O legado será delas

12 de dezembro de 2022
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Stand da New Holland no 7º Congresso Nacional das Mulheres do Agronegócio

O número de mulheres nas empresas do agronegócio brasileiro cresceu 13,3% no último ano, conforme revelou a pesquisa Diversidade, Equidade e Inclusão nas Organizações, divulgada recentemente pela consultoria Deloitte. Além disso, as mulheres hoje representam 34% dos cargos de liderança nas fazendas, o que é mais do que a média de 27% registrada no universo geral da economia.

Muitos desses empreendimentos estão na segunda ou terceira geração familiar, mas com uma diferença em relação ao que ocorria anteriormente. Hoje são as mulheres que comandam o negócio e se preparam para passar o bastão às futuras sucessoras. Para isso, elas investem em novas formas de pensar o agronegócio, com um olhar voltado aos recursos humanos, à sustentabilidade e ao aumento da capacidade produtiva no campo. Os resultados são propriedades mais lucrativas, mais eficientes e com redução de custos, especialmente com o uso do conhecimento e novas tecnologias, inclusive as embarcadas nas máquinas agrícolas.

“As mulheres do agro são sobretudo inovadoras. Elas possuem uma visão mais ampla do negócio e conseguem administrar de maneira estratégica, investindo em inovação e conhecimento. Hoje vivemos em uma era em que a tecnologia, a digitalização, a servitização e o acesso à informação são processos que têm auxiliado essas mulheres a avançar ainda mais em áreas que antes eram predominantemente masculinas”, afirma Rafael Miotto, vice-presidente da New Holland Agriculture (@newhollandbrasil) para a América Latina.

De acordo com Miotto, como uma marca que está sempre próxima dos clientes e que disponibiliza produtos e serviços inovadores, independentemente do perfil do produtor e do tamanho da operação, a New Holland entende que é preciso trabalhar para criar ainda mais oportunidades para as mulheres, para que elas tenham a possibilidade de mostrar o seu potencial, acelerando um processo que já vem ocorrendo ao longo dos últimos anos no país.

“Elas enfrentam muitos obstáculos, mais do que os homens, na hora de acessar treinamento e crédito, por exemplo. Mas estão tomando a frente nessa mudança. Hoje temos movimentos importantes para enfrentar esse desafio, como o #ÉTEMPODEMULHER, criado pela New Holland e que tem como objetivo estimular e valorizar a importância da mulher no campo com a realização de campanhas, ações de engajamento, capacitação e treinamentos, além da participação em eventos e congressos que priorizam a relevância feminina para o avanço inovador, rentável, sustentável e ético do agro”, diz Paulo Máximo, diretor de marketing comercial da New Holland Agriculture para a América Latina.

REALIDADES DIFERENTES

As realidades das mulheres do agro são bem diversas. Muitas vêm de famílias com origens no campo, outras entram nesse universo vindas de outras áreas profissionais. É o caso de Antonielly Rotolli, que se formou em direito e acabou pivotando a carreira para ajudar o marido agricultor. Hoje ela administra 6 mil hectares de soja e milho e outros 4,5 mil hectares de pecuária em Rondônia e Mato Grosso.

Outra boa história é a de Alessandra Folador, médica veterinária e pesquisadora. Ela trocou a carreira para assumir o legado de 50 anos da família no campo. Atualmente está à frente da BJ Agrícola, que produz sementes para multinacionais, e tem uma marca de sementes própria, a BJ Seeds.

Já Thayna Pozzobon seguiu os mesmos passos do pai. Assim como ele, trocou a carreira jurídica pelo agronegócio. Ela é responsável por administrar 14 mil hectares produtivos da Santa Bárbara Agro, que produz soja, milho, milho semente e outras culturas no estado de Goiás. São realidades distintas, mas com um importante ponto em comum: todas reforçam a presença, a força e a liderança da mulher na agricultura brasileira.

UMA VISÃO ESTRATÉGICA PARA A GESTÃO

“Sempre ouvi dizer que fazenda não era lugar de mulher. Então fui entender os ciclos das culturas, precificação, compra, gestão de pessoas, que no agro é totalmente diferente”

Thayna Pozzobon ainda era pequena quando o pai,  João Telmo Pozzobon, já se dedicava à agricultura. “Somos descendentes de italianos e meu pai acabou indo estudar direito. Depois, ele fez sociedade com dois irmãos que já atuavam no agro e mais tarde acabou seguindo sozinho na atividade. Na verdade, meu irmão, que hoje é engenheiro agrônomo e administrador, sempre demonstrou mais interesse pelos negócios da família”, explica.

