Como um colombiano lucrou US$ 1,4 bilhão com o Canal do Panamá

3 de setembro de 2016

Canal do Panamá (Getty Images)

Voando 200 metros acima do Canal do Panamá, o bilionário colombiano Jaime Gilinski visualiza lá embaixo o que foi, até 1999, um campo de aviação militar dos EUA. “Daqui até a água é tudo nosso”, diz ele pelo fone da aeronave, apontando para um pedaço de terra do tamanho de uma cidade pequena. Observamos dezenas de lojas, prédios de escritórios e armazéns com nomes como Dell, 3M e Caterpillar escritos na lateral. Correndo os olhos pela área de 1.800 hectares, Gilinski mostra um campus universitário, centenas de casas novas, uma quadra de basquete, escolas, parques, e até um aeroporto.

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Trata-se do projeto imobiliário mais audacioso do mundo, que começou como não mais do que uma ideia impetuosa do homem do helicóptero. Filho de um empreendedor serial que se aventurou em várias atividades antes de atingir o sucesso com a fabricação de ferramentas manuais, Jaime Gilinski, 58, recuperou o maior banco da Colômbia em 1994, fundiu-o com um rival em 1998, e então começou a vasculhar o mundo em busca do próximo grande negócio. Quando as tropas norte-americanas saíram de Howard, em 1999, ele começou a sonhar com maneiras de dar novo uso à base.

Havia apenas um problema: ele não tinha nenhuma experiência em imóveis. Então, Gilinski contatou Ian Livingstone, seu vizinho na Inglaterra. Em 2004, quando Ian estava em férias nas Bahamas, Gilinski convenceu-o a passar pelo Panamá e dar uma olhada. Eles alugaram um helicóptero e vistoriaram o terreno. Juntos, conceberam um plano grandioso: comprar a área com casamatas e quartéis abandonados e dar a ela o nome de Panamá Pacífico.

“Construímos vários grandes empreendimentos em muitas partes do mundo”, diz Livingstone. “Pessoalmente, nunca visitei nem vi nada que fosse maior ou tão cheio de oportunidades.”

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“Na época, parecia um sonho impossível”, comenta Augusto Arosemena, ministro do Comércio e da Indústria do Panamá. “O Panamá não sabia o que fazer com toda a área que era usada pelos norte-americanos, pelo exército e a força aérea. Nós precisávamos de alguém com a visão [de Gilinski], sua motivação e seus contatos para viabilizar um projeto como este.”
Doze anos após o passeio inicial de helicóptero, a nova cidade está ganhando vida, e isso significa muita grana para Gilinski. A área como um todo vale hoje, segundo estimativas, 3,6 bilhões de dólares, sendo que os terrenos estão sendo vendidos por 25 vezes o preço original. Gilinski ganhou pessoalmente 1,4 bilhão de dólares com o projeto. E, embora já tenha construído quase mil edifícios, 85% da Panamá Pacífico continua inexplorada. Isso significa que há muito a ganhar.

Os contatos políticos de Gilinski foram fundamentais no Panamá. Sua esposa vem de uma proeminente família panamenha, e Gilinski é dono de um pequeno banco no istmo desde 1994. Seus laços com o país só fizeram aumentar ao longo do tempo. Hoje, atua como adido político na embaixada em Londres. Sem essas raízes profundas no Panamá, ele nunca teria descoberto a antiga base da Força Aérea norte-americana.

Em 1977, o presidente Jimmy Carter assinou um acordo com o ditador Omar Torrijos, abolindo a Zona do Canal e prometendo entregá-lo até o fim do século.Em 1999, as últimas tropas dos EUA foram embora, quase 90 anos depois de terem chegado, durante a construção do canal. O governo panamenho assumiu o controle da base da Força Aérea, e começou a pesquisar maneiras de vender pequenas partes para diversos incorporadores. Em 2003, Gilinski e Livingstone contataram as autoridades com uma ideia: vender a área toda de uma vez a um único grupo, que desenvolveria um plano mestre para o local. Os espaços foram definidos meticulosamente para que os moradores não ouvissem o ruído constante de aviões ou caminhões. Os sócios firmaram contrato com o governo, pagaram um adiantamento de 20 milhões de dólares, e assumiram a área.

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Um ano depois da compra, com quase nenhuma construção nova no local, Gilinski contratou consultores do Boston Consulting Group para avaliar o projeto. A conclusão deles foi que valia de 1,2 bilhão a 1,6 bilhão de dólares, praticamente o dobro do que Gilinski e seus sócios tinham se comprometido a investir em 40 anos.
Mesmo assim, ele só conseguiu fechar um negócio em 2010. Em agosto daquele ano, 40 empresas estavam alugando pequenos espaços no projeto, e a área estava gerando um lucro modesto. Foi o suficiente para que gestores de fundos soberanos do Oriente Médio parassem para prestar atenção. A estatal de investimento imobiliário do Catar comprou uma participação de 50% na Panamá Pacífico por um bilhão de dólares, segundo estimativas. (Livingstone contesta esse preço.)

A venda transformou Gilinski em bilionário. E, embora ele tenha mantido apenas uma participação de 25% no projeto, continua sendo o presidente do conselho, e seu cunhado é o CEO. Simultaneamente à transação, Gilinski fez um negócio por baixo da mesa para comprar um terreno de 540 mil metros quadrados no projeto, um terço do qual ele vendeu à SABMiller cinco anos depois — a gigante das cervejas vai construir uma cervejaria de 400 milhões de dólares.
Investimentos do porte do da SABMiller atraem mais empresas, como engarrafadoras que querem se mudar para perto da fábrica, o que, por sua vez, atrai moradores adicionais, que querem morar perto do trabalho, e estes atraem varejistas que querem estar próximos de centros populacionais. Muitas empresas falam sobre criar economias de escala, mas pouquíssimas são capazes de igualar o tipo de sinergia que surge quando se constrói uma cidade inteira da estaca zero.
Tudo isso cai diretamente nas mãos de Gilinski. Dos 18 milhões de metros quadrados da Panamá Pacífico, 11 milhões são destinados à incorporação.

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Em parte, o que está impulsionando o sucesso do projeto é a alta do mercado imobiliário no restante da Cidade do Panamá. A capital tem mais arranha-céus do que qualquer outra cidade do hemisfério ocidental, exceto Nova York e Chicago. Dos 25 edifícios mais altos da América Latina, 16 estão na Cidade do Panamá. Os incorporadores estão tão desesperados por terrenos, que estão erguendo arranha-céus em antigos pantanais e criando ilhas artificiais no mar.
De posse de 500 milhões de dólares em caixa após o negócio com os catarianos, Gilinski comprou 7,5% do banco espanhol Sabadell, e arrematou ativos do HSBC na Colômbia, no Peru e no Paraguai. Agora, ele e Livingstone estão cogitando mais investimentos em imóveis, e vêm fazendo visitas secretas a terrenos extensos perto de grandes cidades da América Latina. Gilinski reconhece que será difícil repetir sua primeira façanha. “Nós nunca conseguiríamos esse local de novo”, diz ele. “Mas realmente vemos o futuro nesta parte do mundo.”