Resumo:
- Em 2016, a Bitt, uma startup de Barbados, lançou uma criptomoeda baseada no dólar da ilha;
- Com o anúncio da libra, bancos centrais pelo mundo abordam o Bitt para aprender mais sobre como reimaginar o conceito de dinheiro;
- O CEO da empresa, Rawdon Adams, explicou à Forbes como sua empresa já começou a mudar a economia de Barbados.
No verão de 2016, quando o bitcoin estava começando sua subida rumo aos US$ 20 mil, a Bitt, uma startup de Barbados, fez algo que na época parecia bizarro: lançou uma criptomoeda baseada no dólar da ilha caribenha. Muitos se perguntaram por que corromper a eficiência de uma moeda baseada em uma plataforma coletiva produzindo um valor controlado por uma autoridade central.
LEIA MAIS: 6 desafios para a libra ser mais que apenas uma boa ideia
Então veio o Facebook, que anunciou no começo do ano seus planos de lançar a libra, uma criptomoeda baseada em várias moedas de bancos centrais e feita para aproveitar todos os benefícios do blockchain, com o preço e estabilidade de moedas fiduciárias. Poderia esse ser um jeito de as pessoas gastarem criptomoedas, em vez de apenas usarem-nas como investimentos?
Desde então, bancos centrais pelo mundo abordam o Bitt para aprender mais sobre como reimaginar o conceito de dinheiro. O CEO da empresa, Rawdon Adams, explicou à Forbes como sua empresa já começou a mudar Barbados e como outros já estão aprendendo com o processo.
Forbes: Você trabalhou com o Banco Central de Barbados recentemente. Me conte sobre o que você fez.
Rawdon Adams: A Bitt acabou de passar por algumas regulações com o Banco Central de Barbados. Isso é muito importante por vários motivos, mas principalmente porque o Banco Central tem como lemas a proteção ao consumidor e a prevenção de riscos à economia.
Começamos o processo como o Banco Central em dezembro e acabamos no meio de julho. Isso permite que nós continuemos conversas que já haviam começado com parceiros financeiros porque eles procuram conforto. Isso é verdade especialmente para bancos, e ainda mais para vendedores que querem se certificar que receberam aprovação do órgão correto, nesse caso, o Banco Central de Barbados. Fomos a primeira empresa a passar por esse processo e receber um selo de saudabilidade.
F: No começo de 2016, a Bitt lançou um dólar de Barbados no blockchain. Explique um pouco o que aconteceu e qual é seu atual status?
RA: Eu entrei na empresa no fim de 2017. Em 2016, digitalizamos uma versão do dólar de Barbados. Naquela época, o Banco Central não tinha todas as regulações necessárias para realmente entender o que estava acontecendo. Mas ele gostava da ideia de um dólar digital e permitiu que isso acontecesse com o apoio do ministro de finanças da época.
Muito disso têm relação com o contexto das coisas. A economia informal nessa região do mundo é responsável por 80% das transações feitas. Ou seja, transações em dinheiro, que são caras em termos de tempo, manipulação, segurança, distribuição, reconciliação de contas, recibos e por aí vai. Existe uma noção sobre esses tipos de economias, de que todas as transações têm um viés digital versus dinheiro, e que elas atingirão a economia como um todo.
Estudos, alguns conduzidos para a Mastercard por uma universidade alemã e também recentemente pelo Banco da Inglaterra, demonstram que economias com grandes setores informais podem, se impulsionarem a indústria digital, aumentar permanentemente o crescimento de seu PIB entre 2 e 7%. Depende da economia em questão.
F: O que passar pelo programa do Banco Central permitiu?
RA: Esse selo de aprovação nos permite ir a bancos com ideias de parcerias. Isso é importante para popularizar o blockchain e criar pontes na atual infraestrutura financeira.
F: As pessoas em Barbados ou em outras nações estão usando seus dólares de Barbados com a tecnologia da Bitt?
RA: É importante lembrar que Barbados é só uma pequena jurisdição, então quando dizemos que temos 10 mil usos na plataforma, pode não parecer muito, mais existem 80 mil casas em Barbados. Uma penetração de 10 mil não é ruim, e já temos um crescimento constante de transações. Tudo começou com típicas transações peer-to-peer (sem um órgão central) na ilha. Mas, quando inscrevemos comerciantes e criamos uma rede de comércio (existem mais de 1.000 comerciantes da ilha em nossa rede), pudemos incentivar transações. Pequenos restaurantes são grandes usuários da nossa tecnologia.
O que nos surpreendeu foi algumas coisas orgânicas que vimos acontecer. Um bom exemplo é o sistema de transporte, que em Barbados, pode ser público ou privado. Os operadores privados perceberam que o processo digital é mais seguro do que a manipulação de dinheiro.
F: Qual é a diferença entre a forma tradicional de se gastar o dólar de Barbados e o uso da tecnologia da Bitt?
