Como o bilionário Flávio Augusto pretende reerguer a Wise Up, recomprada por ele

2 de outubro de 2016
Flávio Augusto

Flávio Augusto recomprou a Wise Up por menos da metade que vendeu (Divulgação)

A transação surpreendeu a todos: no fim de 2015, a Wise Up, rede de escolas de idiomas criada por Flávio Augusto da Silva e vendida à Abril Educação há três anos por 877 milhões de reais, foi recomprada por ele por menos da metade — 398 milhões de reais. Desde então, Flávio vem empreendendo uma pequena revolução dentro da empresa, para que ela retome sua antiga performance. A grande questão aqui é saber o que aconteceu para que a companhia perdesse tanto valor, e se é possível recuperá-la.

RANKING: 70 maiores bilionários do Brasil em 2016

“Há aspectos macroeconômicos, e também de gestão”, diz Flávio. “É fato que o Brasil de 2012 era bem diferente do que o de hoje. A economia se deteriorou bastante, e muitas empresas se depreciaram. Basta ver o valor de mercado das companhias que estiverem na bolsa de São Paulo nesses dois períodos para constatar esse fato.” Ou seja, a recessão que atingiu o país tem sua parcela de responsabilidade pelos problemas da Wise Up — que não são pequenos.

Quando Flávio vendeu a rede à Abril Educação (a qual, após ser comprada pelo fundo de investimentos Tarpon, trocou de nome para Somos Educação), ela contava com 76 mil alunos e 338 escolas que se espalhavam por 93 cidades. Na recompra, a Wise Up voltou bem menor, com 272 escolas. Nesses três anos, a Wise Up passou por duas outras vendas e teve três CEOs. Isso foi péssimo para a administração da companhia: assim que um presidente começava a entender o negócio, era substituído por outro.

Crise econômica e gestões conturbadas, portanto, golpearam com força a Wise Up. A tarefa de seu novo dono será reerguer a rede em pleno Brasil de 2016, imerso na recessão. E ele já começou a fazê-lo: “Com toda humildade, posso dizer que a Wise Up já é hoje uma outra empresa, resultado do trabalho que estamos realizando nos últimos seis meses. O clima é outro, bem como os resultados já obtidos e, principalmente, são excelentes as perspectivas”, afirma Flávio.

MAIS BILIONÁRIOS: Quem são bilionários brasileiros por trás das marcas do seu dia a dia

Franquias

Não que esteja sendo fácil. Assim que reassumiu a liderança da rede, Flávio desligou mais de 100 funcionários que trabalhavam na sede da empresa, em São Paulo, e transferiu o comando nacional das operações da Wise Up para Curitiba. Na sequência, trouxe de volta antigos colaboradores da época em que fundou a empresa, e reformulou toda a gestão que a Somos Educação havia imposto ao grupo.

“Em paralelo, eu me aproximei bastante dos franqueados da rede, os quais me receberam muito bem”, conta Flávio. “Eles estavam um pouco desgastados com os resultados dos anos anteriores, mas o projeto que apresentei para os próximos três anos agradou e
ganhou grande adesão. Fico feliz em dizer que o crescimento na Wise Up já voltou.”

Em 2016, diz, o foco está sendo no fortalecimento das franquias, o realinhamento de objetivos e o desenvolvimento de novos produtos que serão lançados em 2017. Flávio adianta que a Wise Up vai voltar a inovar e ter produtos à frente de seu setor no ano que vem. Investimentos em tecnologia e novos itens são parte do dia a dia do departamento de pesquisa e desenvolvimento da rede, que conta com mais de 30 profissionais.

O executivo afirma que o número de interessados em se tornar franqueados da Wise Up é um indício de que a empresa voltou à velha forma. Desde que retornou ao comando, a rede passou a receber em média 12 interessados na franquia por dia. “Por enquanto não estamos abertos para expansão, até que tenhamos a rede alinhada, os novos produtos desenvolvidos e a matriz pronta para multiplicar as escolas novamente. Toda esta evolução começa a acontecer agora, neste agosto de 2016, em um processo de seleção que se concretizará em agosto de 2017, e que vai resultar na inauguração de mais de 100 novas escolas da Wise Up em todo o Brasil.” Além disso, a empresa não descarta a possibilidade de adquirir algum concorrente, caso haja oportunidade.

