Se o fogo foi o elemento que mudou a história das civilizações, imagine o quanto ele fez – e faz – para o nosso paladar…
A gastronomia nasceu a partir do advento do fogo. Seu início data da Pré-História, com o homem primitivo descobrindo que os alimentos podiam ser modificados para melhor. Até então, tudo era consumido cru. O fogo trouxe a técnica do cozimento e, a partir disso, o homem notou que não só transformava o sabor dos alimentos como podia criar preparos com o que estava na sua “despensa”. As habitações passaram a contar com novos itens (e até novos cômodos, como a própria despensa).
O fogo construiu a Antiguidade. Os imperadores davam grandes banquetes para comemorações de vitórias em guerras e de importantes eventos familiares. De rústicos buracos no chão (o fogão primitivo), já havia fornos e cozinhas nos palácios e até mesmo nas casas das pessoas comuns – onde ao menos um “cantinho” era equipado para o preparo das refeições. No Egito, o povo inventou a “padaria artística”, produzindo pães de diferentes formas. A tecnologia ligada à culinária foi evoluindo – fogões de barro e metal são encontrados até hoje em chácaras e casas do interior do Brasil (o famoso “fogão caipira”).
Na Idade Média, tudo era regido pela força da Igreja – e a gastronomia seguiu a mesma linha, baseada em vinhos, pães e na cozinha romana. Os monges simplificaram a preparação dos alimentos e enriqueceram a qualidade dos produtos. Passou-se a consumir mais especiarias, como pimentas em geral, noz-moscada, gengibre e outras, principalmente na passagem para a Idade Moderna, graças às grandes navegações. No fogão, o francês Taillevent desenvolvia molhos engrossados com pão e sopas de mostarda e cebola, tornando-se o “cozinheiro dos reis”.
Com a chegada da Revolução Industrial, surgiram novas formas de geração de energia, como o carvão e o petróleo. O norte-americano residente em Londres Benjamin Thompson (Conde de Rumford), na década de 1790, teve a ideia inovadora de transferir o fogo a céu aberto para dentro de uma “caixa”, com panelas e frigideiras também concebidas por Thompson. Em 1826, James Sharp criou um modelo a gás para uso próprio. Era o fogão como o conhecemos hoje. Patenteou-o e começou a produzir dez anos depois. Porém, foi Alexis Benoist Soyer, chef francês radicado na Inglaterra, que popularizou a invenção, alegando ser mais econômica, limpa e livre da incômoda fumaça. Em 1837, Soyer era o chef do londrino Reform Club, em Londres, frequentado por cavalheiros e vários membros ilustres. Quando a sede mudou de endereço, Soyer teve carta branca para desenhar a cozinha – e introduziu fogões a gás, refrigeradores a água fria e fornos com temperatura ajustável. Na coroação da rainha Vitória, o Reform serviu café da manhã para 2 mil pessoas. Sua cozinha ficou tão famosa que foi aberta à visitação pública, chegando a ser a segunda atração mais visitada em Londres, atrás apenas do Museu de Madame Tussaud.
Mas o surgimento dos fogões tinha seus contras. Muitos lamentavam que, ao tomar o lugar da lareira, em volta da qual reuniam-se crianças e adultos, ele ameaçava acabar com a família tradicional. Mesmo assim, em meados do século 19, a variedade de fogões na América era tão grande que os comerciantes criavam anúncios convidativos, mesmo sabendo que grande parte das famílias americanas não tinha dinheiro para comprá-los. Quando as cidades americanas ganharam eletricidade, em torno da década de 1930, a novidade chegou aos fogões. E nos anos 1940, inspirados pelos contornos aerodinâmicos dos aviões, trens e automóveis, os fogões tiveram pés reduzidos ou retirados, ganharam curvas, acoplaram-se às bancadas de trabalho e, anos mais tarde, ganharam os timers e os controles automáticos.
Depois dele veio o espantoso micro-ondas. Daqui para a frente, certamente vamos experimentar outras novidades – porque o prazer de descobrir novos sabores é o mesmo de nossos ancestrais.
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