Como os limões ajudaram a tornar bilionários um casal da Califórnia

27 de março de 2023
ForbesEUA/Divulgação

Stewart e Lynda Resnick, fundadores da Wonderful

Em um dia ensolarado em Delano, Califórnia, Zak Laffite caminha por pomares onde cultiva um tipo especial de limão, parando para explicar como funciona a colheita. “O que queremos é que a árvore vá frutificando aos poucos”, diz Laffite. “Não queremos que tudo saia ao mesmo tempo. Basicamente dizemos, apenas me dê um pouco.” Laffite pega um limão, tira uma faca do bolso e abre a fruta para mostrar seu interior: sem sementes, com uma fina borda branca e uma casca amarela clara.

“Entramos no pomar e se a fruta estiver deste tamanho, já está pronta para ser colhida. Se estiver amarelada, também já está pronta”, diz Laffite. Na primeira colheita, dois terços dos limões ainda permanecem nas árvores e podem ser colhidos em algumas semanas. Depois, há uma terceira rodada. “Se você fizer isso em outras propriedades, o que está fazendo é basicamente traçar uma curva de oferta muito estável”, diz Laffite, antes de abrir um sorriso. “Trata-se realmente de redefinir a categoria de limões.”

Esses limões sem sementes são a mais recente novidade a chegar à seção de frutas cítricas dos supermercados nos EUA – algo que os agricultores mais ricos da América estão apostando que vai virar a indústria de cabeça para baixo. A Wonderful Co., co-propriedade da dupla Stewart e Lynda Resnick, marido e mulher, espera vender 27 mil toneladas de limões este ano. Em 15 anos, eles querem que sua versão licenciada com exclusividade e sem sementes controle 25% do mercado de limão fresco dos EUA, o que se traduziria em 181,4 mil toneladas no valor de US$ 370 milhões (R$ 1,9 bilhão na cotação atual). Hoje, a indústria é dominada pela marca Sunkist, que pertence ao casal (maior produtor de limões frescos, cultivados na Califórnia e no Arizona), com participação estimada de 50% do mercado.

LEIA MAIS: Como ex-executiva fez uma marca de US$ 1,1 bilhão com frutas e legumes

A Wonderful tem uma presença marcante na indústria cítrica norte-americana e não é de hoje. Nos anos 1990 e início dos anos 2000, a empresa vendia tangerinas com parceiros de negócios sob a marca Cuties; por conta própria, eles já comercializavam a fruta sem sementes, na época chamada de Halos. O que começou como um negócio de terras, para se proteger contra a inflação em 1978, se transformou em uma das maiores empresas agrícolas privadas dos Estados Unidos. A Wonderful aumentou para US$ 5 bilhões (R$ 26 bilhões) suas vendas anuais. Cresceu, a partir de uma combinação da visão de Stewart, para investir em terras do Vale Central e disciplina administrativa das fazendas altamente lucrativas ao longo de quatro décadas, e ao apurado dom de Lynda para o marketing. Metade dos lares americanos já comprou um dos produtos da Wonderful.

Wonderful/Divulgação

Limões frescos têm um mercado anual estimado em US$ 370 milhões nos EUA

Esse tipo de popularidade transformou o casal Resnick em bilionários, com um valor estimado de US$ 5,3 bilhões cada (quase R$ 28 bilhões), e garantiu a Lynda um lugar entre as mulheres mais ricas dos EUA. Sua riqueza vem de pistache, amêndoas, Fiji Water, suco de romã Pom Wonderful e vinho, além de frutas como os limões sem sementes. Mas os cítricos são sua linha agrícola mais antiga – os primeiros hectares que compraram continham cítricos e algumas amendoeiras – e os cítricos continuam sendo uma das maiores divisões da Wonderful.

Limões sem sementes, direto do pomar

Os Resnicks estão se esforçando ao máximo para fazer limões sem sementes. Isso é, em parte, por necessidade comercial. Seu negócio de citros é agora um dos maiores do mundo e possui sua própria fábrica de embalagem de quase 70 mil metros quadrados em Delano, localizada perto dos pomares. O negócio cítrico foi construído usando a popularidade de suas tangerinas para vender a mercearias e distribuidores as demais produções, incluindo laranjas de umbigo, toranjas, limões e limas. Com a Wonderful como pioneira no mercado de mandarim, o setor de ponta tornou-se comoditizado. A Wonderful controla 30% do mercado de mandarim, enquanto os concorrentes recuperaram cerca de 20% na última década. A Wonderful espera que, ao conquistar participação no mercado dos limões Sunkist, o negócio de frutas cítricas da empresa permaneça forte.

Diz Laffite, presidente da Wonderful Citrus: “Quero que meus netos me digam: ‘Vovô, não é verdade que tinha sementes nesses limões?’ E eu responderei: ‘Sim. Deixe-me contar uma pequena história.’”

