O caminho melodioso até um cérebro saudável na velhice

7 de outubro de 2022
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Aprendizado musical na infância tem relação com a preservação das capacidades cognitivas, diz estudo

Pequeno seria este espaço para que se fizesse uma lista, mesmo breve, dos elogios já feitos à música. Na poesia, na literatura, na filosofia, mesmo nas artes representativas – escultura, pintura e outras – e mesmo na dança e na própria música. Todos temos lembranças doces, ou mesmo dolorosas, às quais está ligada alguma “trilha sonora”. Ficamos encantados diante de um músico que executa à perfeição uma obra e do domínio que tem de seu instrumento. Recomendo a “Variação de um tema de Cármen”, de George Bizet, executada pelo pianista Vladimir Horowitz, que se encontra no Youtube. Impossível desviar o olhar.

 A música seria inclusive uma “linguagem universal da humanidade”, nas palavras do poeta norte-americano Henry Wadsworth Longfellow – e isso foi mesmo verificado cientificamente, segundo estudo da Harvard Data Science Initiative, publicado em 2019. Diz a pesquisa que, seja qual for a sociedade, música se associa a cuidados infantis, cura, dança – e luto, guerra, rituais e outros comportamentos, que não se diferenciam assim entre cada grupo social considerado. Diz a “Harvard Gazette” que, “examinando canções de ninar, canções de cura, canções de dança e canções de amor em particular, músicas que compartilham funções comportamentais tendem a ter características musicais semelhantes”.

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Outra descoberta científica mais recente a respeito da música foi a de que o aprender a tocar um instrumento na infância está associado a habilidades cognitivas mais preservadas na idade adulta do que as de quem não teve treino em nenhum instrumento. O estudo foi feito pela Universidade de Edinburgo (Escócia) e publicado pela revista “Psychological Science”. Foram avaliadas 366 pessoas (nascidas em 1936 e que participaram de uma pesquisa habilidade cognitiva em 1947, aos 11 anos de idade); destas, 117 disseram ter tido, na infância e na adolescência principalmente, algum treinamento com instrumento musical (piano na maioria, mas também acordeão, gaita de foles, violão e violino).

Os pesquisadores adiantam que não se pode fazer, a partir desse estudo, uma conexão necessária entre aprender um instrumento e ter mais capacidades cognitivas preservadas em idade avançada: inúmeros outros fatores influenciariam a pessoa ao longo da vida. Mas foi, sim, possível detectar os benefícios. Esses dados serviriam para informar mais estudos acerca do envelhecimento saudável do cérebro.

Especialistas (não participantes do estudo) indicam os benefícios que o estudo de um instrumento musical pode trazer para o funcionamento da memória, para a coordenação motora, preservação do sistema auditivo, além de beneficiar mesmo a capacidade de raciocínio lógico. E para aqueles que chegaram à idade avançada com um treino musical mais avançado, ainda há o benefício de dispor de uma habilidade artística capaz de encantar e inspirar.

É muito comum que os pais coloquem os filhos ainda pequenos em aulas de música. Ver a criança desempenhar uma peça musical complexa, mostrar virtuosismo diante do instrumento, é coisa que enche qualquer mãe ou pai de orgulho. Agora sabemos que, começando a criança logo cedo na prática musical, além da possibilidade de se estar diante de um futuro grande artista, também se está dando a ela uma ferramenta para preservar sua mente. Se posso fazer mais uma recomendação musical, vale conferir Joey Alexander tocando ao piano “My Favorite Things”, numa versão da interpretação a ela dada pelo saxofonista John Coltrane. Joey tem, nessa apresentação, 12 anos.

Claudio Lottenberg é mestre e doutor em oftalmologia pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp). É presidente do conselho do Hospital Albert Einstein e do Instituto Coalizão Saúde.

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