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Hamel já era muito atencioso e consciente com a irrigação que fazia, só regando as vinhas quando precisavam. Portanto, após entrevistar profissionais mais experientes, o consenso foi que ele estava fazendo tudo certo na produção de vinhos de alta qualidade. E sim, ele ficou feliz com os resultados dos seus vinhedos.
Mas acreditava que poderia ter uma bebida ainda melhor se compreendesse profundamente as terras onde cultivava suas vinhas. Hamel estava determinado a procurar alguém que produzisse vinhos de excelente qualidade com agricultura de sequeiro em sua região, onde a precipitação no verão muitas vezes é baixíssima.
Início dos vinhos da Família Hamel
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Em 2006, enquanto Hamel frequentava a universidade, seus pais compraram uma propriedade em Sonoma, com um pequeno vinhedo, para escapar do verão em sua casa principal, em São Francisco. Eles começaram a fazer um pouco de vinho como um hobby, enquanto o filho perseguia sua paixão no cenário lento da comida orgânica durante o curso na faculdade.
Hamel trabalhou em fazendas orgânicas que o levaram a uma pequena operação em Mount Veeder, em Napa, e que abriga impressionantes vinhedos de cabernet sauvignon. Embora ele adorasse o trabalho, precisava encontrar um emprego que pagasse as contas, já que muitas dessas pequenas propriedades rurais ofereciam apenas apenas hospedagem e alimentação como troca de mão de obra. Hamel foi procurar outro serviço e acabou contratado por uma empresa de RP (relações públicas) em São Francisco, focada em vinhos em um projeto sofisticado em Napa.
Hamel também obteve seu certificado de vinificação na Universidade da Califórnia, em Davis, e se tornou o primeiro funcionário em tempo integral da Hamel Family Wines. Depois de muitos anos se dedicando aos estudos, em todos os assuntos relacionados à vinificação e à viticultura, assumiu oficialmente a vinificação e a gestão das vinhas em 2017. No entanto, a sua abordagem não tem sido encontrar as formas mais fáceis de fazer vinho de alta qualidade, mas sim cumprir sua missão de buscar a perfeição, mesmo sabendo que não vai alcançar durante a sua vida.
Uma paixão pela terra
Quando John se lançou num estudo aprofundado para compreender as suas vinhas, a ideia francesa da palavra terroir no vinho (expressão do lugar) deixou ele frustrado.
A família trouxe especialistas para estudar os solos e fizeram uma análise da composição das várias camadas subterrâneas, mas ninguém conseguiu explicar-lhe o que isso significava para o vinho. Um dia, em 2014, Hamel estava ouvindo um podcast de uma entrevista com Pedro Parra, um chileno especialista no conceito de terroir, foi atrás dele e concluiu um doutorado sobre esse tema pelo Centro de Agricultura de Paris. Segundo ele, foi de Parra que ouviu com “clareza” sobre terroir pela primeira vez. O especialista não somente passava muito tempo dando consultoria na França e no mundo, como também auxiliou os principais produtores de vinho de Sonoma.
Então, os dois sentaram para conversar. “Acho que vamos fazer um projeto juntos e vou ouvir os seus conselhos, mesmo que algumas dicas eu vou seguir e outras não”, conta Hamel sobre o início de sua relação com Parra. “Acho que ele viu em Sonoma alguém que estava crescendo e querendo entender as coisas de uma forma mais profunda. Então ele apostou em mim.”
À medida que Parra fazia vários testes nas vinhas, ele também elaborava mapas que dividiam cada talhão de videiras em várias pequenas parcelas, de acordo com múltiplos fatores. No final, cada talhão é diferente do outro, portanto, a gestão e o momento da colheita podem variar entre uma área e outra.
Este conhecimento mais profundo das suas vinhas permitiu a Hamel gerir adequadamente as nuances de cada área e isso ajudou no seu sucesso na agricultura de sequeiro. Em 2017, começou a cultivar no seco 20% dos seus vinhedos; em 2018, até 75% dos vinhedos eram cultivados em sequeiro. Hoje, dependendo da safra, oscilam em torno de 70% ou até mais.
“As pessoas sempre falam que vinhas mais velhas produzem vinhos melhores porque elas têm um sistema radicular muito desenvolvido e prolífico”, afirma Hamel. Ele elaborou ainda mais, observando que sente um sabor mais acentuado em seus vinhos, que acredita ter sido criado pelas raízes mais profundas.
Um benefício da agricultura de sequeiro tem sido a capacidade de colher uvas muito mais equilibradas. Hamel diz que é uma luta na Califórnia, em geral, alcançar, ao mesmo tempo, a maturação do açúcar e da fenólica em níveis ideais. O açúcar é o que se transforma em álcool e também contribui para o desenvolvimento do sabor. No entanto, em contrapartida, o ponto fenólico, que é o desenvolvimento das cascas e sementes, impactam na estrutura geral da bebida.
