Prestes a completar 20 anos, Unique atravessa o mar de dificuldades da pandemia

11 de setembro de 2021
Divulgação

Na avenida Brigadeiro Luís Antônio (SP), com 100 metros de comprimento e 25 de altura, o Unique foi desenhado por Ruy Ohtake, tem design de interior de João Armentano e paisagismo de Gilberto Elkis

Não é fácil chegar às cadeiras Luís XV do check-in do Unique. Sim, elas estão logo ali, próximas à entrada, posicionadas em frente à mesa concebida por João Armentano, mas cada passo demora a acontecer, você hesita, para, observa aqui e ali, não sabe o que admirar primeiro – a começar pela porta, uma obra de arte de 7,5 metros de altura, feita de fibra de carbono, com uma maçaneta de design que extrapola as funções de abrir e fechar um ambiente. No lobby de pé-direito de 6,45 metros, banhado pela luz que invade o teto e as altas paredes de vidro, a visão desliza fácil até a outra extremidade do hotel de 100 metros de comprimento: para alcançar a parede do bar The Wall (homenagem ao Pink Floyd), o olhar passa pelas cinco luminárias grandes e redondas Flying Disk do designer alemão Ingo Maurer (1932-2019); um pouco mais à direita, a Biblioteca (com as convidativas cadeiras I Feltri, do arquiteto italiano Gaetano Pesce), e o Sofá Boa, dos Irmãos Campana. O giro de 360 graus pelo vasto cômodo com móveis e lustres assinados está completo quando a escultura de madeira de São Jorge chama atenção logo à esquerda da entrada.

O impacto de adentrar um dos hotéis de arquitetura mais icônica de São Paulo, que completa 20 anos em 2022, tem sido experimentado por um número cada vez maior de paulistanos e paulistas. Impedidos de viajar além-mar por causa da pandemia, os moradores da capital e do Estado estão sentindo na pele por que o Unique já recebeu diversos prêmios internacionais que o colocam entre os melhores da América do Sul, bem como Top 10 entre os melhores hotéis de luxo do Brasil no Traveler’s Choice, do TripAdvisor – além de fazer parte da Legend Collection na Preferred Hotels & Resorts. Os novos hóspedes se encantam com o hotel da avenida Brigadeiro Luís Antônio, que ganha uma perspectiva muito diferente quando observada a partir do lobby, com as palmeiras enquadradas pelas paredes transparentes.

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Filho de imigrantes lituanos, o empresário paulistano Victor Siaulys (1936-2009), fundador do Laboratório Aché, quis presentear São Paulo com um novo hotel construído no terreno de 2 mil metros quadrados – a primeira ideia foi de um shopping center. Victor, então, chamou um amigo de infância, chapa dos tempos de colégio, na Escola Estadual Presidente Roosevelt, para desenhar algo que se transformasse em um marco para a cidade: Ruy Ohtake, hoje com 83 anos. Deu no que deu. Ruy também desenhou o irmão caçula do Unique: o Unique Garden, inaugurado em 2005, em Mairiporã (SP) – os filhos de Victor são os donos dos hotéis: Jonas, do Unique; Tatiana, do Garden; a terceira filha, Lara, nasceu com deficiência visual, o que mobilizou o pai a fundar, em 1991, a Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual Laramara.

O terreno onde subiu o hotel era estacionamento do restaurante francês Roanne, onde brilhava um dos chefs europeus mais cultuados no Brasil: Emmanuel Bassoleil. Victor, Jonas e Ruy eram frequentadores do Roanne e fisgaram o francês para montar as bases e tocar o que seria um dos restaurantes de maior badalação em São Paulo: Skye (homenagem à vocalista do Morcheeba, Skye Edwards), no topo do prédio, com uma vista espetacular dos Jardins, do Ginásio do Ibirapuera, do Parque do Ibirapuera e o skyline de arranha-céus da avenida Paulista, cintilante com suas antenas e o relógio do Conjunto Nacional. “O sucesso do restaurante foi imediato”, conta Bassoleil. “A expectativa no começo era de 130 pessoas por noite e começaram a aparecer 700. Virou um lugar turístico: quem tinha duas noites em São Paulo, ficava uma conosco, e a outra no D.O.M (do chef Alex Atala).”

