Ex-presidente da Sony abre restaurante de comida crua no Rio

6 de maio de 2016

Alexandre Schiavo (Daryan Dornelles)

Havia um mês que Alexandre Schiavo não era mais o presidente da Sony Music Brasil, multinacional de entretenimento responsável pelo catálogo de artistas como Roberto Carlos, o maior vendedor de discos da história do país. A gravadora ofereceu o cargo de vice-presidente para a América Latina, mas o sonho de Schiavo era outro. Por ora, correr na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio, e escrever 120 páginas de um livro sobre o mercado, a exemplo de André Midani, ex-executivo da antiga CBS (cujo passivo pertence à Sony), Polygram e Warner Music.

“Já tinha comunicado que precisava de um novo desafio, a partir da Copa do Mundo”, diz o executivo, de volta ao ano de 2014. “Surgiu o convite para ser o VP da América Latina. Mas foi só desligar o telefone e me veio à cabeça que não queria mais.”

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Schiavo, na verdade, queria era mais, e também menos. Mais do que a indústria fonográfica, a quem se diz eternamente grato, poderia oferecer. E menos compromissos em sua conturbada agenda, para que pudesse intensificar o contato com a família e os amigos.

Ele queria algo novo. Do zero. Que não tivesse nem mesmo um imóvel. “Queria conhecer algo novo do começo ao fim.”

Tão cru quanto sugere nos cardápios o nome da comida ao qual seu restaurante, o Ró, que deve ser inaugurado neste início de maio, se dedica. “Raw food [comida crua]! Algo que nunca havia caído no meu radar.”

Schiavo manteve os sprints ao redor da lagoa, mas começou outra correria. Era preciso encontrar o lugar perfeito, a chef perfeita, o sócio perfeito. “Passava várias vezes em frente a um ponto no Jardim Botânico (zona sul do Rio de Janeiro). Era um casarão dos anos 1920. Casava com o estilo que eu queria: uma casa charmosa, de frente para o Jardim Botânico. Eu me perguntava: ‘O que vou fazer aqui? Um contemporâneo, um japonês?’ Eu queria qualidade de vida. Venho para o trabalho de bicicleta, de moto, não ando mais de carro. O que de fato combinava com aquilo?”

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Então convidou o jornalista Alexandre Lalas para conhecer o espaço. O sobrado branco, protegido por tapumes vermelhos da rua Pacheco Leão, a duas quadras da lagoa, o encantou. A vizinhança já havia transformado a região em um polo de comida natural/orgânica da zona sul carioca. O arquiteto André Piva foi convidado para reformá-lo. “E o Lalas falou que aquele local era a cara da Inês”, afirma. ”

Schiavo fala da chef Inês Braconnot. Ela pesquisa e cria, há 15 anos, comidas naturais e cruas. “Uma mulher fascinante, artista plástica, paisagista, e que domina a raw food. Começou a me mostrar a comida pelo Instagram. Me apaixonei pela estética e pela filosofia de um alimento que só se pode aquecer até 42ºC. Nós a mandamos para o curso do Matthew Kenney, nos Estados Unidos, enquanto a casa era preparada.” O norte-americano Kenney é uma celebridade do mundo da comida natural. Aos 51 anos, tem 12 livros publicados sobre o tema.

Crepe de cogumelos (Rodrigo Azevedo)

Aos poucos, Schiavo organizou os espaços. Lalas advogou pelos vinhos orgânicos. “Já temos um engarrafado com a marca do Ró”, diz. Inês, além do cardápio, cuida dos sucos e dos queijos naturais (“Ela é a fera”, afirma Schiavo). O ex-executivo da Sony, como era natural, é o one man band — para ficar no universo musical — do empreendimento.

O Ró estreou em abril com críticas positivas de quem cobre o mundo gastrônomico carioca. Flerta com a alta gastronomia mesmo um cardápio vegetariano. Aposta no jantar, justamente o horário do dia em que as opções por comida natural escasseiam.

“Quero quebrar a resistência à comida natural”, afirma Schiavo. “Que venham beber nosso vinho orgânico e comer os queijos. Quero entregar um ambiente que não seja hostil e que a pessoa possa experimentar.”

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Os queijos do Ró não levam nada de alimento animal. “São de macadâmia”, diz. São também a maior especialidade do restaurante, que, no período noturno, deve oferecer de três a quatro pratos em duas opções de menu. Os doces, afirma, não ficam nada a dever àqueles que não são considerados raw. “Tem uma panna cotta raw que é espetacular”, sugere.

Schiavo, obviamente, não quer parar por aí. É empresário da banda Scalene, de Brasília, finalista do programa Superstar, da Globo, em 2015 — sinal de que a veia musical ainda está longe de abandoná-lo. Mas não é o mercado fonográfico que o move, e sim o Ró. “O excesso de viagens [da época de executivo] me esgotou muito. Estou amando esta vida”, afirma.

Com a cabeça dos tempos de Sony, ele planeja os próximos passos do recém-inaugurado sobrado do Jardim Botânico. “No futuro, teremos nossa marca própria. O plano é plantar tudo o que vier a ser consumido no Ró. E o queijo é um universo a ser explorado.” Alexandre Schiavo quer mais. Muito mais.

Abobrinhas marinadas com ricota de macadâmia, pesto de pistache e molho de pimentão vermelho (Rodrigo Azevedo)