Assim como o pai, Thayna foi cursar direito e não demorou para achar vagas em escritórios de advocacia. Em 2015, ela foi intimada a decidir se seguiria na carreira jurídica ou pularia para o “lado de cá”. E pulou. “Não tive coragem de dizer não. Quando uma família constrói alguma coisa, a responsabilidade é muito grande”, diz.

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Thayna Pozzobon, da Santa Bárbara Agro

Atualmente, ela faz a gestão de 14 mil hectares produtivos da Santa Bárbara Agro, que produz soja, milho e milho semente, além de, como alternativa em áreas irrigadas, milho doce, tomate e trigo. Em algumas áreas, são produzidas até três safras ao ano. As propriedades ficam em Silvânia, Água Fria de Goiás e São João da Aliança, em Goiás. A parte administrativa é sediada em Curitiba.

“Sempre ouvi dizer que fazenda não era lugar de mulher. Então fui entender os ciclos das culturas, precificação, compra, gestão de pessoas, que no agro é totalmente diferente. Trouxe para o nosso negócio, que é familiar, uma visão um pouco mais organizada, do ponto de vista de gestão, de estratégias financeiras, de aquisição de insumos e até da venda do nosso produto”, afirma Thayna.

Com duas filhas, uma de 10 e outra de 4 anos, a empresária diz que a mais velha manifesta o desejo de continuar o legado da família. O grupo tem um planejamento e assessoria para lidar com a sucessão. “É um negócio privilegiado. Chegamos até aqui com sucesso, mas tivemos a sorte de o meu pai ter uma vivência também fora do agro, o que abriu os horizontes dele para novas perspectivas. A partir do momento que ele sentiu confiança no que estávamos fazendo, ele soltou
nossa mão.”

Para ela, o segredo daqui para frente para que as mulheres expandam ainda mais a participação no setor é investir na preparação, ter uma boa organização no ambiente familiar e demonstrar profissionalismo. “Sem dúvida, é preciso se perfeiçoar, pois estamos em um setor que está continuamente em mudança, com o surgimento de novas tecnologias, como genética, agroquímicos e maquinário agrícola”, diz.

Segundo Thayna, é preciso incentivar mulheres e homens do campo a estudar permanentemente, pois o futuro do agro vai depender, sobretudo, de pessoas cada vez mais bem preparadas.

UMA PAIXÃO QUE COMEÇOU POR ACASO

Rotina no fórum deu lugar à vida no campo, e o que era temporário virou definitivo.

Foi por acaso que o agronegócio caiu nas graças da bacharel em direito Antonielly Rottoli. Acostumada à rotina no fórum da cidade de Amambaí (MS), aos 18 anos ela conheceu o marido, Edis Sinópolis, que já era produtor rural. Os dois se apaixonaram e se casaram quatro anos depois. Na sequência, ela engravidou, e o casal decidiu ficar na fazenda. No entanto, o que era para durar um curto período se tornou a sua nova ocupação profissional. “Era para eu ficar apenas por um tempo. Esse tempo dura até hoje”, diverte-se Antonielly.

Hoje, o Grupo Agropecuária Espírito Santo, do qual ela, o marido eum cunhado são sócios-proprietários, administra 6 mil hectares de soja e milho e mais 4,5 mil hectares de pecuária em Rondônia – em Alto Paraíso, Machadinho do Oeste e Rio Crespo – e no Mato Grosso, em Colniza. A empresa, porém, só ganhou porte depois que migrou para o Norte do país, em 2013 – ideia que partiu de Antonielly, que conseguiu vencer a resistência do marido.

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Antonielly Rottoli, sócia do Grupo Agropecuária Espírito Santo

“Para crescer, você precisa ver as necessidades que o negócio tem. Precisa ter um sistema, ir atrás de possibilidades, de conhecimento, de assessoria. Hoje o nosso grupo é bem coeso em relação a isso. Temos assessoria na parte de lavoura, de gestão e dos nossos sistemas”, pontua a empresária, que faz questão de compartilhar o próprio conhecimento para incentivar outras mulheres na busca pela qualificação.

“A mulher está se posicionando estrategicamente em vários lugares do agronegócio. São veterinárias, agrônomas, zootecnistas, entre outras atividades, não só na gestão. E hoje somos bastante cobradas, até mesmo pelas próprias mulheres, por isso temos que buscar sempre capacitação. Temos que provar pelo conhecimento que somos capazes”, afirma.