MÚSICA DENTRO D’ÁGUA

Feito o check-in, hora de pegar o elevador e ir para o quarto. Bom, agora vai ser “normal”, certo? Não no Unique. O elevador e o corredor para chegar ao quarto também são uma viagem. É no elevador que você percebe a brincadeira de Ohtake com claro e escuro – ao sair do elevador escuro, o contraste com o claro aumenta o deslumbre do desembarque nos andares, no Skye e no Lobby. Já os corredores são cheios de curvas e diferentes em cada andar – os 94 apartamentos (de 36 a 312 metros quadrados) não estão espalhados de maneira uniforme entre o 2° e o 7° andares do prédio de oito pavimentos em formato de meia melancia. A luz que passa pelas janelas redondas cria manchas ovais, claras e dinâmicas no piso escuro dos corredores.

Na primeira noite, fiquei na Suíte Broadway, no 2° andar, a suíte favorita de Ruy Ohtake e de Bob Burnquist – a parede em formato de half pipe foi irresistível para o skatista: ele deixou a porta do quarto aberta, conseguiu subir de skate pela parede, deu a volta por trás da televisão e desceu em velocidade suficiente para sair do quarto. Ao entrar, de novo, parei: estava diante da emblemática janela redonda, de 1,80 metro de diâmetro, tantas vezes namorada pelo lado de fora da fachada. A impressão de uma grande escotilha de navio ancorado na avenida Brigadeiro Luís Antonio ganha força graças ao silêncio da espaçosa suíte.

Comprovado o conforto das mobílias do quarto 203 e o prazer que é trabalhar em uma mesa tão extensa e única, parti para outro clássico do Unique: a piscina climatizada no subsolo, colorida pelas cores da bandeira nacional, com tobogã e sofás de concreto equipados com jatos massageadores. Tinha a informação de que “havia música na piscina”, entendi que era som ambiente, mas precisei mergulhar para compreender: você ouve música dentro d’água. A piscina tem mais um atrativo: teto vazado a céu aberto. Enquanto boiava ouvindo música, admirava nuvens brancas desfilando lentas pelo céu noturno paulistano, pontuado por parcas e valentes estrelas.

SKYE E PISCINA VERMELHA

Hospedar-se no Unique transforma a experiência de ir ao Skye. Sim, o restaurante é excelente em qualquer situação, mas viver o Unique antes de se deparar com o cardápio criado na ponta dos dedos por Emmanuel Bassoleil é outra história. No meu caso, a ocasião ficou ainda especial após uma massagem relaxante na Sala Spa Caudalie: 80 minutos – com direito a ventosas deslizantes pelas costas – sob os cuidados de Rosângela Anselmo, profissional que massageia o Balé da Cidade, no Theatro Municipal. Chá e docinhos no quarto embalam o fim de tarde emoldurado pela janela redonda.

Além da arquitetura, o que salta aos olhos é a atenção – e o tom – do staff do hotel. Boa parte dos funcionários está no Unique há muitos anos, alguns desde a abertura. Esse ambiente agradável e familiar reflete a forma como o diretor geral Wellington Mello, de 37 anos, administra o hotel desde dezembro do ano passado, coroando uma carreira e uma história de vida dignas de filme. Começou a trabalhar aos 13 anos, como garçom extra em buffet infantil. Entrou no Unique no ano da inauguração, em 2002, como ajudante de garçom. Galgou seis posições até chegar ao topo do organograma.

