Google tem rápido, sustentável e divertido crescimento no Brasil

30 de maio de 2015

Françoise Terzian

Letícia Moreira

Letícia Moreira

Quando é o aniversário de Elton John”?, pergunta o presidente do Google Brasil, Fabio Coelho, ao seu smartwatch Moto360, um relógio de pulso inteligente que responde ao comando de voz e permite navegar na internet. A resposta aparece em uma fração de segundos e mostra que o cantor-compositor-pianista-produtor inglês nasceu em 25 de março, o mesmo dia do aniversário de Aluisio Marins, um dos funcionários do Google Brasil, informação que aparece com foto em seu pulso. “Quando você não quer tirar o celular do bolso, no caso de estar no cinema, é só baixar a luminosidade para verificar uma mensagem de forma discreta”, ensina o comandante da operação brasileira da maior empresa de internet do mundo, com valor de mercado estimado em US$ 367 bilhões e receita de US$ 66 bilhões em 2014.

No primeiro final de semana de abril, a tela do Moto360, aparelho que roda Android, o sistema operacional desenvolvido pelo Google para celulares e presente em 90% dos smartphones brasileiros segundo levantamento do Kantar Worldpanel, ficou pequena demais para Coelho ler os 400 e-mails de parabéns que chegaram a sua caixa-postal. Na ocasião, um comunicado interno informava ao time que o presidente do Google Brasil havia sido nomeado vice-presidente do Google Inc., função restrita a um seleto grupo de líderes da companhia ao redor do mundo. Alguns VPs são presidentes de operações locais, mas nem todos os presidentes são VPs. “É uma valorização interna, o que mostra o progresso e o crescimento do nosso negócio no Brasil dentro das operações do Google. Muda a percepção de estatura do negócio e também mostra a valorização do mercado e, óbvio, da liderança”, explica, sem abrir números locais.

A promoção de Coelho, vale lembrar, chega no momento em que o Google completa dez anos de Brasil e que o executivo ultrapassa os quatro anos de casa, com uma aprovação de 93% entre os 700 funcionários do país, segundo pesquisa anual de clima, que é anônima e na qual todos os profissionais da companhia são avaliados. “O percentual começou mais baixo e, com o tempo, foi melhorando. Ao contrário do estilo truculento que só serve para murchar as pessoas, sou adepto do conceito de liderança servidora, do respeito pelas pessoas que trabalham comigo, tanto que considero que trabalho para elas. Quero que a equipe sinta-se bem, valorizada, motivada”, ensina o executivo considerado um dos dez melhores CEOs do Brasil, de acordo com o levantamento que FORBES Brasil publica nesta edição.

“O Fabio tem uma coisa que eu gosto muito que é remar contra a maré. Ele não é um CEO estrela, como grande parte dos que vemos. Ele não segue esse modelo e não tem certas vaidades encontradas em outros executivos desse porte. Toda vez que eu o encontro — uma situação que está ficando mais escassa por nossa falta de tempo —, o papo flui bem, você sempre aprende algo com ele, mas esquece de que está falando com o presidente do Google Brasil”, observa um conhecido e ascendente executivo de mercado que prefere manter seu nome no anonimato.

Mas quem é, afinal, Fabio Coelho? Um nerd workaholic? Embora viva rodeado de gadgets e tecnologias, como é o caso dos telões com uma versão turbinada do Google Earth espalhados por um dos três andares do escritório de São Paulo, Coelho não é um nerd. Em poucos minutos de conversa percebe-se que ele fala mais de relações humanas que de tecnologia — historicamente o grande trunfo do buscador do Google. Apreciador do olho no olho, tem dias que participa de até 20 reuniões — nenhuma com mais de 30 minutos de duração. Assim, acredita, dá para ser mais objetivo, dinâmico e atender mais gente. “Deixo muito espaço para as pessoas virem aqui.”

