- Jeffrey Epstein foi encontrado ferido em sua cela sob suspeita de tentativa de suicídio;
- Não foi descartada a possibilidade de agressão por parte de outro detento;
- Epstein reclamava das condições da carceragem;
- Advogados do caso e órgãos públicos dos Estados Unidos não comentaram o caso;
- Epstein nunca foi um bilionário. Segundo a Forbes, dinheiro administrado por ele pertencia à Leslie Wexner, e sua fortuna não ultrapassa US$ 500 milhões.
Jeffrey Epstein foi encontrado ferido na noite de ontem (24) em sua cela. Segundo fontes da afiliada da NBC em Nova York, trataria-se de uma possível tentativa de suicídio, entretanto a real causa de seus ferimentos ainda não foi confirmada.
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Em 18 de julho, um juiz de Nova York havia negado o pedido de fiança de Epstein, que entrou com recurso na última terça-feira (23). Outra fonte diz que o detento supostamente encenou uma tentativa de suicídio para ser transferido da prisão. A afiliada da NBC de Nova York diz que Epstein reclamava das condições da cadeia (roedores, inundações e comida ruim).
A Reuters informou que Epstein foi levado para o hospital e, ainda com informações da afiliada da NBC de Nova York, ele está sob vigilância na detenção para evitar possível tentativa de suicídio.
Equipe jurídica de Epstein, a Bureau of Prisons (agência responsável pela custódia dos presos), a US Marshal (unidade da polícia federal dos EUA) e a Procuradoria dos Estados Unidos não comentaram o caso.
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Após ser condenado por uma acusação de prostituição na Flórida e registrado como agressor sexual tanto na Flórida quanto em Nova York, Epstein cumpriu 13 meses em uma prisão do condado com 12 horas de trabalhos prestados, seis dias por semana. Depois de sua libertação da prisão ele foi libertado até ser detido novamente em 6 de julho no aeroporto de Teterboro, em Nova Jersey, sob a acusação de tráfico e conspiração sexual. Ele se declarou inocente.
Como caiu a máscara de Jeffrey Epstein
Nos últimos anos, enquanto sua visibilidade diminuía, certa indignação se manifestava. Desapareceram as figuras ricas e famosas de seu convívio, como Donald Trump, Bill Clinton, o professor de direito de Harvard Alan Dershowitz, o príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman, o príncipe Andrew, Woody Allen e, talvez o mais importante, o bilionário magnata do varejo Leslie Wexner, amigo de longa data e antigo cliente. Em 2003, Wexner falou muito bem de Epstein. “[Ele] é muito inteligente, com uma combinação de excelente discernimento e padrões excepcionalmente altos. Além disso, ele é sempre um amigo muito fiel.” Esta semana, um porta-voz declarou à Forbes: “O Sr. Wexner rompeu relações com Epstein há mais de uma década”.
Depois do movimento #MeToo, Julie K. Brown, do “Miami Herald”, voltou a abordar o caso Epstein em uma série de cinco artigos para investigar o que poderia tê-lo protegido após os promotores terem montado o que parecia ser uma robusta acusação de 53 páginas, com chocantes alegações sobre os abusos de Epstein – de que ele recebia massagens de 36 garotas menores de idade identificadas, sabendo que algumas tinham a tenra idade de 14 anos, e de que, em alguns casos, ele as estuprava.
Segundo os promotores, essa série ajudou o governo a retomar sua própria investigação, que desencadeou uma série vertiginosa de eventos: o confisco da mansão dele em Manhattan, incluindo, possivelmente, milhares de fotos de menores de idade nuas (muitas delas estariam armazenadas em CDs); uma ordem de um tribunal de recursos para abrir documentos relacionados ao processo da Flórida; o distanciamento público de Epstein por parte de Trump; o clamor de Nancy Pelosi e políticos importantes pedindo a renúncia do secretário do trabalho Alexander Acosta, o promotor que fechou o acordo com Epstein dez anos antes; a defesa pública do acordo por Acosta, muito criticada; a tentativa de Epstein de obter fiança oferecendo em garantia seu jatinho particular e sua mansão; acusações dos promotores no sentido de que Epstein tentou comprar testemunhas; e, finalmente, a primeira cabeça a rolar: Acosta, que renunciou ao cargo.
No entanto, embora a investigação tenha escancarado alguns detalhes vívidos da enigmática vida de Epstein – como a decoração de suas várias casas, repleta de fotos emolduradas de menores de idade nuas, uma figura feminina pendurada em um lustre e um conjunto de xadrez personalizado com as peças vestidas de maneira insinuante, esculpido à semelhança de sua equipe feminina –, as pegadas dele ainda são praticamente indetectáveis na internet e nos bancos de dados de registros públicos.
