Não é de hoje que temos falado por aqui sobre a dificuldade cada vez maior para preencher posições estratégicas, incluindo cargos executivos e colaboradores de nível especialista, com ênfase nas áreas de conhecimento mais analíticas.
O tempo de preenchimento de vagas tem sido um pesadelo para as áreas de RH, a rotatividade gera inúmeros problemas de continuidade nos processos e projetos internos, além dos valores para a contratação de pessoas que já possuam os conhecimentos e a experiência necessários acarretar grandes desequilíbrios salariais no time.
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Não sei a razão, mas ainda sinto alguma resistência dos líderes em aceitarem que vivemos um novo momento no mundo corporativo. Os gig workers vieram para ficar! E eles não se restringem a funções operacionais mediadas por uma plataforma digital que conecta usuários e prestadores de serviços.
Gig economy e o C-Level sob demanda
Essa nova forma de trabalho já é uma realidade para muitos profissionais seniores e especializados que não querem mais se manter vinculados a organizações, se submetendo às suas convencionais (e necessárias) regras, ciclos e restrições orçamentárias. São profissionais que estão abrindo suas próprias empresas e consultorias boutiques, oferecendo serviços sob demanda e abrindo uma (não tão) nova possibilidade de as empresas contratarem serviços relacionados à estruturação de ferramentas e processos de inteligência específicos, restando depois a tarefa de dar manutenção e fazer melhorias nestes processos de maneira mais rotineira, com um time interno de mais simples reposição.
Essa possibilidade de contratação de trabalhos especializados por job possibilita a aquisição rápida de conhecimentos e competências que não existem internamente na empresa, que são de longa formação e difícil contratação e manutenção no time fixo. É possível também pensar na economia de um trabalho contratado pontualmente (ainda que com taxa horária maior), considerando os encargos trabalhistas, benefícios e prazo do investimento. Isso sem contar a dificuldade de se encontrar profissionais que possam agregar esse nível de entrega técnica, com o mesmo alinhamento cultural que a empresa espera para o seu quadro permanente de funcionários, e que estejam dispostos a seguir o modelo de full time job.
Não estou me referindo aqui à PJtização pura e simples que estamos assistindo depois da flexibilização de algumas regras da CLT. Estou falando sobre contratação de trabalhos spot, sob demanda, as a service. Neste caso, não há subordinação, não há controle de horas, investimento em treinamento e desenvolvimento e não há expectativa de relação de longo prazo, com escaladas progressivas de remuneração. E podemos inserir neste modelo, inclusive, executivos interinos preenchendo posições críticas na dança de cadeiras da liderança ou, por exemplo, um engenheiro de software que tenha a missão de acelerar a transformação digital da organização. Existe valor na velocidade das contribuições que esses profissionais podem agregar, e também no maior nível de qualificação que este perfil de profissionais normalmente possui.
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Considerando que estes profissionais altamente especializados têm a possibilidade de negociar melhor seus valores de remuneração, é de se esperar que se torne cada vez mais difícil contratá-los de forma permanente. Então as empresas precisarão se organizar para este novo momento de mercado em que o que será mantido internamente será a operacionalização do que tiver sido desenhado por especialistas externos. E parece libertador que a expectativa de saída de um profissional não vá causar a ruína da empresa toda, não é? Porque é essa a mensagem que o time de remuneração recebe sempre que alguém pede demissão hoje em dia!
Outra análise a se considerar nesta opção entre profissionais permanentes e prestadores de serviço é mais intangível. Enquanto o sentimento dos profissionais internos me parece ser cada vez mais de insatisfação com a falta de espaço para progredir, com a falta de oportunidade para assumir posições de maior relevância, com a remuneração e com os processos normais que uma empresa precisa seguir para ser sustentável e perene, os prestadores de serviços demonstram mais orgulho com as atividades que executam e satisfação na execução. É natural que estes freelancers imprimam o máximo de seus talentos em cada entrega, uma vez que a qualidade do seu trabalho e a sua reputação estão diretamente relacionados com novas oportunidades de ganhos que possam vir a ocorrer no futuro.
Não estou fazendo aqui uma apologia à terceirização generalizada e muito menos uma caça às bruxas contra os times internos! Ao contrário, entendo que o time fixo necessite de um critério muito maior de seleção para garantir alinhamento cultural, e deveria estabelecer relações mais estreitas e duradouras com a empresa. São eles que irão garantir o planejamento e a execução dos planos de negócio. Para estes, é preciso estabelecer ações de desenvolvimento e de reconhecimento, mas isso é muito diferente de se ter uma relação de co-dependência.
A chave de sucesso está na escolha adequada entre o que pode ser contratado pontualmente, como uma injeção one-shot de conhecimento para acelerar demandas estratégicas, e o que pode ser gerido internamente, dentro de um fluxo administrável no tempo do negócio e com os profissionais que estejam dispostos a evoluir junto com a empresa.
Fernanda Abilel é professora na FGV e sócia-fundadora da How2Pay, consultoria focada no desenho de estratégias de remuneração.
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