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Wellington tem sangue hoteleiro por parte de pai (potiguar) e de mãe (baiana). Ambos deixaram a roça nordestina para tentar a vida na periferia de São Paulo, na década de 1970. O pai, Edmilson foi steward do Hilton e do Maksoud Plaza; a mãe, Miralva, camareira no Caesar Park. Desde o início da graduação em hotelaria na Universidade Anhembi Morumbi, Wellington estava decidido a alcançar a gerência de alimentos e bebidas – cargo que assumiu no Unique logo aos 23 anos. A rotina puxada de trabalho e estudos, morando no Jardim Guanhembu (extremo sul de São Paulo), fazia-o chegar em casa quase na hora de sair de novo. “Dormia sentado no sofá porque se deitasse na cama não conseguia levantar.” Com especializações no universo do vinho e MBA em Gestão de Hotelaria de Luxo, passou a priorizar viagens enogastronômicas aos principais produtores mundiais. “Aprendi com meu pai que tudo é possível. Procuro disseminar isso no meu time.”

O diretor geral explica que em tempos normais a receita do hotel é dividida em três fatias iguais: hospedagem, eventos e Skye. “Agora, na pandemia, o Skye representa 50%.” Com as restrições de horário no jantar para quem não é hóspede, os clientes estão sendo convidados a ficar no hotel – e tem gente aceitando. Em dois jantares, nem pestanejei na hora de escolher os pratos principais: Robalo Vapor ao creme de champanhe com purê de inhame e caviar, receita criada por Bassoleil em 1992 (“e quando tento tirar do cardápio até os garçons reclamam…”), e Risoto de Lagosta com camarão. Delícias.

No começo de junho, Bassoleil se recuperava da Covid-19. “Fiquei uma semana em casa com dor muscular muito forte, depois foram 15 dias de hospital, sem visita, oxigênio, e quando colocam aquela coisa no seu rosto, você pensa que o próximo passo é entubar e morrer”, recorda o chef. “Aprendi que preciso levantar o pé um pouco. Posso continuar me divertindo, mas não a 120 km/h. Em breve, faço 60 anos.”

Qualquer refeição, claro, é acompanhada por uma caminhada no rooftop do hotel, um mirante fantástico da cidade, sobretudo pelo que se vê no primeiro plano: a piscina vermelha de 25 metros, de Gilberto Elkis, que foi convidado por João Armentano para assinar o paisagismo do hotel. “A ideia da cor vermelha aconteceu em uma reunião”, conta Elkis. “Eu era fumante, olhei para meu maço de Marlboro e falei: ‘Vamos fazer uma piscina vermelha?’ E todo mundo concordou!”, completa sobre a piscina considerada ‘a melhor do mundo’ pela revista “Wallpaper”. “É um trabalho que me rendeu outros até no exterior: o príncipe do Marrocos, Moulay Rachid, esteve no Skye, adorou a piscina e me chamou para fazer uma casa de campo, em Casablanca.” É do paisagista também o Jardim Unique, uma selva de pedras formada pela carga de dez caminhões de mosaico português, poucas plantas e dois estreitos cursos d’água.

Na manhã do meu terceiro dia, após passar a noite na Suíte Paulista (outra com parede curva), horas antes do check-out, me pego hipnotizado pela janela redonda. O devaneio me leva para outra janela redonda, no Parque do Ibirapuera, a dez minutos de caminhada do Unique. Visito o parque numa manhã de quarta-feira, sol de maio, céu azul de doer a vista. Vou até a Oca e paro diante da janela redonda – uno as curvas de Oscar Niemeyer com as de Ruy Ohtake. Como é bonita São Paulo. Como um turista, retorno ao hotel fotografando o Ibirapuera como há anos não fazia. Hora de se despedir da janela da suíte e voltar a admirar a arquitetura externa do Unique. Mas, agora, com outros olhos.

Conheça os ambientes do hotel Unique citados na reportagem na galeria a seguir:

No 8° andar, o restaurante Skye: sucesso de público e crítica
A Piscina Vermelha, considerada das mais lindas do mundo e que tem essa cor por causa do maço de Marlboro de Gilberto Elkis
A suíte Broadway, favorita de Ruy Ohtake e que inspirou Bob Burnquist a andar de skate na parede do quarto
A piscina no subsolo tem as cores da bandeira nacional e música embaixo d’água

Reportagem publicada na edição 88, lançada em junho de 2021.

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