Os próximos desafios de Maurício Rolim Amaro e da LATAM

6 de janeiro de 2016

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Quando seu pai, Rolim Adolfo Amaro, faleceu em 8 de julho de 2001 em um acidente com o helicóptero que pilotava em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, Mauricio não estava preparado para tal tragédia. O restante da família, também não. E a empresa de propriedade do clã, a TAM Linhas Aéreas, menos ainda. O golpe foi tão forte que alguns duvidaram de que a empresa sobrevivesse. Estavam errados. Nos anos seguintes outras aéreas nacionais como Vasp, Varig e Transbrasil fecharam as portas de suas aeronaves para sempre. A TAM, não sem dificuldades, manteve-as abertas. E hoje Mauricio Rolim Amaro, de sua posição no conselho do grupo que a sucedeu, a Latam, enxerga os dias amargos que vieram logo após a morte do comandante Rolim exatamente como aquilo que são: passado. Ele sabe que de lá ele e seu negócio ganharam novas asas. Chegou a hora de usá-las.

“O acidente que levou meu pai foi um baque tanto profissional quanto pessoal”, lembra. “As decisões e escolhas que tive de fazer na ocasião não tinham nenhuma relação com o caminho que eu havia trilhado até aquele momento. Eu não estava pronto, e o restante da família tampouco, para lidar com os conflitos que surgiram, pois não havia qualquer plano sucessório.” Foi então que Mauricio — que começou na TAM como piloto de aeronaves modelo Caravan e Fokker e depois atuou como administrador, vendedor e também piloto da linha de jatos Citation — resolveu entrar para valer no mundo das decisões estratégicas.

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“Foi um processo lento e muitas vezes frustrante. Uma pessoa de 30 anos, minha idade à época, não está pronta para uma responsabilidade tão ampla”, lembra. Felizmente seus familiares mantiveram-se unidos. “Um dos fatores fundamentais para que conseguíssemos atravessar aquele período turbulento foi o equilíbrio de todos. Muitas famílias brigam por patrimônio, poder ou mesmo por imaturidade. Nós conseguimos escolher bons caminhos porque mantivemos nossa unidade. Foi difícil, mas a alternativa seriam as más escolhas.” Não que ele ache só ter acertado no processo: “Bem, já tomei algumas decisões equivocadas, mas a união familiar ajudou, e muito, na superação e correção de tais erros”.

Mauricio concedeu entrevista a FORBES Brasil poucos dias após o anúncio, em agosto, de que as marcas TAM e LAN — as duas empresas que em 2010 anunciaram sua fusão, concluída operacionalmente em 2012 — deixarão de existir em favor de uma nova, a Latam. Trata-se do ápice de um movimento que gerou a maior empresa aérea da América Latina e uma das maiores do mundo. A transição será gradual — o primeiro avião com a nova logomarca deve sair do hangar apenas no início de 2016 —, porém irreversível. A soma da brasileira TAM com a chilena LAN (pertencente à família Cueto e presente, além do Chile, na Argentina, Peru, Equador e Colômbia) torna a Latam uma player global em um setor que, cada vez mais, somente terá espaço para companhias de enorme porte em seus céus. E isso porque o transporte aéreo é um ramo da economia dos mais desafiadores sob o ponto de vista financeiro. As margens de lucro nele são estreitíssimas — quando existem.

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Certa vez perguntaram a Richard Branson — dono da Virgin Atlantic Airways, uma das maiores empresas de aviação do Reino Unido — qual era o segredo para que alguém se tornasse milionário investindo no setor aéreo. Ele, com absoluta seriedade, respondeu que só havia uma maneira de fazê-lo: o investidor em questão teria de já ser bilionário antes de se aventurar no ramo. Na sequência, este indivíduo irá perder todos os seus bilhões durante os anos em que for proprietário de uma companhia de aviação. Um belo dia, farto dos prejuízos, abandonará a atividade a tempo de reter ao menos alguns milhões de sua fortuna original. Pronto: eis aí alguém que se tornou milionário investindo no setor aéreo. Mesmo sem ir tão longe, Mauricio confirma: “Nosso ramo, historicamente, não retorna o capital aportado”. A solução? Disciplina na gestão do negócio. “A aviação americana, por exemplo, passa por seu momento de maior disciplina dos últimos sete anos. Resultado: as empresas de lá são atualmente bastante rentáveis, e conseguem investir em novos produtos e na modernização das frotas.” É nesta rota, a de uma aérea cada vez mais bem gerida, que ele deseja que a Latam voe.

