Eu trabalho como médico psiquiatra há 40 anos, sempre tratando casos de dependência química e problemas de saúde mental. Nesses anos todos de prática médica, descobri, de forma intuitiva, algo importante: quanto mais esporte, menos remédio.
Essa constatação foi se dando ao longo dos anos. Quanto mais eu estudava sobre as classes de remédios psiquiátricos, mais eu verificava que um bom grupo deles age para diminuir a ansiedade, para tranquilizar. Um outro grupo muito importante tem uma ação estimulante. São remédios feitos para dar um “up”, uma energizada naquelas pessoas que estão desvitalizadas, sentem-se desanimadas, com pouca vontade de se levantar da cama.
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Observei que o esporte regular, desde que exija bastante do corpo (tem de nos deixar ofegantes, cansados) – e aliado à presença de uma meta (vou pedalar, correr ou nadar ‘x’ quilômetros, por exemplo) acompanhada de uma recompensa pelo esforço (uma medalha, um registro de participação) é tão bom e, às vezes, até melhor do que um remédio.
É claro que essa fórmula não se aplica a todas as questões de saúde mental. Uma parcela dos transtornos mentais é grave, exige medicamentos e precisa ser tratada, por vezes, de forma urgente, contundente.
Há, porém, um bom número de situações muito comuns, como é o caso da ansiedade, depressões mais leves, problemas com o sono, em que o exercício supre e até supera os benefícios do uso de medicamentos.
A ciência vem reunindo cada vez mais provas dessa minha experiência prática na clínica. Um trabalho publicado este ano na conceituada revista médica British Journal of Medicine fez uma revisão de mais de 1000 estudos que examinavam os efeitos da atividade física na depressão, na ansiedade e no sofrimento psicológico.
Descobriu a mesma coisa que venho aplicando há mais de 20 anos: o esporte é uma maneira eficaz de tratar problemas de saúde mental, podendo, inclusive, ser mais eficiente do que medicamentos. Descobriu também que quanto mais intenso é o exercício, mais benefícios para a saúde mental traz. Além, claro, de a prática de atividade física ser barata e ter muito menos efeitos colaterais do que uma droga psiquiátrica.
Eu vi isso acontecendo comigo mesmo. Desde que comecei a praticar esporte, tenho uma qualidade de sono infinitamente melhor, fiquei mais calmo e muito mais focado para realizar os meus compromissos profissionais.
Fazer atividade física para tratar o seu problema de saúde mental não é uma saída alternativa, mas ela deveria ser considerada sempre. Muitas entidades médicas do mundo, como é o caso da suíça, australiana e neo-zelandesa, já entenderam isso.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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