Produtores e indústria do leite têm cenário econômico desafiador em 2024

Apresentado por
15 de fevereiro de 2024
Ollo/Getty

Embrapa Gado de Leite analisa cenário econômico para 2024

Com duas guerras em andamento no mundo, uma entre Rússia e Ucrânia e outra entre Israel e Palestina, juntando-se a isso o fraco desempenho das grandes economias globais e juros elevados, os pesquisadores e analistas do CILeite (Centro de Inteligência do Leite), órgão da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), esboçam um cenário pouco animador para a cadeia láctea em 2024.

“Depois de um ano difícil, 2024 ainda não será o ano da recuperação e continuaremos observando a exclusão de produtores menos eficientes e de pequenos laticínios, como tem ocorrido nos últimos anos”, diz o analista José Luiz Bellini, pesquisador na unidade Embrapa Gado de Leite, em Juiz de Fora (MG).

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Somado à complexa conjuntura global, o recuo das importações chinesas tem mantido os preços internacionais estáveis, mas abaixo da média histórica. Embora demonstrasse uma ligeira alta de 1,6% em relação ao evento anterior, no leilão do dia 5 de dezembro na GDT (Global Dairy Trade) a média de preços das negociações foi de US$ 3.323 (R$ 16.514 na cotação atual) por tonelada, valor que já esteve acima de US$ 5.000/tonelada (R$ 24.850), em março de 2022. “Esses são dados que corroboram para a produção de leite acanhada dos maiores exportadores de lácteos”, afirma o analista.

Mas, se o cenário internacional é motivo de preocupação, o ambiente interno traz possibilidades de melhoria do mercado. O crescimento do PIB em 2023 desafiou as previsões iniciais de 0,5% e superou a marca dos 3%. A inflação está controlada e o desemprego, em queda. “No entanto, esse bom desempenho da economia ainda não repercutiu na cadeia produtiva e o consumo de lácteos continua baixo”, diz o pesquisador Glauco Carvalho, também da unidade Gado de Leite da Embrapa.

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Por ora, a fraca demanda interna também é um dos fatores que comprometem a rentabilidade dos produtores. “Em vários estados, pequenos produtores estão recebendo menos de R$ 1,80 pelo litro de leite, o que é insuficiente para remunerar a produção”, avalia Carvalho. Desde julho do ano passado, a relação de troca do produtor (Índice de Preços Recebidos IPR/Índice de Preços Pagos – IPP) é menor que a média dos últimos sete anos. A consequência da baixa rentabilidade dos produtores é o desestimulo à produção. Já há alguns anos, o volume de leite produzido no Brasil está estagnado em 34 bilhões de litros anuais.

Um fator que também contribuiu para descapitalizar o produtor foi o grande volume de importações ocorridas no ano passado, principalmente no período da entressafra, quando o preço do leite ao produtor fica mais atrativo. “A queda da produção na entressafra foi suprida pelas importações, aumentando a oferta de leite no mercado”, diz Bellini. O analista informa que até setembro do ano passado o volume de leite produzido pelo Brasil cresceu 1,4% em relação ao mesmo período de 2022 e a oferta de leite per capita subiu 5,3% por conta das importações, que superaram dois bilhões de litros de leite equivalente ao longo do ano.

“Mesmo com a desvalorização do leite nacional, as importações se mantiveram motivadas pela grande competitividade externa”, diz Carvalho. Na muçarela, por exemplo, a diferença de preços praticados no Brasil e nos países exportadores chegou 45,8% e no leite em pó integral, 31,5%. Argentina e Uruguai, os principais países exportadores de leite para o Brasil possui preços historicamente mais competitivos devido a uma eficiência média no setor superior à realidade brasileira. Enquanto o preço médio do litro de leite no Brasil está a US$ 0,39, o leite argentino custa US$ 0,35 e o uruguaio, US$ 36.

O CILeite aponta que a pressão das importações fez com que os principais derivados lácteos no mercado atacadista nacional registrassem desvalorização de preços ao longo do ano. No leite UHT, as cotações caíram 18,6% de maio a novembro chegando a R3,76/litro. Na muçarela a queda foi de 15,6%, chegando a R$26,88, no mesmo período. “Não é só no campo; nas indústrias, as margens também foram ruins, com diversos laticínios contabilizando prejuízo no ano que se inicia”, afirma Carvalho.

No final do ano passado, o Governo Federal anunciou duas medidas para incentivar a atividade. A primeira, que entrou em vigor neste mês de fevereiro, altera a aplicação dos créditos presumidos de até 50% para o PIS/Pasep e Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) no âmbito do Programa Mais Leite Saudável. A segunda medida foi a aprovação, pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) de uma linha de crédito especial com subvenção federal específica para cooperativas de produtores de leite, com repasse de mais de R$ 700 milhões.

Perguntado aos pesquisadores e analistas do CILeite o que produtores e laticínios devem fazer para enfrentar um ano que se anuncia difícil, eles sugeriram criatividade e diversificação. A produção de leite artesanal, por exemplo, está em ascensão e pode ser uma saída para muitos produtores.

O analista Lorildo Stock, por sua vez, disse que o produtor precisa se especializar. “A atividade leiteira é complexa e permite fragmentar a produção em setores como volumosos, recria de animais e leite. Pode ser que o pecuarista tenha maior vocação em alguma dessas áreas e ao se especializar, otimiza a produção”. Quanto à indústria, a pesquisadora Kennya Siqueira diz que os laticínios devem diversificar seus produtos de acordo com a tendência do consumo, que aponta para alimentos saudáveis, funcionais e sustentáveis. (Com Embrapa)