6 desafios para a libra ser mais que apenas uma boa ideia

9 de agosto de 2019
Chesnot / Getty Images

Problemas de confiança passados do Facebook ainda entram no caminho da libra

Resumo:

  • A libra do Facebook chegacom a promessa de mudanças radicais na economia mundial, mas seu verdadeiro potencial ainda não está claro;
  • Entenda o caminho que a libra ainda tem pela frente para realmente se tornar a grande novidade da criptoeconomia.

Que tipo de dinheiro usaremos no futuro? A resposta pode parecer óbvia: dólares, euros, ienes, e moedas fiduciárias emitidas por governos. A maioria de nós nunca conheceu nada diferente. Ainda assim, essas moedas não são um fenômeno natural.

LEIA MAIS: A libra só não é mais reconhecida do que o bitcoin, diz pesquisa

As pessoas criaram essas moedas. Logo, elas também podem abandoná-las por algo diferente, assim como moedas antigas já foram deixadas de lado.

Há bons motivos para imaginarmos que podemos, novamente, ver moedas fiduciárias desaparecerem. Mas, caso isso aconteça, o que será esse “algo diferente” no futuro?

Sempre há quem diga: moedas fiduciárias vão e vêm, mas o ouro é para sempre. E agora existe um rumor similar sobre as criptomoedas.

Cinco anos atrás, eu disse que esperava ver uma moeda ligada a alguma commodity emergir eventualmente e potencialmente se tornar a moeda do futuro.

O projeto da libra, recentemente anunciado pelo Facebook, pode ser uma moeda desse gênero. Ainda que, no momento, seja só uma ideia, eu estou convencido de que ela está pronta para o sucesso.

Problemas de confiança

A libra é uma ideia do Facebook, e a companhia, consciente de seus problemas de confiança, criou um consórcio de empresas para gerir a empreitada.

A “Libra Association” atualmente tem 28 membros. Eles são, em sua maioria, processadores de pagamento, fornecedores de tecnologia e telecomunicações, gerentes de capital de risco e algumas organizações sem fins lucrativos. O próprio Facebook será representado por uma nova empresa subsidiária, a Calibra.

Ao contrário do bitcoin, a libra não será “minerada” por meio da solução de problemas matemáticos. Ela será completamente ligada a bens financeiros, como dinheiro em diversas moedas, títulos governamentais e dívidas similares de curto prazo.

Tudo irá para a “Libra Reserve” à medida que os usuários contribuírem com dinheiro, e cada unidade de libra será uma parte dessa conta. Esse valor flutuará na contra-mão de moedas convencionais, mas não muito (pelo menos é isso que eles esperam.)

E como saber se esses bens estão mesmo na reserva? Isso exige muita confiança, algo que o Facebook não está exatamente servindo ao seu público. Mas e empresas como MasterCard e Visa? Já que a maioria das pessoas tem ao menos um de seus cartões de crédito, aparentemente confiamos nelas.

Outro problema do Facebook é seu uso de informações de forma que muitos jamais consentiriam se a empresa pedisse permissão específica, o que não acontece. Além disso, há o fato de que existe uma inabilidade aparente de grandes empresas lucrativas para guardar dados com segurança.

Com isso em mente, Mark Zuckerberg parece querer separar os dados de usuários da libra da rede do Facebook. Não sei se isso será o suficiente para satisfazer o público, sem contar os políticos e reguladores mundiais.

Conheça seu cliente

A libra enfrenta outro desafio, que pode ser ainda maior. Grande parte da economia desbancarizada gosta de se manter no escuro.

Muitas pessoas usam dinheiro vivo e criptomoedas como forma de sonegação de impostos, fraudes, crimes e planos terroristas. O Facebook afirmou não querer facilitar essas práticas. Então, como pará-las?

Reguladores forçaram a indústria bancária a adotar a política chamada “conheça seu cliente.” Você precisa se identificar para abrir uma conta. Bancos reportam qualquer atividade suspeita às autoridades. É um fardo para negócios legítimos e investidores, mas um fardo necessário.

Reguladores dos Estados Unidos e da Europa não exigem esse nível de controle da libra, mas com certeza irão impor alguns protocolos. Eles jamais deixarão a libra se tornar algo como o bitcoin .