Se for subdesenvolvido, os vinhos podem ser muito tânicos e com textura áspera. Isso porque, quando se tenta obter aqueles taninos redondos e sedosos com uvas cabernet sauvignon na ensolarada Califórnia, deixando as uvas por muito mais tempo nas vinhas, o açúcar geralmente aumenta muito, enquanto a acidez diminui.
Contudo, desde que Hamel começou a agricultura de sequeiro, essas uvas estão prontas para serem colhidas mais cedo, pois a maturação fenólica é mais rápida, para que os níveis de açúcar nunca fiquem muito altos e a acidez nunca fique muito baixa, permitindo-lhe evitar a água ou adicionar acidez, pois já estão em equilíbrio. No entanto, o produtor observou que um certo déficit hídrico nas suas vinhas deslocou a energia da planta do crescimento vegetativo (crescimento das folhas) para a maturidade dos frutos.
E considerando que ele ainda conseguiu cultivar a seco na safra de 2021, que registrou uma mínima de chuva histórica com 300 milímetros, enquanto a média é de 700 milímetros, os vinhedos tiveram um desempenho excepcionalmente bom, tanto que essa safra ficou entre as duas melhores colheitas da propriedade. Hamel realmente se diz muito confiante de que a agricultura de sequeiro é a melhor prática para as suas vinhas.
Vinhos biodinâmicos na produção
Hamel cultiva seus vinhedos biodinamicamente há vários anos, com certificação a partir de 2015. Mesmo assim, admitiu que achava estar seguindo as regras sem “compreender totalmente” o que cada etapa significava e temia não estar trabalhando de forma correta. Foi então que procurou por uma mulher conhecida no mundo do vinho biodinâmico, que ficava em Bordeaux, na França, chamada Corinne Comme. Ela explicou porque cada etapa era essencial e trouxe diferentes técnicas mais adaptáveis aos seus vinhedos.
Consequentemente, certos sprays biodinâmicos e naturais são mais apropriados para seus vinhedos em Sonoma e a época de tratamento das plantas também é diferente. Agora, ele começa a investigar o uso de plantas nativas usadas pelos povos indígenas na Califórnia para possíveis tratamentos futuros das vinhas, embora perceba que muitas dessas plantas nativas foram usadas para fins homeopáticos em humanos e nem tanto para o manejo de vinhas. Portanto, pode não resultar em nada. Mas ele está pronto para o desafio de compreender melhor estas plantas nos próximos 10 anos e isso pode se tornar uma camada adicional da sua expressão de terroir, também conhecida como sentido de lugar.
A história da descoberta das vinhas de sequeiro
Em 2015, Hamel passou a lua de mel com sua esposa na França e eles acabaram fazendo um tour muito cobiçado com Anselme Selosse, da casa Champagne, produtor de Jacques Selosse, um lugar que tem seguidores sofisticados e entusiastas de Champagne. Hamel estava orgulhoso do empenho com suas vinhas, que partilhou com Anselme, mas, quando o francês descobriu que ele irrigava, disse: “Poderia muito bem ter um monte de vasos de plantas no campo porque isso é a conexão mais forte que você jamais terá com o terroir de lá”, conta ele.
A princípio, Hamel riu do comentário, pois parecia impossível não irrigar na Califórnia, mas a afirmação o incomodou porque sentiu que Anselme poderia não estar errado. Foi assim que ele começou sua jornada para a agricultura de sequeiro.
Mas ele não segue cegamente nenhuma filosofia. Em vez disso, Hamel quer entender como funciona qualquer teoria e, o mais importante, ver os resultados. E está longe de se sentir satisfeito com o que já conquistou e parece que está apenas começando.
E quem sabe, a longo prazo, ele poderá encontrar uma nova maneira de tentar práticas biodinâmicas na Califórnia que sejam ainda mais aplicáveis a esse clima, mas só o tempo poderá dizer. Mas uma coisa é certa: o futuro da Família Hamel Wines é promissor. Os rótulos da vinícola foram recentemente atualizados para refletir o trabalho de Hamel e sua equipe em seus vinhedos “para produzir vinhos que sejam verdadeiramente expressivos do lugar”.
*Catherine Todd é colaboradora da Forbes EUA e escreve sobre vinhos e viagens. É fundadora do blog Dame Wine, e reconhecida entre os 15 blogueiros de vinho mais influentes pela USA Wine Ratings e uma das 10 maiores influenciadoras de vinho no X (ex-Twitter) pela Global Data.