Workaholic também não é o melhor termo para defini-lo, embora ele trabalhe muito, geralmente das 8h às 20h, e acredite que a excelência vem da “dedicação e da transpiração”. Mas nem por isso abre mão da convivência com a família. “Sou bem casado [com uma colombiana-americana], tenho três filhas [nascidas nos Estados Unidos] e fiz um acordo com elas para equilibrar vida familiar e profissional”, revela esse engenheiro civil natural de Vitória (ES), que aos 16 anos mudou-se para o Rio de Janeiro.

Alçar uma posição tão importante dentro do Google não foi um acidente de percurso. Desde cedo, Coelho buscou empresas emergentes. “Eu sempre fui atrás de negócios que me levassem a reaprender e desaprender. Só que para isso é preciso ter humildade para saber que estamos aprendendo o todo tempo. Ter sido vendedor da Gillette, daqueles que iam aos supermercados e atacadistas, foi uma excelente lição de humildade”, recorda.

Transitando por várias indústrias, Coelho atuou nas áreas comercial e também de marketing de produtos de consumo. “Lancei o Gatorade no Brasil em 1992. Uma das coisas legais é que eu antecipava tendências. Via para onde o mercado estava indo e tentava me capacitar para tentar transformar essas tendências em realidade. Foi assim em consumo, em telecomunicações [ele foi vice-presidente de marketing da BCP na época da gestão pela família Safra], e depois com a internet”, recorda. “Quando você procura negócios precursores, suas chances de aprender coisas novas é muito maior.”

Hoje, ele aprende muito com a geração digital com que trabalha — na média, os funcionários do Google Brasil têm entre 29 e 30 anos. E também aprende com seus superiores. De duas a três vezes por ano, Coelho encontra-se com Larry Page, cofundador e CEO do Google no quartel general da companhia, o Googleplex localizado em Mountain View, na Califórnia, ou então participa de videoconferências com o poderoso chefão. “O Larry é um sujeito de 40 anos que fundou isso tudo do nada, há 16 anos, e que transmite uma energia muito diferente. Dizer que ele é brilhante é redundante, mas, mais do que isso, ele é uma pessoa preocupada em usar a tecnologia a favor do mundo, para melhorar a comunicação, a saúde, o transporte, a energia. E isso tudo me dá uma vontade danada de continuar trabalhando aqui”, diz, com entusiasmo.

O Brasil transformou-se em peça importante no quebra-cabeças do Google global. Com 105 milhões de usuários conectados (cerca de 80% deles por meio do celular), o país posiciona-se como uma das dez maiores operações da companhia no mundo. A filial tem a seu favor um usuá­rio que beira o fanatismo digital. “Estamos entre as maiores taxas de uso do YouTube no mundo [mais especificamente, o Brasil encontra-se entre os cinco países em tempo de vídeos assistidos no mundo]. O Waze é um sucesso astronômico em São Paulo e, por falar em trânsito, mapeamos o Brasil todo com 86 carros e o Street View”, informa.

O objetivo do Google, explica, é promover a inclusão digital, dar mais poder ao usuário e ajudar as empresas a se tornarem mais eficientes. O resultado financeiro do Brasil em 2014 foi muito bom, com crescimento de “dois dígitos bacanas”. Para este ano, Coelho fala da certeza de avançar outros dois “sólidos dígitos”. Quando perguntado se a operação brasileira já passou a fase do break-even e se já registra lucro, ele diz que, “sinceramente, a gente não olha para isso. Somos uma plataforma altamente escalável que reinveste no país, paga todos os impostos e está bem aqui. O que queremos é promover impacto no país”, explica.

“Nosso negócio vai além da tradicional entrega de receita, ebitda. Queremos nos manter como um great place to work [um grande lugar para trabalhar]. O crescimento com qualidade é uma consequência que passa por dois elementos fundamentais e complementares que são a cultura e performance. O Google é mundialmente reconhecido e valorizado por sua cultura organizacional única e também por ser um ambiente de altíssima performance individual e de grupos. Cultura sem performance não se sustenta no médio prazo, e performance sem cultura nos transformaria numa empresa qualquer.”

