Fumar maconha depois do trabalho atrapalha a produtividade no dia seguinte?

3 de maio de 2022

Os pesquisadores estudaram como o uso de cannabis em diferentes momentos do dia afetava a capacidade das pessoas de concluir tarefas

Com o aquecimento do mercado da cannabis em todo mundo, decorrente da flexibilização, do plantio da maconha em diferentes países e do aumento de evidências de que o canabidiol, a substância responsável pelos efeitos terapêuticos da planta, pode ajudar no tratamento de diversos problemas, muita gente tem me perguntado sobre o uso da maconha em diferentes situações. Que fique claro. O uso medicinal do canabidiol não tem nada a ver com o consumo de maconha via cigarro. Uma das perguntas que me chegaram é se tem problema fumar maconha depois do trabalho, se isso atrapalha a performance no dia seguinte.

Essa é uma pergunta importante, que vem sendo feita por organizações de países que começam a liberar o uso recreacional da droga e vão ter de lidar com empregados que eventualmente irão trabalhar sob a influência da droga. O tema é interessante justamente porque divide a comunidade médica e a científica. Quero comentar um estudo recente, de 2020, feito por pesquisadores da San Diego State University (EUA) e da Auburn University (Austrália).

Os pesquisadores estudaram como o uso de cannabis em diferentes momentos do dia afetava a capacidade das pessoas de concluir tarefas no seu trabalho e como elas se comportavam em relação aos colegas e ao próprio trabalho. Eles observaram que usar a maconha depois do trabalho não prejudicou o desempenho ou a produtividade no dia seguinte. Mas quem fumou antes e durante o trabalho teve uma performance muito ruim.

Esse trabalho pode levar muita gente a pensar que tudo bem fumar maconha depois do trabalho. Acontece que esse estudo não dá detalhes sobre a quantidade de cannabis que os participantes consumiram – só se eles usaram antes, durante ou depois do trabalho.

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Não fala também que tipo de maconha essas pessoas usaram. Maconha é o nome popular para um conjunto de drogas que vai desde a cannabis propriamente dita até o haxixe, que é fortíssimo e tem cerca de 18% de THC (a substância que causa os efeitos alucinógenos).

O estudo também não fala como foi a experiência para essas pessoas, quer dizer, era a primeira vez que usavam ou já fumavam eventualmente? A Medicina sabe que a primeira prova pode levar a ataques de pânico. Imagine isso acontecer na noite anterior a você ter uma reunião importante?

Outra coisa que deve ser considerada é que é comum a associação de diferentes drogas. Assim, é possível que a pessoa que fuma também beba e, por vezes, até use cocaína. Qual delas levou a um baixo desempenho no trabalho, difícil dizer.

Uma das coisas sobre as quais já há consenso é que a maconha tem um efeito importante na coordenação motora. Ou seja, quem tem uma atividade que exige coordenação – motoristas, por exemplo – não podem de maneira alguma fazer uso da droga, ainda que de forma moderada.

Uma mensagem que acho importante passar, como um profissional que trabalha com isso há mais de 40 anos, é que, assim como acontece com o álcool, não existe um consumo mínimo dessa droga que possa ser considerado seguro. Portanto…

Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.

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