicados dar ao indivíduo alguma forma de proteção contra a demência. Especialistas há muito acreditam que esse tipo de proteção é possível, diz a reportagem, mas os resultados dos poucos estudos do tipo já realizados não permitiram formar um consenso em torno desta ideia.
O primeiro dos estudos foi publicado no periódico especializado Neurology, a partir de informações de mais de 500 mil participantes no Reino Unido. Essas pessoas foram acompanhadas por 11 anos, e cerca de 5,2 mil delas desenvolveram demência. Dentre os participantes que se dedicavam a atividades físicas vigorosas, o risco de desenvolver a doença foi reduzido em 35%. Curiosamente, entre as pessoas que se ocuparam de tarefas domésticas, essa redução foi de 21%.
O segundo estudo (um levantamento feito a partir de outras 38 pesquisas, também publicado na Neurology) diz que não foi possível concluir qual tipo de exercício físico seria mais eficiente – mas que os participantes praticavam atividades como natação, corrida, esportes de equipe ou sessões na academia. O terceiro, por sua vez, começou com 1.200 crianças, de 7 a 15 anos, acompanhadas por mais de 30 anos. As que tinham um estilo de vida mais ativo, de maneira sustentada, apresentaram maiores níveis de atividade cognitiva na idade adulta.
Um dos pesquisadores disse (de maneira bastante sensata) ao NYT que “o cérebro é parte do corpo, e vai se beneficiar de qualquer coisa que você faça que seja boa para sua saúde geral”. Pouco espaço aqui para discordância – mas fica algum para uma ponderação.
Atividade física é algo que deve ser acompanhado por um médico. Não há dúvida de que exercícios físicos beneficiam o corpo como um todo – para o coração, para os ossos, para a musculatura em geral, para a mente, exercícios são bons. Mas não se a pessoa simplesmente calçar seu par de tênis e sair correndo, sem orientação. A visita ao médico antes de incorporar a atividade física à rotina vai evitar exageros e erros, que podem resultar em mais problemas de saúde no futuro.
Quanto à demência, embora os estudos não consigam apontar qualquer relação mais específica entre este ou aquele exercício e a saúde mental, de forma geral o efeito é benéfico. Os estudos acerca da demência – que pode se manifestar como a doença de Alzheimer ou Parkinson, ou ter causas vasculares, ou mesmo por traumatismo craniano – prosseguem. Nos EUA, no ano passado, foi aprovado um novo tratamento para Alzheimer, o aducanumabe – que, segundo a FDA (agência reguladora do setor farmacêutico e de alimentos no país), traz “evidências substanciais” de que reduz as placas de beta amilóide no cérebro”, o que pode gerar benefícios importantes para os pacientes. Com uma doença tão grave e tão presente no mundo, tudo que possa dela nos proteger, seja tratamento, seja a atividade física, é muito bem-vindo.
Claudio Lottenberg é mestre e doutor em oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp). É presidente do conselho do Hospital Albert Einstein e do Instituto Coalizão Saúde.
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