Com toda essa cobertura intensa, talvez o aspecto mais surpreendente seja o pouco que ainda sabemos com certeza. Aqui vão algumas das perguntas que talvez sejam finalmente respondidas:
Até que ponto ele é rico?
Ao investigar essas referências em 2004 e 2005, a Forbes analisou os negócios de Epstein, e dois bilionários que o conheciam nos contaram, separadamente, que achavam que ele estava bem longe de ser bilionário. Um afirmou, também, que o dinheiro que ele administrava pertencia apenas a Wexner. (O documento de fiança de Epstein, divulgado recentemente, indicava que ele tem US$ 500 milhões vinculados a uma única instituição financeira cujo nome não é mencionado e que ele ganha pelo menos US$ 10 milhões por ano.) A Forbes não encontrou nenhum outro indício de que ele estivesse perto da condição de bilionário.
Mesmo assim, os advogados de Epstein, pelo menos, afirmavam que Epstein era bilionário, segundo Adam Horowitz. Este último, um advogado de Fort Lauderdale, representou pelo menos sete mulheres não identificadas que entraram com ações civis contra Epstein na Flórida com vistas a indenizações punitivas, após seu acordo judicial de 2008. E, como Horowitz explicou em entrevista à Forbes, quando se pedem indenizações punitivas, os tribunais geralmente precisam saber o patrimônio líquido do réu para poder tomar uma decisão. Assim, Horowitz enviou pedidos de patrimônio líquido às equipes jurídicas de Epstein.
Deu de cara com um muro de objeções. Os advogados de Epstein teriam dito que seria difícil e caro desemaranhar as finanças dele para determinar o patrimônio líquido real. Ainda assim, diz Horowitz, eles insistiam que ele tinha pelo menos US$ 1 bilhão em ativos – uma estratégia estranha, já que, quanto maior o patrimônio de Epstein, mais ele deveria ser capaz de pagar no caso de um acordo com a outra parte. No fim, Epstein chegou mesmo a um acordo no processo, sem ir a julgamento, por um montante não revelado.
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Porém, se a fortuna dele lhe permitiu escapar dos processos por meio de acordos, não está claro até onde ela pode chegar para bancar novos processos: o “Miami Herald” informa agora que, de lá para cá, já apareceram 12 mulheres fazendo novas acusações contra Epstein.
Horowitz também se lembra nitidamente de seu encontro com Epstein. Ele relata que Epstein marcou uma reunião com seus advogados e Horowitz; este havia descoberto que uma tática notória de Epstein era conhecer os advogados do autor da ação. Durante a reunião, Epstein perguntou sobre os outros processos de Horowitz. Este, especialista em casos de abuso sexual, mencionou que estava representando vários demandantes em processos de abuso sexual contra o clero da Igreja Católica. Horowitz disse que, após descrever esses casos para Epstein, este ficou “atônito” e “enojado”.
“De alguma forma, na cabeça dele, o escândalo de abuso pelo clero era horrível. Ele não conseguia entender como um padre colocaria as mãos em um garotinho”, contou Horowitz. “Foi irônico. Ele não tinha consciência das acusações de que ele próprio era alvo.”
Filho de um casal da classe trabalhadora, nascido no Brooklyn e criado em Coney Island, a primeira incursão de Epstein no mundo dos ricos dos Estados Unidos aconteceu de maneira improvável, durante sua passagem pela elegante Dalton School, em Manhattan, onde lecionava matemática. Ele foi contratado por Donald Barr, pai do procurador-geral dos EUA, Bill Barr, que deu o que falar na semana passada, quando se recusou a se afastar do processo de Epstein.
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Foi através da Dalton que ele conheceu o presidente do Bear Stearns, Alan Greenberg – pai de um aluno –, que achou que Epstein parecia ter uma mente financeira promissora. Ele foi contratado e, tendo o que era visto como uma inclinação para fórmulas matemáticas herméticas e um dom para detectar padrões, virou sócio de responsabilidade limitada em 1980. Entretanto, em 1981, Epstein havia deixado o Bear Stearns – uma reportagem posterior da “Vanity Fair” afirmou que ele foi convidado a sair devido a alguma transgressão desconhecida –, dizendo que queria trabalhar por conta própria. Em 1987, conheceu o financista Steven Hoffenberg, com quem teria iniciado um relacionamento estreito; no ano seguinte, conheceu Wexner, CEO da L Brands, império do varejo que tem em seu portfólio as marcas Victoria’s Secret e The Limited. Na reportagem da “Vanity Fair”, a autora Vicki Ward retratou Hoffenberg – que viria a ser preso em 1995 por planejar o que foi considerado, pela Comissão de Valores Mobiliários e Câmbio dos EUA, o maior esquema Ponzi de todos os tempos – como uma influência fundamental sobre Epstein.
