Certas fabricantes instaladas no Brasil apostam que a combinação do etanol com a eletrificação é a solução mais eficiente para reduzir emissões de CO2, sobretudo a dos automóveis. A Stellantis (conglomerado constituído em janeiro de 2021 a partir da fusão da Fiat Chrysler Automobiles com a PSA Peugeot Citroën) é neste momento a maior defensora da causa.
Um estudo recente da empresa revelou que um veículo abastecido com etanol no Brasil emite 25,79 kg de CO2 após percorrer 240,49 quilômetros, enquanto um 100% elétrico baseado na Europa despeja 30,41 kg – isso considerando o conceito ‘do poço à roda’, em que são contabilizadas as emissões também no processo de fabricação do veículo, e não apenas o que sai do escapamento.
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“Da frota circulante de aproximadamente 42 milhões de veículos, cerca de 10 milhões rodam com etanol. Logo, se o etanol tem quase o mesmo nível de emissões do carro a bateria, significa dizer que temos o equivalente a 10 milhões de carros elétricos rodando no Brasil atualmente. Qual o país no mundo que tem essa frota de elétricos? A China tem 6 milhões”, argumenta João Irineu, Vice-presidente de Compliance de Produto da Stellantis para a América do Sul.
De acordo com a AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva), a matriz energética brasileira conta com 80% de energias renováveis, enquanto no restante do mundo essa taxa é de 27%. O carro a etanol só perde para um 100% elétrico alimentado por energia brasileira.
Desde que os carros flex foram lançados, em 2003, o uso de etanol evitou a emissão de mais 620 milhões de toneladas de CO2 para a atmosfera, segundo cálculos da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia).
Projeto de país
O mais acessível será um híbrido do tipo BSG (Belt Starter Generator), onde uma correia ligando o motor ao alternador alimenta uma bateria de 48V. Na prática, o sistema entra em ação para poupar esforços do motor, como em ultrapassagens, por exemplo. Não há neste caso condução em modo elétrico. Por outro lado, suas baterias menores custam menos. “A economia aqui será de 10% a 20%”, calcula Irineu.
Um híbrido convencional (HEV) e um plug-in (PHEV) também estão prontos. Neste caso, um motor elétrico mais potente e amparado por baterias maiores (e mais caras) está conectado às rodas – o primeiro se autocarrega, mas tem baixa autonomia; o segundo pode ser recarregado, aumentando a autonomia e a experiência da condução puramente energizada.
De acordo com Marcio Tonani, Vice-presidente Sênior dos Centros Técnicos de Engenharia para a América do Sul, os três conjuntos – BSG, HEV e PHEV – poderão ser conectados às plataformas mais modernas da Stellantis no Brasil: MLA, base dos modelos Fiat Pulse e Fiat Fastback; CMP, sobre a qual são montados os modelos Citroën C3 e Peugeot 208; e Small Wide, berço de Fiat Toro, Jeep Renegade, Jeep Compass e Jeep Commander.
“Todo nosso portfólio pode ser só a etanol. O etanol é uma joia, que nós como brasileiros exploramos muito pouco. Não podemos globalizar as soluções. O que é bom para a Europa não quer dizer que é bom para o Brasil neste momento”, avalia Tonani. “O etanol é um projeto de país”, acrescenta Irineu.
Não será uma solução acessível tão logo. “Nossa previsão é iniciar a produção já no próximo ano. A tecnologia estará disponível para todas as marcas da Stellantis. A definição de quais marcas e modelos a utilizarão será baseada em estratégias de mercado que definiremos mais à frente”, explica Antonio Filosa, Presidente da Stellantis para a América Latina.
Contudo, a empresa garante que o estreante será um carro de volume.
Na esteira viria o Fastback, ancorado na mesma base.
Governo também aposta no híbrido flex
Um carro híbrido flex não é inédito no Brasil – a Toyota vende aqui o sedã Corolla Hybrid, dotado de um motor 2.0 flex acoplado a um elétrico, desde 2019. Contudo, a tecnologia é importada e apenas encaixada no carro no Brasil.
Em abril, a montadora japonesa anunciou sua adesão ao Programa ProVeículo Verde, que incentiva projetos de desenvolvimento de veículos menos poluentes por meio da liberação de crédito acumulado de ICMS.
Há respaldo também na esfera federal: durante o lançamento oficial da fábrica da Great Wall Motor (GWM), em Iracemápolis (SP), em abril, o Vice-presidente da República Geraldo Alckmin declarou que o híbrido flex é um dos grandes trunfos do país rumo à descarbonização.
“Você vai unir o etanol, que é uma energia limpa, verde, renovável; ao elétrico. Num país continental como é o Brasil, é uma belíssima alternativa, que preserva o meio ambiente”, avaliou o também e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Na ocasião, a marca chinesa confirmou que um dos seus futuros lançamentos, a picape Poer, será híbrida e flex.
“A velocidade do desenvolvimento de novas tecnologias e soluções será proporcional à previsibilidade que as autoridades projetem a partir de suas decisões. Desenvolvimento é decorrência de investimentos orientados por uma estratégia. Por isto é tão importante para nós a evolução do Rota 2030”, alfineta Filosa.
A francesa confirmou o projeto, mas não quis compartilhar informações até o fechamento da reportagem.
Já a General Motors se diz contra o híbrido flex. Oferecerá como solução para a descarbonização no Brasil o elétrico Bolt – que já teve seu fim decretado no mercado norte-americano, onde é produzido.