A história dos Resnicks com os limões sem sementes começou há 12 anos, mais ou menos na mesma época em que a variedade e os produtos Halos de tangerina da Wonderful eram lançados no mercado. Para os limões, de fato, já se vão quase duas décadas como parte dos negócios agrícolas de Resnick. O início se deu quando o casal comprou a licença exclusiva, nos Estados Unidos, para duas variedades diferentes de limões sem sementes, adquiridos de uma empresa de propriedade intelectual que representava os produtores. Uma variedade veio de uma fazenda na Austrália, e a outra veio da África do Sul. Ambos os limões eram resultado de anos de seleção natural para encontrar uma cepa naturalmente sem sementes. Eles não empregam técnicas de transgenia (OGMs) para livrar as frutas das sementes.

De volta à Califórnia, o departamento de frutas cítricas da Wonderful começou a trabalhar. Eles começaram a testar o plantio da fruta no solo do Vale Central e depois plantaram mais nas fazendas dos Resnicks, no México. Foram meticulosos em todo o processo de adaptação.

“O pico de demanda por limões é maior no verão do que no inverno”, diz Laffite. “Nós levamos em consideração todos esses fatores. Realmente, construímos uma curva de demanda e dissemos: se, de uma perspectiva de volume e de tempo tivesse que ser assim, como sobreporíamos todas essas de plantio dedicadas à fruta? Então, foi assim que plantamos, de forma escalonada.”

Os Resnicks têm área para fazer esse tipo de investimento de longo prazo, com risco de que os desafios climáticos e a escassez de água possam ameaçar os limoeiros. Toda a indústria cítrica dos EUA ocupa apenas 280 mil hectares. Os Resnicks cultivam mais de 12 mil desses hectares, principalmente na Califórnia, mas também no Texas. Ao todo, os Resnicks possuem 63 mil hectares de terras agrícolas, com cerca de 50 mil plantados apenas na Califórnia.

A Wonderful também já dispõe de espaço para produção de limões sem caroço. Sua fábrica de embalagem de frutas cítricas, em Delano, atualmente processa 2,7 toneladas de tangerinas por dia. Alguns limões sem sementes já estão nesse jogo, mas a planta ainda dispõe de dois terços de sua capacidade total diária. Assim, a instalação, inaugurada há 11 anos, conta com espaço para processar mais limões sem sementes.

Zak Laffite, presidente da Wonderful Citrus Sem Sementes, diz que esse é o desejo do consumidor. É por isso que os concorrentes já estão tentando criar suas próprias versões. A Sunkist, por exemplo, tem uma variedade sem sementes no mercado que ainda contém algumas sementes. O trabalho, por anos, de criação desse tipo de citrus vem acontecendo em toda a indústria, tentando decifrar o código da produção.

“É uma grande empresa”, diz Tracy Kahn sobre a Wonderful. Khan, é o principal cientista do museu da Givaudan Citrus Variety Collection, na Universidade da Califórnia, em Riverside, que foi originalmente fundada como Citrus Experimentation Station. O órgão trabalha há quase uma década com pesquisadores para criar um limão sem sementes, e eles estão chegando mais perto. Um novo conjunto de variedades está em testes de campo. “É como procurar uma agulha no palheiro”, diz Khan. “Mas eles têm dinheiro para comprar o que querem, em vários lugares diferentes. Ter exclusividade é o que uma empresa deseja no mercado.”

Wonderful/Divulgaçãao

Wonderful trabalha com duas variedades de limões totalmente sem sementes

Kahn acrescenta: “Mas muito do que o marketing faz agora é contar uma história que atrai o público”. Até agora, os produtos de nenhum concorrente são completamente sem sementes, mesmo que sejam comercializados dessa forma.

As licenças exclusivas da Wonderful têm 12 anos de vantagem sobre seus concorrentes, e o desenvolvimento é um processo de pelo menos uma década. Leva três anos até que as árvores dêem frutos e cinco anos até que as árvores estejam maduras.

Os limões sem sementes da Wonderful, que amadureceram a tempo para a estreia em 2020, venderam 91.000 caixas naquele primeiro ano.

São os compradores que decidirão se não ter de enfiar o dedo em seu coquetel para recuperar uma semente de limão desonesta vale um preço mais alto pela fruta. A pesquisa interna da empresa aponta para uma forte base de clientes entre famílias jovens, preocupadas com a saúde e, sem surpresa, com renda mais alta. Atualmente, a distribuição da fruta é mais forte na Califórnia, no meio-oeste e no Texas.

O objetivo da Wonderful, de controlar 25% do mercado de limão dos EUA, exigiria o cultivo de pelo menos 6.000 hectares na Califórnia e no México. Caso esse sonho sem sementes se torne realidade, outras safras que a Wonderful vende atualmente serão menos priorizadas.

Os limões sem sementes já estão plantados em 3.000 hectares – 1.700 hectares nas fazendas dos Resnicks, no Vale Central da Califórnia e outros 1.300 hectares no México e em outras áreas. A Wonderful espera que a produção cresça cerca de 280% nos próximos cinco anos. De volta ao limoeiro, galhos roçando seus braços, Laffite diz: “Estamos na etapa três de sete etapas”. Ele acrescenta ainda: “Este é o momento em que temos volume para experimentar. É aqui que a mágica realmente começa.”