O Facebook tem milhões de perfis falsos, que participam de diversas atividades nem um pouco honestas. Esse é o centro de seu modelo de negócios: mais pares de olhos significam mais renda. A empresa começará a policiar sua audiência mais rigorosamente, mas sua sinceridade é questionável.

O DNA da libra praticamente diz que ela: a) coletará muitos dados, b) não se preocupará muito com precisão, e c) usará informação para fazer dinheiro. Isso é inconsistente em relação à maneira com a qual à libra deverá operar, se o fizer legalmente, o que é a intenção do Facebook e de seus parceiros.

VEJA TAMBÉM: Libra pode criar um mercado trilionário mesmo sem EUA

Problemas de segurança

Digamos que a libra implemente todas as medidas de segurança que os governos exigem. Isso ainda pedirá lidar com muitas informações sensíveis e privadas sobre os bens, hábitos de compra e de viagem de várias pessoas, entre outras coisas.

Podemos: a) confiar que a libra manterá as informações longe das garras do Facebook? b) confiar que a libra, o Facebook e todos os outros envolvidos protegerão essas informações de ladrões virtuais?

Repare nos vazamentos de dados que ocorreram em massa com bancos supostamente sofisticados e outras instituições que gastam milhões protegendo seus sistemas. A libra investirá esse tipo de dinheiro em segurança? Se sim, de onde ele virá?

Onde está o dinheiro?

A própria libra pretende criar renda da volatilidade de seus bens. Em teoria, você dará seus dólares e euros à libra, e eles converterão seu dinheiro em outras moedas, bens e por aí vai.

A organização viverá do interesse do usuário e não pagará nada a ele, que espera que a libra não use suas informações para seu próprio benefício.

Vamos voltar ao conceito de stablecoins. Uma conjunto de moedas não é muito estável. Meus amigos da Gavekal (empresa de pesquisa em investimentos) mediram a estabilidade do dólar e descobriram, que para aqueles que têm a moeda, ela
é a mais estável. Funciona até mesmo para portadores de rúpias indianas (claro, se você mora em um país como a Venezuela, a libra pode um presente divino).

Então, se a libra não é um negócio lucrativo e se não é exatamente um ótimo jeito de guardar valor, qual é a motivação para investir nela?

Um caminho difícil pela frente

A libra tem um caminho difícil a percorrer, e veremos como ela se sairá. Mas o meu ponto continua: moedas fiduciárias também não funcionam muito bem. Portanto, o que seria melhor?

Continuo a acreditar que uma moeda bem feita, regulada e ligada a um commodity é a melhor opção. Mas só vai funcionar se os governos permitirem. Eles não precisam banir moedas alternativas. Governos têm diversas maneiras de torná-las impraticáveis.

Por exemplo, nos Estados Unidos, a Receita considera o bitcoin um “investimento.” Qualquer mudança no seu valor entre o momento que você o adquire e o momento que você o gasta é ganho ou perda de capital.

Para impostos, a Receita norte-americano só aceita dólares. Você precisa ter o suficiente para pagar seus impostos. Similarmente, o governo paga seus milhões de funcionários em dólares. A grande maioria da economia não usará a libra como alternativa nem nada parecido. Isso limitará seu crescimento.

Essas barreiras, eventualmente, cairão, mas isso não acontecerá rapidamente. A próxima década será de muita experimentação. Um novo dinheiro entrará. Só não sabemos de que tipo será.

VEJA TAMBÉM: Libra não será lançada até que reguladores estejam satisfeitos

Desafios aceitos

Eu não sou oposto ao sucesso da libra. Ainda sou cético em relação a informações nas mãos do Facebook, mas milhões, senão bilhões, de millenials não irão nem pensar nessa questão de segurança de dados.

Muitos dos principais bancos mundiais tem trabalhado na criação de uma criptomoeda em blockchain.

O Facebook só deu o tiro inicial, e oferece aos bancos a cortesia de criarem regulações antes. Qual será a vantagem que o Facebook irá levar por ser o primeiro a fazer isso? É difícil dizer.

Siga FORBES Brasil nas redes sociais:

Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn

Tenha também a Forbes no Google Notícias