RA: Acredito que é importante reconhecer que, diferentemente de alguns lugares como a Suécia, onde 5% de todas as transações são feitas em dinheiro, nesta região, esse número chega a 80%. Então, usar dinheiro não é bom para alguns tipos de transações. Essa é uma resposta. Não temos uma cultura de e-commerce desenvolvida aqui, então, incorporar o digital traz conveniência às pessoas. Mas isso também é um catalisador para empresas pequenas e médias, que permite que elas impulsionem suas plataformas de e-commerce.
F: Parece que você diz que é mais barato gastar pequenas quantias de dinheiro. Essa é uma maneira mais fácil de explicar?
RA: Para os consumidores, é isso mesmo. Para médias e grandes empresas, há ganhos significantes. E parte disso por conta do custo das transações, que pode ser entre 5% e 15%, dependendo da região.
F: Como essas taxas de 5% a 15% se comparam ao que as empresas pagam à Bitt.
RA: Não são taxas, mas um acúmulo de taxas. Nosso modelo é baseado no lado do comerciante. Esses gastos são considerados quase estruturais. Então, os gastos que propomos é zero contra o que quer que estejam pagando. Temos até um modelo de assinatura.
F: Há um jeito de comparar essa economia?
RA: Há um diferenciador chave aqui. Não temos um gasto de moeda digital. Então, se alguém está pagando para fazer uma transferência de um banco para outro, não temos como fazer essa comparação. Seria 100% de economia. Há comparações no âmbito de pagamentos com cartões. Para um cliente pagar com cartão de débito em Barbados, ele dá ao banco $1,50 por transação. Nós não cobramos nada do consumidor. Cobramos do comerciante 5 ou 20 centavos por transação, e ele escolhe como fazer.
F: Falamos bastante de pagamentos P2P, mas como funcionaria entre empresas e bancos?
RA: Falamos muito com pequenas e médias empresas, porque essas gastam muito com bancos. Também temos negociações grandes com dois bancos, um é regional e valida nossa visão de que, às vezes, é preciso começar de dentro para mudar o que você vê acontecer com o sistema financeiro.
F: Com quem você está trabalhando no momento?
RA: Duas empresas foram avanços para nós. A primeira é a Sol Petroleum, que está presente em 23 países. Ela foi comprada pela Parkland, uma companhia de petróleo canadense, em janeiro. Ela é uma das duas que dominam a rede em Barbados e na região. Temos um piloto com a Sol; pudemos demonstrar economias em relação a métodos de pagamento existentes (já excluindo o custo do dinheiro) em mais de 80% de seus pagamentos pelo seu banco atual. A Sol concordou em funcionar nacionalmente com nosso piloto. Isso é algo novo que queremos fazer no fim do ano.
A segunda é muito significativa para nós, é a rede de supermercados AOne Supermarkets. Novamente, criamos um piloto com eles. É daí que conseguimos muitos dos nossos dados sobre taxas que eles pagam aos bancos, o custo que eles têm com recibos etc..
F: Como está sua interação com bancos centrais desde as notícias sobre o plano da libra e do Facebook de usar criptomoedas baseadas em moedas fiduciárias?
RA: Bom, antes da libra, tínhamos muito contato com bancos centrais por causa do contrato que assinamos com o Banco Central do Caribe Oriental. Mas é um fato que a libra acelerou as coisas. É definitivamente um catalisador. Não posso falar por todos os bancos centrais, mas acho que o Facebook os deixou pensando. Apareceram reações que foram desde as relaxadas, como a do Banco da Inglaterra, até as negativas, como os tuítes do presidente dos EUA, Donald Trump.
Acho que, em geral, é bom para nós. Há diferenças claras entre o que a libra está propondo e o que vemos como uma moeda digital de banco central. Do nosso lado, é importante ser regulado. Com uma moeda digital de banco central, você pode dizer aos clientes que a moeda vai ser aceita, pois é regulada e apoiada por ativos do balanço de um banco central. Essa é a chave.
F: Aumentou o número de bancos centrais que contatou a Bitt depois do anúncio da libra?
RA: Sim, estamos percebemos mais questionamentos. Temos braços que alcançam vários bancos centrais, mas o anúncio da libra aumentou essa comunicação, com certeza. Não estou certo que alguém saiba com clareza como isso vai ser na realidade. Acho que há algumas questões com relação a intenções, que preocupam muito os reguladores. E é por causa disso que somos contatados algumas vezes. Não posso nem imaginar como é no escritório do Facebook.
Nosso chefe de desenvolvimento de projetos tem falado com algumas uniões monetárias da África Ocidental e vários oficiais do banco central em Londres. Ele percebeu um grande aumento nos questionamentos. Isso nos ajudou porque essencialmente podemos falar com funcionários de bancos centrais com mais frequência agora e delinear algumas diferenças que vemos entre o que fazemos e o que a libra quer fazer. Aparecem questões sobre regulações e diferenças entre transações de valores altos e baixos.
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Tenha também a Forbes no Google Notícias