O transporte rodoviário é o principal sistema logístico do Brasil e também um barômetro da economia. Se um país começa a vender mais alimentos, cosméticos, eletrodomésticos, eletroeletrônicos e automóveis, a indústria de caminhões vai bem. O que significa que quando o PIB cai ou estabiliza, o reflexo é imediatamente sentido pelos fabricantes de caminhões. Isso explica a queda de 50% na produção do setor no primeiro trimestre de 2015 em relação ao ano anterior. E a culpa não foi do Euro 5, nova tecnologia adotada para respeitar a evolução da legislação ambiental, uma vez que a norma é de 2012.
A queda nas vendas está diretamente ligada ao esfriamento da economia e ao aumento da taxa básica de juros. “A compra de caminhões é técnica, uma decisão de investimento que precisa se pagar. A taxa de retorno deve cobrir o custo financeiro. E quando a taxa de juros de mercado sobe, a nossa sobe ainda mais, uma vez que dentre as medidas de contenção de gastos do governo está a redução drástica dos incentivos do Finame [financiamento de máquinas e equipamentos]”, afirma Roberto Cortes, presidente da MAN Latina America (responsável pela produção e venda dos caminhões MAN e Volkswagen). Ele lembra que, até 2014, um caminhoneiro comprava e pagava 100% do caminhão a uma taxa de juros de 6%. Hoje, o governo só financia 50% do veículo e a taxa de juros gira entre 9,5% e 10%. “Para pagar os outros 50%, ele precisa ir ao mercado, o que custa caro. Resultado: a decisão de investimento fica comprometida”, diz.
Em 2011, antes da mudança da lei, a indústria de caminhões vendeu 171.000 unidades no ano. Em 2012, por conta do aumento do preço com as novas regras do Euro 5, as vendas caíram para 136 mil unidades. Já em 2013, houve uma recuperação para 152.000. Em 2014, apesar da crença na recuperação em relação a 2011, novo declínio: 135 mil itens. Para este ano, a expectativa da indústria é vender 80 mil caminhões.
Apesar do cenário desfavorável, no primeiro trimestre deste ano, a MAN conseguiu elevar seu market share para 30% — ante os 27% do mesmo período de 2014. As vendas da MAN, no entanto, caíram 45% no período, cerca de 5% a menos que o tombo do mercado. Esse ganho de participação, no entanto, não segurará a queda da produção e vendas.
“A matriz vê o Brasil como uma aposta de longo prazo. O país continuará a ser um bom mercado no futuro. Somos líderes há 13 anos e certamente voltaremos a crescer. A gente vai ter que recuperar as vendas. Espero que em 2016 a economia volte a melhorar”, acredita Cortes.
A fabricante está voltada, em 2015, à intensificação de atividades de relacionamento com o cliente, possibilitando maior presença e suporte aos transportadores, e aos investimentos relacionados à melhoria continua em qualidade e inovação”, explica Carvalho. Em termos de ações práticas, ele destaca o Scania Show e a Caravana Vou de Scania. O primeiro leva o cliente para a fábrica e o aproxima da marca por meio de apresentações técnicas e test-drive. A aceitação desse modelo de evento, conta, foi bastante positiva pela rede. Já a Caravana Vou de Scania percorre importantes praças levando os principais produtos da marca para perto dos clientes.
Outro foco crescente da montadora é em cima do desenvolvimento dos serviços que contribuem para a receita da rede de concessionárias. A Scania também continua a promover o Streamline, caminhão que apresenta aerodinâmica aprimorada, dentre outras características que contribuem para a queda no consumo de combustível. “Ele oferece uma economia de até 4% em comparação a um similar Euro 5 e de até 15% em relação a um produto Euro 3”, aposta Carvalho. Outro fator que poderia ajudar a virar o jogo neste ano desafiador, sugere o diretor da Scania, seria o governo iniciar um programa de renovação de frota, como o proposto pela Anfavea em novembro de 2013. Essa iniciativa poderá movimentar a cadeia e elevar as vendas dos zero-quilômetro.
A PepsiCo, de alimentos e bebidas, quer estreitar relações com os varejistas para melhorar a eficiência das entregas e reduzir custos. A companhia possui frota própria composta por 3 mil caminhões e 300 veículos de menor porte. Eles são responsáveis por 70% das entregas realizadas pela companhia; os 30% restantes são feitos por 36 operadores logísticos. A empresa começou a realizar reuniões bimestrais com os varejistas, em alguns casos até mensais, para discutir apenas assuntos ligados à logística. “Até o ano passado não havia reuniões específicas para tratar do tema, que era abordado apenas de maneira superficial em conversas entre o nosso departamento comercial e o do cliente”, diz Daniel Pires, diretor de transportes da PepsiCo. Um dos objetivos dessas reuniões é customizar as entregas de acordo com as necessidades do cliente.
Para diminuir custos, a companhia também iniciou este ano parcerias com empresas como Ambev, Unilever e Procter & Gamble, no chamado transporte colaborativo. Funciona assim: em uma rota que começa na cidade A e termina na cidade B, a PepsiCo pode ter a necessidade apenas de levar produtos de A para B e a Ambev necessitar justamente do contrário, trazer sua remessa de B para A. Nesses casos, as fabricantes têm contratado operadores logísticos em conjunto, ou seja, o mesmo caminhão que vai com produtos PepsiCo volta com itens da Ambev. “Com essa estratégia, temos conseguido uma redução de 20% no custo do frete”, diz Pires. Por questões legais, a PepsiCo não pode usar seus próprios caminhões para transportar produtos de outra companhia, já que ela não é uma transportadora. “Mas essa é uma questão que pretendemos resolver e colocar em prática no futuro”, afirma o executivo.
Para Décio Tarallo, diretor da Prosperity, consultoria especializada em logística, as empresas — indústria, operador logístico e varejista — precisam colaborar mais entre si para reduzir custos e melhorar a eficiência das entregas. “Existem alguns sistemas tecnológicos que permitem, entre outras coisas, que o fornecedor tenha acesso ao estoque do lojista. Assim, fica fácil fazer o abastecimento na loja no momento certo e evita-se um problema comum: caminhões parados esperando por horas para descarregar”, explica. Porém, as empresas brasileiras não têm o costume de compartilhar informações, diz o consultor. “O varejista, por exemplo, tem medo de sair prejudicado nas negociações com a indústria se ela souber como estão os níveis dos seus estoques”, afirma.