Foi durante o período em que esses dois homens poderosos eram próximos que o sucesso e o poder de Epstein pareceram decolar. Epstein criou uma mística em torno de sua gestora de ativos (inicialmente chamada J. Epstein & Company e depois rebatizada de The Financial Trust Company), dizendo a repórteres que o investimento mínimo era US$ 1 bilhão. Contudo, ao longo dos anos, Wexner continuou sendo seu único cliente conhecido.
Em determinado momento, Epstein se gabou de ter 150 funcionários, mas, durante um depoimento na Flórida, ele revelou que o número era de cerca de 20. A quantidade de dinheiro que Epstein ganhou de fato – e a maneira exata pela qual ele ganhou esse dinheiro – permanece um mistério que muitos observadores esperam que seja elucidado com o prosseguimento das investigações.
Será que vamos ouvir falar mais dos amigos famosos dele?
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Suas outras amizades notórias variam amplamente. Há gente do universo da política e da diplomacia (Clinton, Barr, o príncipe herdeiro saudita Mohammad bin Salman e o príncipe Andrew do Reino Unido), de Hollywood (Kevin Spacey, Woody Allen, Chris Tucker e David Copperfield), dos negócios (Hoffenberg, Wexner, Ron Burkle, Mort Zuckerman, Ronald Perelman, John Pritzker), do direito (Alan Dershowitz, Kenneth Starr, Jay Lefkowitz) e do mundo acadêmico (o matemático e biólogo Martin Nowak, o falecido físico Murray Gell-Mann e o biólogo Gerald Edelman). E essa é só a ponta do iceberg.
Em sua maioria, essas pessoas se distanciaram de Epstein há muito tempo e não estão dispostas a falar dele agora. Spacey, Allen e Copperfield, por exemplo, não responderam a pedidos da Forbes para comentar sobre Epstein.
Epstein não se tornou persona non grata para todos. O bilionário Leon Black, fundador da Apollo Global Management e presidente do Museu de Arte Moderna de Nova York, tinha vínculos com Epstein, inclusive mantendo-o como o único diretor não pertencente à família em sua instituição filantrópica familiar até o final de 2012 (o que Black qualifica hoje como um erro administrativo, dizendo que ele deixou o cargo em 2007). E, em 2015, Epstein teria aparecido em uma festa que Black deu à beira de uma piscina, segundo o “New York Post”.
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Isso não significa que nenhum dos ex-amigos de Epstein será arrastado de volta aos holofotes por causa dele; uma ação judicial pendente contra Ghislaine Maxwell, colaboradora próxima de Epstein, já ameaça expor alguns grandes nomes da política e dos negócios ao escrutínio público.
Outro mistério que está vindo à tona gira em torno de como Epstein conseguiu fechar aquele acordo judicial, como ele evitou ser acusado na Flórida e se (ou como) sua riqueza ajudou a mantê-lo fora da cadeia. Conluios e conjeturas vêm sendo propostos constantemente. Eis o que sabemos. Durante o processo de confirmação de Acosta para o cargo de secretário do trabalho, ele foi pressionado pelo senador Tim Kaine, democrata de Virgínia, sobre o caso Epstein, e disse: “Decidimos que uma sentença ou – como devo dizer – que o Sr. Epstein deveria se declarar culpado para pena de dois anos, cadastrar-se como agressor sexual e admitir responsabilidade para que as vítimas pudessem obter indenização”. Mas, segundo Vicki Ward, hoje colaboradora do site “The Daily Beast”, Acosta havia dito aos entrevistadores da equipe de transição de Trump, os quais aparentemente o estavam avaliando para uma nomeação, que tinha “sido instruído” a abrir mão da ação contra Epstein, que ele “pertencia à inteligência”. O Departamento do Trabalho não respondeu ao nosso pedido de comentário.
Por meio do acordo secreto, Epstein se declarou culpado de duas acusações de prostituição. Embora publicamente prejudicial, o acordo salvou-o em vários aspectos. Ele não precisou se cadastrar como agressor sexual no Novo México, e a promotoria pública de Manhattan, curiosamente, “pediu a um juiz que reduzisse a condição de criminoso sexual de Epstein à classificação mais baixa possível, o que teria limitado as informações pessoais disponíveis ao público e teria impedido que ele fosse incluído em um cadastro de agressores sexuais por toda a vida”. (O juiz negou o pedido.)
Não está claro se a acusação na comarca sul de Nova York, no processo de Epstein, vai lançar luz sobre o tipo de influência externa que pode ter induzido os promotores anteriores ao longo do caso. Os promotores não quiseram comentar sobre nenhum aspecto da questão para a Forbes. Porém, para os observadores, inclusive as muitas mulheres que alegaram ter sido abusadas por Epstein, algumas respostas podem estar à vista.