O Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou nesta quarta-feira (7), por unanimidade, proposta de acordo da Nestlé para compra da Chocolates Garoto, anunciada duas décadas atrás, abrindo caminho para fim de processos do grupo suíço que teve a transação barrada inicialmente pelo órgão de defesa da concorrência em 2004.
O julgamento marca a conclusão do caso mais antigo da história do Cade e que inspirou mudanças na legislação antitruste do país em 2012, que estabeleceram que concretizações de negócios somente podem acontecer após passarem pelo crivo da autarquia. Até então, aquisições eram concluídas para só depois serem julgadas pelo Cade.
“Demos um ponto final a um caso de 21 anos”, disse o presidente do Cade e relator do caso, Alexandre Cordeiro Macedo, ao encerrar o julgamento nesta quarta-feira (7).
“É um caso que envolveu diversos conselheiros, formações (do Cade), Judiciário e que gerava muita frustração para o Cade em ter de explicar para a comunidade antitruste como um caso poderia durar 21 anos”, disse Macedo. Ele acrescentou que todas as partes envolvolvidas no processo, incluindo os conselheiros atuais da autarquia, “abriram mão de algum ponto para este acordo”.
A Nestlé anunciou a compra da Garoto em fevereiro de 2002, em negócio, na ocasião, de cerca de R$ 566 milhões que combinava a segunda e a terceira maiores fabricantes de chocolate do Brasil.
O Cade bloqueou a operação em fevereiro de 2004, por cinco votos a um, e demandou a venda da Garoto pela Nestlé a um rival menor. A Nestlé, então, entrou na Justiça com um pedido de revisão judicial da decisão, iniciando uma disputa nas cortes que não foi finalizada até os dias atuais.
Um dos dados utilizados pelo Cade na época, e que ajudou a basear a decisão, era a participação de mercado das companhias em diversos segmentos.
No segmento de chocolates sobre todas as formas, por exemplo, a Nestlé tinha 30,8% e a Garoto 24,4%, conforme levantamento da ACNielsen citado em nota técnica do Cade de março de 2002. Outros levantamentos foram feitos nos meses seguintes, por consultoria e pelo própria autarquia, com algumas diferenças pontuais.
A Nestlé afirmou em documento de janeiro deste ano, que consta nos autos do processo, que enquanto há 20 anos a participação das duas empresas conjuntamente nesse segmento era de 50% a 60%, atualmente Garoto e Nestlé teriam entre 30% e 40%.
A multinacional suíça argumentou que há “a presença altamente competitiva de grupos nacionais e internacionais”, como Ferrero e Hershey’s, entre outros, “afora o exponencial crescimento das chamadas ‘boutiques'”, as quais cita, por exemplo, Cacau Show e Kopenhagen.
Nesta quarta-feira (7), após o julgamento, o presidente-executivo da Nestlé no Brasil, Marcelo Melchior, afirmou que a companhia reforça compromisso com fortalecimento da marca Garoto, apesar da perda de participação de mercado ocorrida nos últimos anos.
“A conclusão do Cade é técnica e revela entendimento sobre um setor que se mostra muito competitivo, aberto e em crescimento”, afirmou o executivo em comunicado à imprensa.
Acordo
O acordo proposto pela Nestlé em março deste ano para encerrar o caso inclui cláusulas sociais e concorrenciais, afirmou o presidente do tribunal do Cade e relator do caso, Alexandre Cordeiro Macedo.
Os remédios incluem compromisso da Nestlé de manter investimentos na fábrica da Garoto, em Vila Velha (ES), por pelo menos sete anos. Além disso, a Nestlé se comprometeu a não adquirir ativos que representem de pelo menos 5% do mercado de chocolates no Brasil por cinco anos. Porém, isso não vale para o caso de aquisições internacionais que tenham repercussão no país e, neste caso, a transação terá de passar pela aprovação do Cade.
A Nestlé ainda se compromete a não intervir por sete anos em pedidos de terceiros relacionados a tarifas diferenciadas na importação de chocolates ao mercado brasileiro.
Como parte do acordo, as partes se comprometem também a encerrar as discussões na Justiça e a Nestlé terá de informar o Cade em caráter público qualquer aquisição de empresa ou marca no mercado brasileiro de chocolates sob todas as formas, mesmo que o negócio não atinja requisitos de faturamento previsto na lei concorrencial.
Segundo o conselheiro Luiz Hoffmann “os remédios propostos são suficientes para afastar qualquer preocupação que poderia ocorrer”.