
Não dá para negar que o ano de 2025 tem sido de grande estresse no cenário político-econômico global. Além de dois grandes conflitos armados com capacidade de impactar a economia mundial, a desordenada política tarifária de Donald Trump tem feito de Washington, D.C o epicentro do caos que toma conta dos mercados.
A queda da bolsa de valores e a desvalorização do dólar traçam parte do cenário, mas o principal ativo para se medir o temor com a economia global é outro: o ouro.
Nos últimos meses, o metal precioso tem batido sucessivos recordes de preço — até agora foram 28 só em 2025, para ser mais preciso. Nesta semana, o preço do ouro ultrapassou a marca de US$ 3.500 por onça-troy, um aumento de mais de 30% no acumulado do ano — e a expectativa é que as coisas não parem por ai. O JP já projeta um patamar acima dos US$ 4 mil já em 2026.
Há uma explicação clássica para isso. Em tempos de incerteza, investidores buscam proteção em ativos considerados mais seguros — e o ouro, com sua longa história como reserva de valor, costuma ser o destino preferido. O fenômeno não é novo. A partir do século XIX, com o advento do padrão-ouro, o metal se consolidou como referência monetária global — função que preserva até hoje, mesmo após o fim formal do sistema nos anos 1970.
Sua força como reserva de valor vem de características específicas: é um metal escasso, não se deteriora com o tempo, tem aceitação universal e não depende da confiança em um emissor, como acontece com moedas fiduciárias. Com isso, o seu valor não é afetado por decisões de política monetária, o que o torna especialmente atraente em períodos de inflação elevada, instabilidade cambial ou colapso de confiança nas instituições.
A alta do ouro em 2025 tem fundamentos sólidos para continuar. Um dos principais vetores é o movimento de compra por parte dos bancos centrais, especialmente em países como China e Rússia, em busca de proteção contra a instabilidade global.
“Acreditamos realmente que cada vez mais pessoas, fundos hedge e bancos centrais estão usando o ouro como proteção contra todas as incertezas que enfrentamos — inclusive incertezas políticas”, afirmou John Plassard, estrategista do Grupo Mirabaud, em entrevista à Forbes Brasil. Diante da possibilidade de uma recessão nos Estados Unidos e do aumento das tensões geopolíticas, o metal precioso reafirma seu papel em tempos de crise.
O cenário de guerra (militar e comercial), desaceleração econômica e deterioração institucional em diversas partes do mundo sustenta essa perspectiva de alta para o metal. “É muito difícil apostar em um cessar-fogo [na Ucrânia]. Se a guerra continuar, isso é uma aposta para o futuro. Então, todas essas questões que cercam o ouro nos convencem de que ele pode subir ainda mais”, conclui.
As duas formas mais tradicionais de se investir em ouro são o investimento direto no metal físico ou a compra de fundos de índice (ETFs, na sigla em inglês), mas há como aproveitar o boom de outra forma — e assumindo outros riscos: comprando ações de mineradoras de ouro.
Mais risco, mais retorno
Se o ouro físico é o porto seguro em tempos de crise, as ações de mineradoras surgem como a alternativa para quem busca mais do que proteção: rentabilidade. Em meio ao boom do metal precioso, esse tipo de investimento oferece vantagens que vão além da simples exposição ao preço do ouro — e ainda parece estar subvalorizado pelo mercado.
Em entrevista à Forbes Brasil, Plassard, estrategista de investimentos do Grupo Mirabaud, apontou que há uma diferença significativa entre o desempenho do ouro e o das mineradoras na bolsa. Para ele, o interesse renovado no ouro deveria beneficiar diretamente as empresas que o produzem. “Quanto mais barulho houver em torno da temática do ouro, mais as mineradoras estarão envolvidas. Existe realmente uma ligação entre o ouro e as mineradoras, claro.”
A explicação é simples: quanto maior a demanda pelo metal, maior será a busca de produtividade das empresas que o tiram da terra.
As mineradoras oferecem um diferencial importante: transparência e flexibilidade operacional. “As mineradoras têm que divulgar seus números e resultados. É mais transparente para o investidor saber se vale a pena comprar essa mineradora ou não”, explicou Plassard. Ao contrário do ouro físico — cuja movimentação depende de dinâmicas geopolíticas nem sempre transparentes ou fáceis de serem antecipadas —, as empresas listadas em bolsa são obrigadas a reportar seus investimentos, projetos e resultados de forma regular.
Plassard também destaca a agilidade de gestão como uma vantagem. “Se houver um período em que a demanda esteja menor, ou se acharem que há menos ouro a ser encontrado, as mineradoras podem desligar parte da operação de um dia para o outro e manter menos funcionários. É muito fácil se adaptar.” Isso oferece maior controle de custos e resposta rápida ao mercado — algo impossível quando se investe apenas no metal.
Outro atrativo citado por ele são os dividendos. “Uma das coisas que dizemos aos clientes sobre ouro é que ele é fantástico, mas não paga dividendos. Já as mineradoras, algumas delas, pagam dividendos. Então, para quem pensa no médio e longo prazo, você pode receber um rendimento anual.” O índice GDM de mineradoras apresenta rendimento médio de 1,93%, superior ao S&P 500 (1,32%), com margem de lucro de 17,61% contra 12,97% no índice americano.
Por que elas estão fora do radar?
Mesmo com fundamentos sólidos, as ações de mineradoras não acompanham o mesmo ritmo do ouro físico. A correlação entre ambos, medida pelo beta histórico, está hoje em apenas 0,47 — um dos patamares mais baixos em quase 30 anos.
Plassard aponta alguns fatores que ajudam a explicar esse descolamento. “Houve, no passado, acidentes em minas de ouro com mortes. E, em alguns países, há trabalho infantil. Então, em termos de ESG, as pessoas veem isso de forma diferente do ouro físico”, disse. Ele também menciona riscos operacionais e geopolíticos. “Se você está em um país onde o governo se envolve, pode haver paralisações, greves que impactam a produtividade da mina.”
Ainda assim, ele vê oportunidade nesse descaso. “A lacuna é grande demais”, resume. E reforça: “o mercado às vezes se esquece que o ouro vem das minas”.
Hoje, mineradoras negociam com um índice EV/EBITDA de 6,5x — menos da metade do S&P 500, que está em 16,5x. Além disso, apresentam endividamento significativamente mais baixo: uma relação dívida líquida/EBITDA de 0,45, contra 1,48 no índice americano. Em tempos de juros altos e economia instável, essa solidez é uma vantagem.
Onde estão as oportunidades?
Ao redor do mundo, há diversas mineradoras listadas em bolsa. Alguns dos principais exemplos são: Newmont Corporation (NYSE: NEM), Barrick Gold Corporation (NYSE: GOLD; TSX: ABX), Agnico Eagle Mines Limited (NYSE/TSX: AEM), AngloGold Ashanti Limited (NYSE: AU; JSE: ANG), Kinross Gold Corporation (NYSE: KGC; TSX: K), dentre outras.
Na hora da análise, é preciso levar em consideração questões de produção, ESG e riscos geopolíticos. Além de múltiplos e a saúde financeira da companhia, como em qualquer outro tipo de análise.
Na hora de investir, Plassard prefere uma abordagem mais ampla. “Quando penso em mineradoras de ouro, prefiro ETF. Um deles é o GDX, que inclui várias mineradoras. Assim, se houver uma má notícia em uma delas, não afeta todo o fundo.” O ETF VanEck Gold Miners (GDX) inclui nomes como Newmont Mining, Barrick Gold, Harmony Gold e Anglogold Ashanti.