A decisão do conselho de administração da AES Tietê ocorre 50 dias após a apresentação da oferta pela Eneva e depois da rival elevar o tom da disputa nos bastidores das negociações, mudando sua postura de um negociador cordial para um potencial comprador irritado com a atitude protelatória por parte da administração.
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Em primeiro de março, a Eneva apresentou uma proposta de combinação de negócios, que na prática significaria a incorporação da AES Tietê, com pagamento da aquisição com troca de ações e pagamento em dinheiro, na proporção de 60% e 40%, respectivamente. A transação compreenderia uma relação de troca de 0,0461 ações ordinárias de emissão da Eneva para cada 0,2305 por UNIT da AES Tietê, mais uma parcela em dinheiro equivalente a R$ 6,89 por UNIT, somando total de R$ 2.750.641.308,80.
Na ocasião, o valor ofertado significava um prêmio de 13,3% sobre o preço de fechamento das ações de emissão da AES Tietê no último pregão antes da oferta e superior à máxima histórica nas 52 semanas anteriores. Após o anúncio da oferta, os papéis da AES Tietê valorizaram-se, sinalizando que o mercado via sentido na operação. Entre os principais pontos positivos da operação, segundo especialistas, estaria a criação de uma geradora de energia de maior peso no mercado nacional, com um portfólio de ativos diversificado e complementar, que minimizaria riscos.
Mas o Conselho de Administração da AES Tietê considerou que a combinação não faria sentido estratégico para os acionistas da companhia. “Eneva e AES Tietê são empresas muito diferentes, e uma união de seus ativos pode ser falsamente defendida como complementar. Entretanto, essa suposta complementaridade só beneficiaria os acionistas da Eneva, diluindo o risco inerente a suas atividades, em detrimento dos acionistas da AES Tietê”, diz a companhia em comunicado à imprensa. No texto, a empresa também afirma que está mais bem posicionada para o futuro, enquanto sua concorrente “representa o passado da geração elétrica”.
Alavancagem e sinergias
Ainda segundo a AES Tietê, a análise dos conselheiros e assessores contratados chegou à conclusão que a empresa resultante de uma combinação das duas empresas teria alavancagem “perigosamente elevada” e que as sinergias vislumbradas pela Eneva seriam “irreais”. A companhia contou com a assessoria dos bancos Bradesco BBI, BNP Paribas e Santander, das consultorias especializadas Thymos e Mercurio, e do escritório Cescon, Barrieu, Flesch e Barreto Advogados.
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Para a administração da AES Tietê, a operação proposta poderia impactar significativamente a capacidade de remuneração dos acionistas, tendo em vista a prática de distribuição de 100% do lucro líquido ajustado. “Ademais, o alto endividamento decorrente de uma potencial implementação da transação constituiria um obstáculo ao crescimento da entidade combinada”, afirmou.
A AES Tietê contou que, em reuniões realizadas com a diretoria da AES Tietê e estudos disponibilizados, a Eneva superestimou as sinergias por conta da fusão das duas empresas, que somariam R$ 3,1 bilhões, mas assessores contratados pelo conselho teriam indicado um valor 50% menor. “Quase metade dessas supostas sinergias viria do aumento na alavancagem da AES Tietê – o que, na prática, não configura sinergia alguma, já que a companhia poderia obter esse suposto ganho sozinha”, diz. Segundo a geradora, as únicas sinergias de fato sob o controle de uma empresa combinada estariam concentradas no corte de custos administrativos a partir de demissões, num valor presente líquido total de R$ 210 milhões.
“No entender da administração, ingressar neste momento em uma operação complexa e altamente alavancada seria não só inconveniente e inoportuno, como elevaria significativamente os riscos para seus acionistas. O momento requer que a administração se empenhe em fazer com que o fluxo de caixa e as reservas da Companhia sofram o menor impacto possível, de modo a assegurar a implementação do plano de negócios aprovado”, afirmou.
A AES Tietê informa que o conselho de administração convocará assembleia geral de acionistas para deliberar sobre a proposta “na sequência da fase de negociações junto à administração da Eneva”
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Vale salientar que mais da metade do conselho de administração da AES Tietê são nomes ligados à AES Corp., notadamente contrária à operação. Mas, embora a empresa norte-americana detenha o controle da companhia, com 62,61% das ações ordinárias, possui apenas 24% do capital total e a empresa. E tendo em vista que seu estatuto prevê que em casos de incorporação, os acionistas preferencialistas têm direito a voto, a operação poderia ser aprovada mesmo à revelia dos interesses do controlador.
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