Flávio Augusto na Wise up, rede de escolas de idiomas que criou nos anos 1990 (Divulgação)

Futebol

Flávio Augusto fez fortuna com as próprias mãos. “Tenho minha origem na periferia do Rio de Janeiro. Estudei em escolas públicas e convivi, desde cedo, com a simplicidade e com muita pobreza por meio dos trabalhos voluntários que meus pais realizavam”, conta ele, que afirma nunca ter feito parte de seus planos tornar-se um bilionário. Começou sua carreira vendendo cursos de inglês para sobreviver, enquanto pensava em estudar ciência da computação na faculdade. Mas se mostrou tão bom vendedor que, no começo dos anos 1990, abriu seu próprio estabelecimento do ramo — a primeira Wise Up —, que se tornou um império que só fez crescer, até que ele decidisse vendê-la, em fevereiro de 2013, para se dedicar a duas outras paixões: o estímulo ao empreendedorismo e o futebol.

Em 2013, ele comprou o Orlando City, um clube profissional de futebol (ou soccer, como é chamado o esporte nos EUA) que jogava na USL, uma liga de segundo escalão, mas com potencial para ser aceito na MLS, a principal liga da América do Norte. O investimento seria de 110 milhões de dólares, caso a ascensão do clube fosse concretizada, o que de fato se deu em dezembro daquele ano.

SAIBA MAIS: 23 times de futebol de bilionários

“Em 2014, estruturamos o clube para sua estreia em 2015, e contratamos o jogador Kaká, famoso em todo o mundo”, diz. Nesse período, lembra ele, os jogos da MLS passaram a ser transmitidos para mais de 130 países, e o faturamento dos direitos de transmissão subiu de 17 milhões para 120 milhões de dólares por ano. “Estreamos em 2015 e tivemos uma média de quase 33 mil torcedores por jogo, superior a muitos times brasileiros e a segunda maior média dos EUA. Neste ano, estamos concluindo a construção de nosso próprio estádio, e o clube passou a ser avaliado em mais de 500 milhões de dólares.”

E o empreendedorismo, que está no DNA de Flávio, não foi deixado de lado. Tem se dedicado bastante ao meuSucesso.com, uma plataforma de educação à distância que ensina negócios por meio de estudos de casos de grandes empreendedores. Um documentário cinematográfico sobre cada empreendedor, aliado a aulas com especialistas, conta a trajetória de bilionários brasileiros desde quando, em sua maioria, começaram do zero. Pelas “salas de aula” do meuSucesso.com já passaram mais de 150 mil alunos de 20 países, e a plataforma conta com altos índices de satisfação. A ideia é expandir este modelo de negócio para outras nações nos próximos anos.

Por fim, Flávio dedica-se a um trabalho voluntário, o projeto Geração de Valor, que consiste em produzir e compartilhar gratuitamente conteúdos que fomentam o empreendedorismo. Vídeos, artigos e podcasts fazem parte do material que ele produz pessoalmente a fim de incentivar os jovens que estejam dando seus primeiros passos no mundo dos negócios. “Este projeto se tornou relevante pelo grande alcance, chegando a ter uma audiência de mais de 15 milhões de pessoas por semana. São milhões de seguidores em redes sociais que acompanham e se interessam em interagir comigo. O resultado disso é que nos últimos três anos fui eleito um dos líderes mais admirados, em pesquisa realizada pela DMRH e Cia. de Talentos com mais de 60 mil pessoas. Neste período, lancei o livro Geração de Valor, que foi a obra de negócios mais vendida de 2015. O segundo livro lançado, Geração de Valor 2, é até o momento o livro de negócios mais vendido de 2016”, diz.

Dedicação e senso de oportunidade parecem ser duas palavras-chaves do sucesso de Flávio. Foco é a outra. “Tive foco absoluto na Wise Up durante os 18 anos em que estive à frente da rede, que chegou a ter praticamente 400 escolas em funcionamento, e um faturamento em nossas editoras de quase 178 milhões de reais em 2012.” Agora, o criador à casa retorna, para ajudar o empreendimento em dificuldade. Os próximos anos mostrarão se será ou não bem-sucedido em reerguer o império que criou.