Por que você deve falar sobre dinheiro com os seus filhos

1 de setembro de 2020
Canva

Como poderia ser sua vida financeira hoje se tivessem ensinado você quando criança

Você já parou para pensar em quais foram os exemplos e as referências que recebeu na infância sobre dinheiro, consumo e o hábito de poupar? Já se perguntou como poderia ser sua vida financeira hoje se tivessem ensinado você a lidar melhor com o dinheiro quando criança?

Em janeiro de 2020, os inadimplentes no Brasil somavam 63,8 milhões de pessoas, o que representa 40,8% da população adulta com o “nome sujo na praça”, segundo dados da Serasa Experian. É evidente que as pessoas atrasam suas contas por inúmeros motivos, e não quero, neste espaço, culpabilizar nossos pais ou cuidadores na infância pelas dificuldades da vida adulta financeira. Falar com as crianças sobre dinheiro é muito mais do que ensiná-las a gerenciar suas finanças, é transmitir alguns valores que irão acompanhá-las para sempre. Esses valores são: ter paciência, saber priorizar e ter propósitos.

Hoje dou início a uma série de conteúdos que irão ajudar você a tratar do tema dinheiro com seus filhos em casa. A seu favor, as crianças têm, na renda fixa*, o benefício do tempo e o poder sobre os juros compostos, algo por si só capaz de oferecer a elas alguma tranquilidade financeira quando adultas. Na renda variável**, os pequenos têm o poder de, desde cedo, conhecer a economia real e apostar em empresas e projetos alinhados aos valores da família. Mas o hábito de investir deve vir acompanhado de uma relação saudável com o dinheiro.

Eu sou mãe de Lara, 10 anos, e Luca, 8, e, desde bem pequenos, falamos sobre dinheiro em casa. É óbvio. Como toda mãe, eu quero para os meus filhos uma vida financeira tranquila e próspera, mas, como sempre digo: “o dinheiro precisa ser o caminho, a ferramenta, e não o fim em si”.

Ensine o que é dinheiro

Afinal, de onde vem o dinheiro? O cartão de crédito é dinheiro? Comece explicando para os filhos o que é o dinheiro e como ele funciona. Eu sugiro começar ensinando o básico: o dinheiro é uma forma de trocar o que você não precisa pelo o que necessita.

Na origem da civilização, as pessoas produziam alimentos e produtos apenas para consumo próprio. Plantavam milho, arroz etc., e, quando havia uma produção em excesso de determinados produtos, trocavam o excedente em comunidade. A evolução dessas trocas deu início ao comércio e, com a descoberta dos metais, o valor da troca passou a ser representado por moedas e, mais tarde, pela moeda de papel, como conhecemos atualmente.

Ao entender o dinheiro como um símbolo de troca, a criança percebe que, antes de gastar, é preciso ter o dinheiro concretamente, fugindo de armadilhas como o parcelamento impensado no cartão de crédito.

Você pode começar pelo clássico cofrinho, ensinando aos filhos que, se querem um passeio ou um brinquedo, devem antes poupar dinheiro para atingir aquele objetivo. Esse é um passo básico, mas que logo de cara ensina a criança a ter paciência e disciplina para guardar hoje, pensando em uma meta futura. Aliás, a paciência deve ser exercida e ensinada às crianças desde bebês, na programação da hora correta das mamadas, por exemplo.

Os pais que atendem prontamente aos desejos impacientes de seus filhos prestam um desserviço a eles e, por conseguinte, à sociedade.

Trabalhar para conseguir dinheiro?

Ao falar sobre as origens do dinheiro, seus filhos provavelmente irão perguntar: mas como conseguir dinheiro? Trabalhar é, sim, uma das formas de se conseguir dinheiro, mas perceba que relacionar o trabalho ao dinheiro não transmite valores a uma criança.

O trabalho, antes de mais nada, precisa ser encarado como uma forma de compartilhar algo com outras pessoas.

Se você trabalha como professor, sua missão não é apenas passar conteúdo, mas ensinar, explicar ao aluno como responder a questões acerca de um problema, fazê-lo pensar sob vários aspectos e, assim, promover a transformação pela via do conhecimento.

Se você é empreendedor, seu objetivo é resolver a dor de uma outra pessoa pela venda de algum produto ou serviço. Se é advogado, você vende seu tempo para defender o cliente e ajudá-lo em questões fundamentais para ele.

O motorista de ônibus leva pessoas para trabalhar, passear, encontrar familiares, realizar sonhos. Dirigir é apenas a forma de propiciar tudo isso.

O trabalho é a venda do seu tempo para resolver a dor de outra pessoa.

Não reclame do trabalho na frente dos seus filhos. Eles irão crescer identificando o trabalho como algo penoso e necessário apenas para se obter dinheiro. Qual é o propósito do seu trabalho? Como ele impacta a vida de outras pessoas? Quanto você aprende todos os dias na sua atividade profissional? Encontre seu propósito e o transmita para as crianças ao seu redor.

Trabalha-se para transformar algo que impacta a vida de alguém.

É preciso ensinar que todo trabalho tem um propósito, não saímos de casa todos os dias pelo dinheiro, mas sim pelo propósito. Se você visa somente o dinheiro, provavelmente, leva a vida no piloto automático, e as crianças tendem a reproduzir as mesmas ações, já que aprendem pelos exemplos, não pelos discursos.

Nem todo trabalho é remunerado, quando você exerce suas obrigações domésticas para promover a ordem e limpeza no ambiente em que vive, transmite às crianças a importância de transformar a vida em comunidade de dentro para fora. Ensinar um menino da mesma forma que ensina uma menina sobre as responsabilidades dentro de casa, por exemplo, é fundamental para que ambos valorizem essas tarefas e possam administrar de forma justa equilibrada o tempo remunerado pela atividade profissional quando chegarem ao mercado de trabalho.

Você pode ainda ensinar a criança doar seu ativo mais valioso, o tempo, a quem mais precisa, com trabalhos voluntários. Seu filho já foi em alguma comunidade carente? Doa os brinquedos que não fazem mais sentido com sua faixa etária para outras crianças? Ao promover esse contato, os pais mostram aos filhos que pequenos gestos têm muito valor e que o preço das coisas é uma forma de pagar pelo tempo empregado para realização das mesmas.

Cuidado ao remunerar seu filho por exercer atividades domésticas, dessa forma, você ensina que, para promover bem-estar coletivo, é preciso receber uma gratificação individual por algo que naturalmente deveria ser uma responsabilidade.

Um filho responsável com seus deveres e que diferencia preço e valor das coisas torna, por meio de pequenas atitudes, a vida em comunidade mais humana e feliz.

 

Francine Mendes é educadora financeira para mulheres, economista pela Universidade Federal de Santa Catarina, com mestrado em psicanálise do consumo pela Universidade Kennedy. Apresentadora do canal Mary Poupe, no YouTube, e comunicadora na RiCTV Record. Instagram: @francinesmendes

 

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