FIFA e EA forçam o bilionário setor de games a repensar propriedade intelectual

18 de outubro de 2021

O acordo entre a Eletronic Arts (EA) e a FIFA está avaliado em US$ 150 milhões, cálculos da entidade esportiva apontam que receitas com games podem render até US$ 1 bilhão ao ano (Rafael Henrique/SOPA Images/LightRocket via Getty Images)

Uma disputa bilionária vem mexendo com a indústria de games. Na semana passada, após o The New York Times expor que a FIFA e a desenvolvedora Electronic Arts (EA), parceiras em um dos jogos mais consumidos do planeta, estariam em um impasse quanto aos valores negociados para o licenciamento de uso de marca, a entidade máxima do futebol se pronunciou apontando mudanças na forma como fará a gestão de suas propriedades intelectuais voltadas à tecnologia.

“O futuro dos games e dos e-sports para os fãs do futebol precisa envolver mais que um grupo controlador e explorador dos direitos”, disse a federação internacional de futebol, em comunicado divulgado na sexta-feira, 15. Atualmente, a EA paga US$ 150 milhões anuais para a entidade futebolística que, por sua vez, entende que pode faturar até US$ 1 bilhão por ano com direitos para games. O contrato em questão expira em 2022 após a Copa do Mundo do Catar e estima-se que, nos últimos 20 anos, o jogo FIFA tenha movimentado mais de US$ 20 bilhões.

Além de valorizar sua marca, a FIFA também quer ampliar fontes de receitas com outros ativos tecnológicos, entre eles os NFTs, que se tornaram um elemento importante de receita dentro dos games. Bruno D’Angelo, CEO da WIP, startup que desenvolve propriedades intelectuais para entretenimento, EIP´s, na sigla em inglês, alerta que essa disputa coloca em atenção toda a indústria de games, já que com o crescimento acelerado do consumo de jogos eletrônicos, ter uma propriedade intelectual é sinônimo de receita.

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De acordo com a consultoria Newzoo, essa indústria movimentará US$ 200 bilhões anuais até 2023. “É importante que toda o ecossistema se atente ao processo de construção de uma propriedade intelectual e, sobretudo, entenda onde está sendo ancorada essa estratégia: diferencial de um personagem, jogo ou produtos relacionados. Isso ocorre, principalmente, no equilíbrio entre visão de negócios e a qualidade e consistência de narrativas”, afirma Bruno D’Angelo.

Brasil: uma fábrica de IPs de games

No Brasil, várias propriedades intelectuais em games foram criadas recentemente. O desenvolvedor Pedro Caxa, por exemplo, que trabalha no jogo Camp Wars, fechou uma parceria com o Itaú Unibanco para o lançamento. A Arvore Immersive, estúdio de games e laboratório de tecnologias imersivas, é dona da IP do jogo Pixel Ripped 1989. E a Wildlife, primeiro unicórnio brasileiro de games, detém a propriedade dos jogos Tennis Clash, Zooba e Sniper 3D.

O jogo Camp Wars, do desenvolvedor brasileiro Pedro Caxa atraiu a atenção de parceiros como o Itaú Unibanco (Crédito: Divulgação)

Bruna Soares, diretora de parcerias e negócios da Ubisoft Latam, desenvolvedora dona de clássicos como Tom Clancy’s, Assassin’s Creed, Far Cry Just Dance, e com forte atuação no Brasil, explica que IP é parte fundamental dessa indústria e, sem ela, não se sustentam negócios. “A partir dela você tem o core, o jogo em si, mas é a propriedade intelectual que vai possibilitar ter um ecossistema em torno disso. É a partir dela que você trabalha a visão de futuro e a inovação que te permitem avançar e se conectar com outras áreas de maneira mais fácil como licenciamento, novos negócios e merchandising”, explica Bruna.

Ainda de acordo com a executiva, a Ubisoft trabalha com a visão de expansão de IP. “Assassins Creed, por exemplo, além de ser um dos principais jogos da Ubisoft, é um grande exemplo de IP expandida que já esteve no cinema e com projeto anunciado na Netflix”, afirma.

Muito além dos consoles

A discussão em torno das propriedades intelectuais no mundo dos games tende a ser frequente já que todas as outras indústrias que orbitam em torno dela atraem investimentos cada vez mais relevantes. Carlos Silva, head of gaming do Go Gamers, explica que vários outros contratos que foram feitos em outros contextos serão inevitavelmente revistos. “Talvez lá no início, há duas décadas, EA e FIFA ainda estavam criando o que seria o maior produto licenciado do mundo dos games, e, possivelmente, hoje, as marcas que se envolvem já entendem no primeiro momento que estão se conectando com uma indústria bilionária”, explica.

A parceria entre Ubisoft e Netflix para o lançamento da série de Assassin´s Creed reforça a expansão das licenças além dos jogos (Crédito: Divulgação Netflix)

“O nome FIFA é presente em toda a construção do produto como os FIFA Points, FIFA Ultimate Team e assim por diante. Isso significa que quanto mais imerso, mais presente você está com o público, mas é importante ter clareza do impacto que isso pode gerar no futuro”, explica Carlos.  Ao celebrar o lançamento do FIFA 22, Cam Weber, general manager da EA, reforçou, em comunicado dirigido aos fãs, no início de outubro, que o contrato com a FIFA está, de fato, sendo revisto e defendeu a possibilidade de rebatizar o jogo. “Ao olharmos para o futuro, também estamos explorando a ideia de renomear nossos jogos globais de futebol da EA. Isso significa que estamos revisando nosso contrato de direitos de nome com a FIFA, que é separado de todas as nossas outras parcerias e licenças oficiais em todo o mundo do futebol”, afirmou.