Comandar o Google Brasil é, ao mesmo tempo, uma grande oportunidade e também um desafio. Comenta-se no mercado que a empresa de internet deve receber a segunda maior fatia da verba publicitária disponível no país depois da Rede Globo. Nem por isso Coelho pode se acomodar. “O mundo está mudando todo dia e é preciso lutar para não ficar irrelevante, não cair no piloto automático. É preciso entender as grandes mudanças de comportamento. O Google, por exemplo, está tendo que se adaptar à explosão dos smartphones no Brasil”, conta.

Crescer para ele é obrigatório, já que “gera reinvestimento e a oxigenação da estrutura no país”. Um dos produtos que o Google tem no Brasil e que ainda precisa se tornar mais conhecido no país é o Google Play, que traz todo tipo de conteúdo, de jogos a livros, de filmes a músicas, nos formatos pago e gratuito. “É um produto com bastante potencial de crescimento.” Segundo a consultoria AppAnnie, o Brasil já é o segundo maior mercado em número de downloads do Google Play. Mesmo assim, nem todo internauta brasileiro já sabe do que se trata.

Fazer com que mais gente use os produtos do Google por mais tempo é uma das metas da subsidiária, que também aposta no crescimento do ambiente digital brasileiro com projetos como a futura abertura de um câmpus no Brasil. Hoje, a companhia já tem câmpus em Londres e Tel-Aviv, espaços nos quais os empreendedores aprendem, se conectam e fundam empresas de alto impacto. Em um prédio de oito andares na região da Paulista (São Paulo), o Google pretende abrir, até o final do ano, o seu câmpus.

Lá, as startups de tecnologia terão acesso à internet banda larga em um ambiente de fomento de grandes ideias e contato com especialistas do Google. A gigante da internet, é bom explicar, não será sócia das startups. Sua ideia é promover o ambiente digital e aprender com o desenvolvimento das novatas.

Aliás, o olhar de aprendiz é uma característica forte do executivo, que se relaciona com o poder há exatos 14 anos, data em que assumiu a presidência de uma empresa pela primeira vez. Hoje ainda, continua a falar como se fosse um novato. “Meu desafio é continuar me desenvolvendo, me atualizando e aprendendo. Fiquei nove anos fora do Brasil. Atuei na AT&T dos Estados Unidos e, no final de 2004, me deram a presidência do negócio de internet da operadora. Por mais que a gente entenda das oportunidades e apresente resultados, imagine o esforço que um presidente não americano precisa fazer para atuar no mercado doméstico de uma companhia dos Estados Unidos e motivar e inspirar a equipe? É preciso entender profundamente quais são os elementos que motivam as pessoas para que aquilo não seja apenas um trabalho, um lugar de ganha-pão. É isso que tento implantar aqui no Google. É preciso ter humildade e sensibilidade para engajar as pessoas”, ensina.

Como explica o executivo, a estrutura do Google é menos hierarquizada e dá poder a toda equipe, uma estratégia em linha com a geração digital da atualidade. Inspirar as pessoas é algo que o Google gosta de fazer. Sua estrutura no Brasil encanta os visitantes com sala de sinuca, biblioteca, vários cafés espalhados pelos andares com todo tipo de comidas e bebidas grátis, um chef de cozinha só para os googlers e espreguiçadeiras espalhadas pelos terraços do imponente edifício Pátio Malzoni, na Faria Lima.

A sede do Google Brasil deixa claro que cada um pode adotar o estilo próprio de trabalhar, usando as roupas que bem desejar e fazendo o próprio horário. O Google dá autonomia e flexibilidade e cobra de volta o cumprimento de metas. “Você é cobrado. Todo mundo tem meta trimestral para cumprir, assim como todo mundo tem resultado de participação na companhia.” Um trabalho, enfim, que parece brincadeira, mas — como se viu — não é nem um pouco.