Quando é o aniversário de Elton John”?, pergunta o presidente do Google Brasil, Fabio Coelho, ao seu smartwatch Moto360, um relógio de pulso inteligente que responde ao comando de voz e permite navegar na internet. A resposta aparece em uma fração de segundos e mostra que o cantor-compositor-pianista-produtor inglês nasceu em 25 de março, o mesmo dia do aniversário de Aluisio Marins, um dos funcionários do Google Brasil, informação que aparece com foto em seu pulso. “Quando você não quer tirar o celular do bolso, no caso de estar no cinema, é só baixar a luminosidade para verificar uma mensagem de forma discreta”, ensina o comandante da operação brasileira da maior empresa de internet do mundo, com valor de mercado estimado em US$ 367 bilhões e receita de US$ 66 bilhões em 2014.
No primeiro final de semana de abril, a tela do Moto360, aparelho que roda Android, o sistema operacional desenvolvido pelo Google para celulares e presente em 90% dos smartphones brasileiros segundo levantamento do Kantar Worldpanel, ficou pequena demais para Coelho ler os 400 e-mails de parabéns que chegaram a sua caixa-postal. Na ocasião, um comunicado interno informava ao time que o presidente do Google Brasil havia sido nomeado vice-presidente do Google Inc., função restrita a um seleto grupo de líderes da companhia ao redor do mundo. Alguns VPs são presidentes de operações locais, mas nem todos os presidentes são VPs. “É uma valorização interna, o que mostra o progresso e o crescimento do nosso negócio no Brasil dentro das operações do Google. Muda a percepção de estatura do negócio e também mostra a valorização do mercado e, óbvio, da liderança”, explica, sem abrir números locais.
“O Fabio tem uma coisa que eu gosto muito que é remar contra a maré. Ele não é um CEO estrela, como grande parte dos que vemos. Ele não segue esse modelo e não tem certas vaidades encontradas em outros executivos desse porte. Toda vez que eu o encontro — uma situação que está ficando mais escassa por nossa falta de tempo —, o papo flui bem, você sempre aprende algo com ele, mas esquece de que está falando com o presidente do Google Brasil”, observa um conhecido e ascendente executivo de mercado que prefere manter seu nome no anonimato.
Mas quem é, afinal, Fabio Coelho? Um nerd workaholic? Embora viva rodeado de gadgets e tecnologias, como é o caso dos telões com uma versão turbinada do Google Earth espalhados por um dos três andares do escritório de São Paulo, Coelho não é um nerd. Em poucos minutos de conversa percebe-se que ele fala mais de relações humanas que de tecnologia — historicamente o grande trunfo do buscador do Google. Apreciador do olho no olho, tem dias que participa de até 20 reuniões — nenhuma com mais de 30 minutos de duração. Assim, acredita, dá para ser mais objetivo, dinâmico e atender mais gente. “Deixo muito espaço para as pessoas virem aqui.”
Workaholic também não é o melhor termo para defini-lo, embora ele trabalhe muito, geralmente das 8h às 20h, e acredite que a excelência vem da “dedicação e da transpiração”. Mas nem por isso abre mão da convivência com a família. “Sou bem casado [com uma colombiana-americana], tenho três filhas [nascidas nos Estados Unidos] e fiz um acordo com elas para equilibrar vida familiar e profissional”, revela esse engenheiro civil natural de Vitória (ES), que aos 16 anos mudou-se para o Rio de Janeiro.
Transitando por várias indústrias, Coelho atuou nas áreas comercial e também de marketing de produtos de consumo. “Lancei o Gatorade no Brasil em 1992. Uma das coisas legais é que eu antecipava tendências. Via para onde o mercado estava indo e tentava me capacitar para tentar transformar essas tendências em realidade. Foi assim em consumo, em telecomunicações [ele foi vice-presidente de marketing da BCP na época da gestão pela família Safra], e depois com a internet”, recorda. “Quando você procura negócios precursores, suas chances de aprender coisas novas é muito maior.”
Hoje, ele aprende muito com a geração digital com que trabalha — na média, os funcionários do Google Brasil têm entre 29 e 30 anos. E também aprende com seus superiores. De duas a três vezes por ano, Coelho encontra-se com Larry Page, cofundador e CEO do Google no quartel general da companhia, o Googleplex localizado em Mountain View, na Califórnia, ou então participa de videoconferências com o poderoso chefão. “O Larry é um sujeito de 40 anos que fundou isso tudo do nada, há 16 anos, e que transmite uma energia muito diferente. Dizer que ele é brilhante é redundante, mas, mais do que isso, ele é uma pessoa preocupada em usar a tecnologia a favor do mundo, para melhorar a comunicação, a saúde, o transporte, a energia. E isso tudo me dá uma vontade danada de continuar trabalhando aqui”, diz, com entusiasmo.