Uma ferramenta facilitadora nesse aspecto é a coletividade. Além de ser presidente do Sindicato Rural de Alto Paraíso (RO) e diretora administrativa da Aprosoja-RO, Antonielly foi uma das fundadoras do movimento Agro Mulheres Rondônia, que hoje possui quase 4 mil seguidores no Instagram. Em agosto, elas realizaram um encontro presencial que reuniu mais de 300 mulheres em Ariquemes (RO) para falar sobre produção sustentável na Amazônia pelo olhar feminino.

“Queremos quebrar barreiras, agregar e inspirar, de modo a gerar informações e dar visibilidade para essas mulheres que buscam o reconhecimento da atuação delas no agro. Acredito que dessa forma somos agentes de transformação”, diz Antonielly.

Mãe de Thayla e Thais, de 12 e 5 anos, respectivamente, Antonielly vê a filha mais velha dar os primeiros passos rumo ao legado da família. “Arrasto elas para todo lado comigo, mas não fico pressionando. Estamos em processo de sucessão com o meu sobrinho também, que está sendo preparado para isso. Minha filha mais velha está começando a conhecer o escritório da empresa. Fico superorgulhosa quando perguntam o que ela quer ser e ela diz: ‘Quero ser igual à minha mãe’.”

DE PESQUISADORA A ADMINISTRADORA DE FAZENDAS

Depois de um ultimato do pai, Alessandra Folador e o marido decidiram dar continuidade a um legado de 50 anos no campo.

Lá se vão 17 anos desde que o pai de Alessandra Folador deu um ultimato à filha: “Você vai querer vir enquanto estou vivo, para eu poder te ensinar alguma coisa, ou vai fazer como os outros e vir só depois para receber a herança e colocar tudo fora?”.

Formada em medicina veterinária, com mestrado e doutorado, ela e o marido, Edgair Martins, não tiveram dúvidas: deixaram a vida acadêmica para tocar o legado de 50 anos de agricultura que corre no sangue da família.

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Alessandra Folador, da BJ Agrícola

“Um pouco diferente do que normalmente ocorre em sucessões familiares, meus pais optaram por transferir parte do patrimônio para cada uma das três filhas, permitindo que cada uma traçasse sua trajetória como bem lhe conviesse. Desde o início, meu pai esteve sempre presente e disponível a dar conselhos e orientações quando requisitado, mas me deu total liberdade na gestão da fazenda”, conta Alessandra.

Hoje ela está à frente da BJ Agrícola, que agrupa atividades nas cidades de Unaí e Bonfinópolis de Minas (MG) e em Formosa (GO), incluindo as Fazendas Reunidas Bom Jesus (com 4,5 mil hectares de área própria), a Bom Jesus Armazéns Gerais e a BJ Sementes, empresa de beneficiamento que produz, além de uma marca própria – a BJ Seeds –,
sementes para multinacionais como Bayer, Syngenta e Basf.

Mas a sucessão não ocorreu sem conflitos. “No início, houve uma certa diferença de pensamentos, até porque eu vim de uma outra área, com formação, e meus pais não tiveram estudo. Mas acho que a maneira como fui criada e como tudo aconteceu na minha vida, sempre de forma tranquila, me permitiram mostrar a eles novas ideias, para que tivéssemos
um crescimento vertical, agregando valor aos produtos agrícolas, trabalhando a terra com mais afinco, com tecnologia e maior controle, mostrando que com isso a gente tem maior lucratividade”, explica.

Com a filha Julia, de 9 anos, que divide com os negócios a atenção da mãe, Alessandra busca estar o mais presente possível no dia a dia das fazendas. “Somos uma empresa familiar, que começou pequena há 17 anos, com sete funcionários, e hoje temos em torno de 80 colaboradores diretos, fora os terceirizados. Gosto de apertar a mão, olhar no
olho, perguntar como está a família de cada um, para que continuemos com esse core familiar.”

Pensar em sucessão ainda é algo precoce, diz ela, que conversa bastante com a filha e tenta envolvê-la nas atividades do campo para que vá tomando gosto natural pela coisa. “Mas também vejo que ela tem que ser livre para fazer o que quiser”, pondera.

O grupo está em fase de planejamento e estruturação, para que as empresas tenham continuidade mesmo que Julia resolva não seguir o caminho da mãe. Segundo Alessandra, há espaço para as mulheres seguirem crescendo dentro do agro. “Por uma questão cultural, a mulher já acorda pensando nos filhos, mas também na reunião que terá no escritório. A cabeça feminina está trabalhando o tempo todo, não só pensando no trabalho, mas na manutenção e administração da casa, do casamento, da criação e educação dos filhos. Somos polivalentes.”

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