Por que o medo dos operários é péssimo para os negócios

23 de outubro de 2018
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Sindicatos representam apenas 10% da força de trabalho da manufatura.

Nos últimos 20 anos, os empregos nas indústrias nos Estados Unidos tornaram-se mais inseguros e precários. O uso de profissionais temporários aumentou dramaticamente: 47% desta força de trabalho está na manufatura. Enquanto a economia melhora, os salários dos trabalhadores industriais continuam a diminuir e mais de um terço deles estão atualmente inscritos em algum programa de assistência pública. Os sindicatos, que historicamente protegiam a classe quando surgiam preocupações relacionadas à segurança, erros de produção e processos ineficientes, agora representam menos de 10% da força de trabalho da manufatura.

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O resultado dessa instabilidade nas fábricas é a presença constante do medo. Medo de perder o emprego, do assédio e de não receber uma promoção.

“Quando denuncio um risco à segurança, imediatamente sou interrogado pelo meu líder e rotulado como encrenqueiro. Isso significa que eu tenho que decidir se quero arriscar uma lesão ou se quero que minha vida seja um inferno”, diz um trabalhador de uma fábrica na zona rural de Illinois:

O medo da pressão é bem fundamentado. Um relatório de 2009 do National Employment Law Project descobriu que 43% dos operários com baixos salários entrevistados ​​em Nova York, Los Angeles e Chicago sofreram represálias ilegais por parte de seu empregador depois de fazer queixas relacionadas à segurança. Um estudo recente da Ethics and Compliance Initiative (Iniciativa de Ética e Conformidade, em tradução livre) concluiu que o percentual de funcionários que afirmam ter sofrido retaliações aumentou de 22% para 44% desde 2013.

Na mesma linha, um relatório da Equal Employment Opportunities Commission (Comissão de Oportunidades Iguais de Emprego, em tradução livre) descobriu que 75% de todas as pessoas que relataram assédio sexual em seus locais de trabalho já passaram por alguma situação de pressão psicológica no âmbito profissional.

O medo do trabalhador fabril é ruim para a moral e o bem-estar dos funcionários em geral e pode afetar a saúde do segmento industrial. Nos últimos 12 anos, a produtividade nas fábricas norte-americanas diminuiu, em média, 0,3% ao ano. Os mesmos itens são produzidos com mais horas de mão-de-obra e custos ligeiramente maiores, apesar do aumento da eficiência criada pelo uso de robôs e outras tecnologias de aumento de velocidade. Enquanto alguns pesquisadores especulam que a baixa escolaridade dos trabalhadores é a culpada deste cenário, o medo e a incerteza enfrentados pelos colaboradores também podem contribuir.

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Existe uma reclamação comum de muitos operários na última década. Devido à intimidação sofrida, eles permanecem em silêncio, apesar de terem boas ideias para melhorar a produção e reduzir erros e riscos. “Quando um supervisor me pede para disfarçar um erro, eu o obedeço. Reclamar com a alta gerência provavelmente me renderia apenas uma demissão e eu preciso desse emprego”, disse um funcionário de equipamentos pesados de manufatura baseado no Sul do país.

Há 25 anos, o especialista em gestão Dr. W. Edwards Denning redigiu uma espécie de tratado com cerca de 14 melhores práticas para alavancar a produtividade das empresas. Nele, enfatizou o valor do comprometimento dos cargos mais elevados com o feedback aos colaboradores do chão de fábrica e o afastamento do medo em relação ao local de trabalho. Dennings argumentou que a insegurança prejudica o trabalho em equipe e “é um convite para uma imagem ruim”. “Os portadores de más notícias não são bem vistos. Para manter o emprego, qualquer um pode dizer ao chefe apenas coisas boas”, diz.

Outros especialistas também enfatizaram os benefícios de ouvir os operários. Um estudo de caso da Harvard Business Review atestou o esforço bem-sucedido do fabricante de materiais alemão Isola Group para reorganizar a produção com ideias dos trabalhadores.

O chefe do local, o planejador da produção e o controlador da operação transformaram seu espaço de trabalho no chão de fábrica em um escritório de projetos e passaram a solicitar feedbacks informais dos operários. Na sequência, os trabalhadores começaram a oferecer sugestões ou relatar problemas. O resultado? A planta obteve um aumento de rendimento de 4% – de 91% para 95% – com cada ponto percentual de melhoria representando cerca de US$ 850 mil em economia de custo material por ano.

Nos EUA, a fabricante de ônibus elétricos BYD negociou recentemente um Acordo de Benefícios Comunitários (CBA) junto a uma coalizão promovida pela organização sem fins lucrativos Jobs to Move America (Empregos para Impulsionar a América, em tradução livre). Os trabalhadores da empresa agora são sindicalizados e têm um acordo coletivo de trabalho com a SMART, que estabeleceu um processo de feedback contínuo e direto da fábrica – incluindo treinamento aprimorado de segurança do Departamento de Administração de Segurança e Saúde Ocupacional do Trabalho.

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“Desde que negociamos o CBA e começamos a trabalhar com o sindicato, nosso controle de qualidade melhorou significativamente. Os funcionários agora detectam erros em um ritmo muito mais rápido e a confiança no chão da fábrica nunca foi tão boa”, disse o vice-presidente da BYD, Bobby Hill.

Quando os fabricantes aceitam o feedback dos trabalhadore, a produtividade e os negócios melhoram. Os funcionários se sentem mais dispostos a assumir posições de supervisão e gerenciamento. As fábricas se tornam um lugar onde os colaboradores querem estar e contribuir por um longo período de tempo. Para os donos das empresas, é que tudo isso pode contribuir para os resultlados financeiros.