Ao longo do Rio Ohio, dentro de uma fábrica limpa e bem iluminada em Owensboro, Kentucky, dezenas de máquinas de aço inoxidável brilhantes, operadas por funcionários com toucas e óculos de segurança, produzem milhões de pequenos sachês brancos, em formato de travesseiro, recheados com pó de nicotina de grau farmacêutico e com sabores – Zyn. A cada 15 segundos, 24 horas por dia, cinco dias por semana, essas máquinas automáticas enchem uma lata plástica branca do tamanho de um disco de hóquei com 15 sachês.
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Em alguns dias, os potes da Zyn, altamente procurados, estarão em lojas de conveniência, postos de gasolina e bodegas por todos os Estados Unidos. E, em poucos dias, as prateleiras estarão vazias, e os varejistas implorarão por mais à Philip Morris International, que é dona da fabricante da Zyn, a Swedish Match.
Elizabeth Leary, que gerencia o River’s Edge Tobacco Outlet em Owensboro há uma década, diz que nunca vendeu um produto de nicotina com consumidores tão fervorosos. “Cinquenta por cento dos meus clientes vêm aqui para comprar Zyn”, explica Leary, dizendo que está sempre sem estoque, apesar de estar a poucos quilômetros da fábrica. “Nunca vi um produto tão popular.”
Até o fim de 2024, a PMI, com sede em Stamford, Connecticut, espera vender cerca de 580 milhões de latas de Zyn, um aumento de 50% em relação aos 385 milhões vendidos no ano passado. A Forbes estima que as vendas da Zyn, que a PMI não detalha nos registros públicos, geraram US$ 1,3 bilhão (R$ 7,1 bilhões) no ano passado, cerca de 3,7% dos US$ 35 bilhões (R$ 190 bilhões) de receita total da PMI e podem chegar a US$ 1,9 bilhão (R$ 10,4 bilhões) neste ano.
Lucro crescente
No geral, os produtos sem fumaça da PMI (Zyn, vaporizadores, o dispositivo de aquecimento sem combustão IQOS e tabaco para mascar) geraram US$ 12,5 bilhões (R$ 68 bilhões) em vendas no ano passado, um aumento de 26,3% em relação aos US$ 9,9 bilhões (R$ 53,9 bilhões) de 2022, e representam quase 40% da receita bruta da empresa no quarto trimestre.
A Zyn, em particular, é incrivelmente lucrativa. Uma lata — disponível em 10 sabores, incluindo canela, cítrus e hortelã — é vendida por cerca de US$ 6,50 (R$ 35,36). A Zyn é seis vezes mais lucrativa do que a divisão de cigarros da PMI, diz Bonnie Herzog, analista da Goldman Sachs que cobre a indústria do tabaco.
E, ao contrário dos cigarros, que têm visto um declínio constante em volume na última década, a Zyn está em uma fase de hiper crescimento. O volume de remessas nos EUA saltou impressionantes 238% desde 2020. “Zyn é nossa marca que mais cresce nos EUA”, diz Stacey Kennedy, a chefe das operações da PMI nos EUA.
É um novo negócio para a PMI, que comprou a Swedish Match e sua marca Zyn por US$ 16 bilhões (R$ 87 bilhões) em 2022, mas o sachê de nicotina cult é fundamental para seu futuro.
A PMI fabrica a marca de cigarro número um do mundo, a Marlboro, mas seu objetivo declarado é parar de vender cigarros. Isso pode parecer improvável, dado que as vendas globais de cigarros somaram US$ 22,3 bilhões (R$ 121,3 bilhões) para a empresa em 2023. Contudo, a PMI, que se separou da Altria em 2008, uma década após o Acordo Master de Tabaco, já percebeu os sinais legais e sociais. Desde então, investiu US$ 12 bilhões (R$ 65,3 bilhões) para criar sistemas de entrega de nicotina sem fumaça e menos nocivos.
“Acredito que a Zyn prova que a nicotina pode ser usada para substituir produtos mais nocivos”, diz Kennedy, que fumou Marlboro por 10 anos antes de mudar para o IQOS — e, ocasionalmente, para a Zyn.
Zynpocalypse
Após uma escassez de oferta afetar 60% dos varejistas do país — apelidada de “Zynpocalypse” pelos consumidores — a PMI investiu US$ 600 milhões (R$ 3,3 bilhões) em uma nova fábrica no Colorado este ano. Ela será inaugurada em 2026. No entanto, não será suficiente para saciar o apetite insaciável dos EUA por nicotina.
A alguns quilômetros rio abaixo em Owensboro, em uma manhã de agosto com 90 graus Fahrenheit, Kennedy sobe ao pódio e anuncia para uma multidão de locais e políticos, incluindo o governador de Kentucky, Andy Beshear, que a PMI está investindo US$ 232 milhões (R$ 1,26 bilhão) para acabar de vez com o “Zynpocalypse” ao expandir a fábrica de Owensboro em 40% e adicionar 450 novos empregos em tempo integral.