Hoje seu cargo é o de presidente do conselho da empresa. Isso o leva muitas vezes a outros países. Mas continua bastante atento ao Brasil: “A TAM segue como líder local quando somamos os mercados doméstico e internacional. Mas este é um ano difícil. A valorização do dólar, além de impactar custos, afetou muito a demanda. As pessoas tendem a suspender viagens sob tanta volatilidade, e o próprio tráfego corporativo diminui. Além do mais, quem voava especialmente para fazer compras no exterior foi ainda mais afetado”. Será uma travessia difícil até dezembro de 2015. “Vamos iniciar uma modesta redução da capacidade até o final do ano”, diz. Mas ressalta: “Trabalhei muito pela criação da Latam e estou convicto de que foi o melhor caminho. Sempre acreditei que a beleza de nossa união com a LAN seria dispor de uma rede de conexões e um fluxo de passageiros maior do que todas as empresas da região. E, de fato, isso nos dá uma capacidade única de conquistar novos mercados — uma tarefa que, sozinha, a TAM não daria conta”.

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Ele critica a infraestrutura aeroportuária nacional: “A privatização finalmente decolou em alguns complexos, como os de Guarulhos (SP), Brasília e São Gonçalo do Amarante (RN), mas mesmo assim temos muito a avançar. Os índices de eficiência ainda são baixos na maioria de nossos aeroportos quando comparados com os do exterior”. E Mauricio continua: “Aliás, não podemos pensar somente nos terminais. As instalações e condições de trabalho dos funcionários das empresas em certos lugares são simplesmente lastimáveis. Recentemente visitei alguns aeroportos no Nordeste e fiquei chocado com o que vi. É urgente privatizar todos os principais aeroportos do país. Alguns certamente devem continuar sob a gestão da Infraero, por falta de escala. Mas defendo que o maior número possível passe para a iniciativa privada”.

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Seu pai, o comandante Rolim, nasceu em 1942 no município de Pereira Barreto, interior paulista, em uma família muito pobre. Ainda jovem apaixonou-se por aviação e conseguiu tirar a licença de pilotagem, conhecida como brevê. Após anos de trabalho assumiu, em 1972, o controle da TAM (sigla para Táxi Aéreo Marília), onde já era contratado. Até sua morte, conduziu-a mirando dois alvos: expansão contínua da malha aérea e excelência no atendimento de bordo. Este último aspecto é enfatizado por Gianfranco Beting, CEO da consultoria Jetgroup. Ele se recorda de um episódio marcante. “Em 1990, eu era vice-presidente da Transbrasil. Houve um jantar em São Paulo em que compareceram os principais executivos do setor. Em certo momento, começou-se a discutir qual seria a maior aérea brasileira quando chegasse a virada do milênio. Não tive dúvida em dar minha opinião: a TAM”, lembra Beting. “Diante do espanto geral — a companhia, na época, era bem menor que as concorrentes —, eu cravei: ‘Enquanto nós ficamos fazendo cortesias para brigadeiros, o Rolim passa seus dias cuidando do bem-estar dos passageiros. E é por isso que ele vai nos ultrapassar’.”

Ultrapassou. Em março de 2001, 11 anos depois desse episódio, a TAM tornou-se a maior de seu ramo no país. Porém, na visão dos Amaro, havia um salto ainda mais importante a ser dado: converter-se em uma das líderes globais do setor. Mas para tanto seria preciso aliar-se a alguma outra gigante dos ares; a fusão com a LAN nasceu de tal pensamento. “Sempre acreditei em sociedades e acho que parte do meu êxito vem dos meus sócios. Tanto dos familiares como dos que não o são”, enfatiza Mauricio. “Ter sócio pode ser ótimo. Você divide o risco, divide os investimentos e as preocupações. Por outro lado, vai dividir as decisões e vai perder autonomia. Para mim, o importante é que haja respeito em qualquer situação. Pode-se discordar, mas o respeito tem que ser mantido.” E ele dá uma pista de sua personalidade: “Sociedade demanda confiança e, em certa medida, humildade. Em algum momento você vai ter de abrir mão de algo e, caso seu ego seja grande, isso o tornará um problema para seus negócios e para si próprio. Eu sempre fugi de gente vaidosa”. Boa administração e atitudes corretas, em síntese: eis as novas asas da Latam.