O Brasil transformou-se em peça importante no quebra-cabeças do Google global. Com 105 milhões de usuários conectados (cerca de 80% deles por meio do celular), o país posiciona-se como uma das dez maiores operações da companhia no mundo. A filial tem a seu favor um usuário que beira o fanatismo digital. “Estamos entre as maiores taxas de uso do YouTube no mundo [mais especificamente, o Brasil encontra-se entre os cinco países em tempo de vídeos assistidos no mundo]. O Waze é um sucesso astronômico em São Paulo e, por falar em trânsito, mapeamos o Brasil todo com 86 carros e o Street View”, informa.
“Nosso negócio vai além da tradicional entrega de receita, ebitda. Queremos nos manter como um great place to work [um grande lugar para trabalhar]. O crescimento com qualidade é uma consequência que passa por dois elementos fundamentais e complementares que são a cultura e performance. O Google é mundialmente reconhecido e valorizado por sua cultura organizacional única e também por ser um ambiente de altíssima performance individual e de grupos. Cultura sem performance não se sustenta no médio prazo, e performance sem cultura nos transformaria numa empresa qualquer.”
Comandar o Google Brasil é, ao mesmo tempo, uma grande oportunidade e também um desafio. Comenta-se no mercado que a empresa de internet deve receber a segunda maior fatia da verba publicitária disponível no país depois da Rede Globo. Nem por isso Coelho pode se acomodar. “O mundo está mudando todo dia e é preciso lutar para não ficar irrelevante, não cair no piloto automático. É preciso entender as grandes mudanças de comportamento. O Google, por exemplo, está tendo que se adaptar à explosão dos smartphones no Brasil”, conta.
Crescer para ele é obrigatório, já que “gera reinvestimento e a oxigenação da estrutura no país”. Um dos produtos que o Google tem no Brasil e que ainda precisa se tornar mais conhecido no país é o Google Play, que traz todo tipo de conteúdo, de jogos a livros, de filmes a músicas, nos formatos pago e gratuito. “É um produto com bastante potencial de crescimento.” Segundo a consultoria AppAnnie, o Brasil já é o segundo maior mercado em número de downloads do Google Play. Mesmo assim, nem todo internauta brasileiro já sabe do que se trata.
Lá, as startups de tecnologia terão acesso à internet banda larga em um ambiente de fomento de grandes ideias e contato com especialistas do Google. A gigante da internet, é bom explicar, não será sócia das startups. Sua ideia é promover o ambiente digital e aprender com o desenvolvimento das novatas.
Aliás, o olhar de aprendiz é uma característica forte do executivo, que se relaciona com o poder há exatos 14 anos, data em que assumiu a presidência de uma empresa pela primeira vez. Hoje ainda, continua a falar como se fosse um novato. “Meu desafio é continuar me desenvolvendo, me atualizando e aprendendo. Fiquei nove anos fora do Brasil. Atuei na AT&T dos Estados Unidos e, no final de 2004, me deram a presidência do negócio de internet da operadora. Por mais que a gente entenda das oportunidades e apresente resultados, imagine o esforço que um presidente não americano precisa fazer para atuar no mercado doméstico de uma companhia dos Estados Unidos e motivar e inspirar a equipe? É preciso entender profundamente quais são os elementos que motivam as pessoas para que aquilo não seja apenas um trabalho, um lugar de ganha-pão. É isso que tento implantar aqui no Google. É preciso ter humildade e sensibilidade para engajar as pessoas”, ensina.
Como explica o executivo, a estrutura do Google é menos hierarquizada e dá poder a toda equipe, uma estratégia em linha com a geração digital da atualidade. Inspirar as pessoas é algo que o Google gosta de fazer. Sua estrutura no Brasil encanta os visitantes com sala de sinuca, biblioteca, vários cafés espalhados pelos andares com todo tipo de comidas e bebidas grátis, um chef de cozinha só para os googlers e espreguiçadeiras espalhadas pelos terraços do imponente edifício Pátio Malzoni, na Faria Lima.