Em breve, a fábrica operará 24 horas por dia, sete dias por semana. Até o final de 2025, Kennedy estima que a Swedish Match possa fabricar 900 milhões de latas de Zyn. A Forbes estima que isso poderia elevar as vendas da Zyn para US$ 2,9 bilhões (R$ 15,78 bilhões). “Isso aliviará a pressão causada pela pequena restrição de oferta”, diz Kennedy.
No último ano fiscal, as vendas totais de nicotina no varejo nos EUA chegaram a US$ 76 bilhões (R$ 413 bilhões), uma queda de 3,2% em relação a 2022, com as vendas de cigarros e vaporizadores caindo 5,2% e 8,3%, respectivamente.
Produtos sem fumaça, incluindo os sachês, por outro lado, cresceram quase 12% no ano — sendo o único segmento a apresentar crescimento. Todas as empresas de tabaco possuem suas próprias marcas de sachês de nicotina, mas com a Zyn, a PMI controla quase 70% do mercado.
Embora os sachês tenham conseguido separar a nicotina do cigarro, eles ainda apresentam riscos à saúde. Por um lado, a nicotina é ferozmente viciante. Ela também é um vasoconstritor e aumenta a pressão arterial. O câncer parece ser uma preocupação menor. Um estudo financiado pela Swedish Match descobriu que os sachês contêm “abaixo do limite de quantificação” de nitrosaminas específicas do tabaco, causadoras de câncer.
O estudo também descobriu que a Zyn contém outras substâncias químicas prejudiciais, incluindo amônia, cromo, formaldeído e níquel.
A Zyn e outros sachês de nicotina ainda não foram autorizados para venda pela FDA. A Swedish Match apresentou uma solicitação em março de 2020. Isso significa que os produtos são tecnicamente ilegais, mas a FDA permite que permaneçam no mercado enquanto a agência revisa as solicitações.
Violação de normas
O procurador-geral de Washington, D.C., está investigando a PMI e a Swedish Match. A acusação é de violar a proibição da cidade de vender produtos de tabaco com sabor em seu site. A PMI encerrou as vendas online após ser intimada no início deste ano. Há pelo menos cinco outros processos alegando que a empresa está comercializando a Zyn para menores de idade. A Zyn vem em uma lata colorida e se parece com um pote de balas Icebreakers.
Scott Schlesinger, um advogado da Flórida que recentemente entrou com uma ação coletiva contra a PMI e a Swedish Match, diz que já viu isso antes. “Zyn é o Juul 2.0”, diz Schlesinger. Ele liderou um processo bem-sucedido contra a Altria e seu popular vaporizador Juul. A companhia foi considerada culpada por um aumento acentuado no uso de vaporizadores entre adolescentes. “É um reboot.”
Kennedy insiste que a PMI está comercializando a Zyn apenas para adultos que já fumam ou usam nicotina. “Acreditamos que a reclamação é infundada e vamos nos defender vigorosamente”, diz ela.
Por enquanto, os dados do CDC estão ao lado da PMI. Na Pesquisa Nacional de Tabaco para Jovens deste ano, apenas 1,8% dos alunos do ensino fundamental e médio admitiram usar sachês de nicotina. Enquanto isso, 5,9% usam vaporizadores. Mas desde que o Instagram e o TikTok se encheram de “Zynfluencers” celebrando seu amor pelos sachês, a FDA diz estar monitorando o “potencial aumento da popularidade desses produtos entre os jovens”. Eles foram apelidados de “lip pillows” ou “travesseiros labiais” nas redes.
Eleições
Muitas celebridades estão envolvidas nos memes virais e nas afirmações exageradas na “Zynternet”. O comentarista político Tucker Carlson — também conhecido como “Tucker Carlzyn” — afirmou brincando que a nicotina melhora o desempenho sexual. O quarterback do Buffalo Bills, Josh Allen, confessou que “usar alguns Zyns” é um “truque secreto” para seu regime de treino. E, no início deste ano, o bilionário Peter Thiel disse à Atlantic que acredita que a nicotina aumenta o QI em 10 pontos.
Os sachês até entraram na eleição presidencial. O senador de Ohio JD Vance, vice de Donald Trump, foi fotografado segurando um pote de Zyn, enquanto, do outro lado do corredor, Tim Walz impôs um imposto de 95% sobre a Zyn e outros produtos de nicotina como governador de Minnesota.
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A 3 mil quilômetros de Owensboro, Isaiah Taylor, o CEO de 25 anos e fundador da Valar Atomics, tem uma foto de engenheiros da NASA durante a missão Apollo 13 acima de sua mesa. Todos estão fumando. Ele diz que a Zyn impulsiona seus negócios, com uma lata em cada mesa. “Todos os nossos grandes empreendimentos foram alcançados sob a névoa da nicotina”, diz ele. “A Zyn é sobre a excelência americana — e talvez o excesso faça parte disso também.”