Quando pensamos em animais que contribuem para criações largamente admiradas na gastronomia, lembramo-nos de aves que encantaram nobres e reis – e hoje ganham novas versões nas concepções de grandes chefs. Nosso saboroso voo começa com a pompa e circunstância do faisão, a ave dos monarcas. Originário da China e da Rússia, conquistou seu status nas mesas dos faraós. Levado à Europa pelos gregos, também tornou-se item obrigatório no cardápio dos monarcas.
No fim da Idade Média, em 1454, em Lille, na França, foi realizado um dos mais poderosos encontros do período, aquele que ficou conhecido como “Banquete do Juramento dos Faisões”, promovido por Filipe de Borgonha e sua mulher, Isabel de Portugal. A intenção era pactuar entre os convidados uma cruzada contra os turcos que tomaram Constantinopla. O anfitrião prestou seu juramento sobre um faisão vivo e ornamentado com joias e ouro. Convidados repetiram o gesto – mesmo que a cruzada, mais tarde, não acontecesse.
A ave era um dos itens obrigatórios na dieta diária de Luís 14, o Rei Sol, idealizador do Palácio de Versalhes. E chegou à América tendo como primeiro endereço a casa do primeiro presidente americano, George Washington, que adorava novidades. Ele a serviu em seus concorridos encontros – mas a iguaria não agradou.
Tanto na natureza quanto na culinária, o macho é quem corre os maiores riscos. Ele usa a riqueza de sua plumagem colorida para distrair predadores enquanto a fêmea e a cria fogem. E a carne do macho tem volume e qualidade superiores às de sua parceira – é ótima servida ao forno com bietole e tendo como acompanhamento gnocchi artesanal e queijo Taleggio.
Menor no tamanho, a perdiz, ave-irmã do faisão, tem carne um pouco mais escura e de sabor mais suave – desta vez, é a carne da fêmea que apresenta maior suculência e maciez. Sem mencionar que é muito nutritiva, rica em proteínas e com baixo teor calórico e de gordura, em especial quando servida sem a pele. É um ótimo substituto para o peru na ceia de Natal, dando um charme extra à mesa. A nobre russa Catarina II, uma das mulheres mais representativas da filosofia europeia do Século das Luzes, não tinha caprichos culinários, mas apreciava e servia aos convidados perdizes acompanhadas por trufas.
Curiosidade: os paulistanos batizaram o agradável bairro de Perdizes graças a um sitiante e criador da aves da região, por volta de 1850.
Outro pássaro delicado e apreciado há séculos nas melhores mesas é a codorna. Carrega as mesmas qualidades das perdizes, mas com menor tamanho – não chegam a pesar 1 quilo e são, por isso, chamadas de miniperus. Mas são bem mais saborosas, exigindo preparos mais delicados. Sua carne pouco gordurosa pede uma marinada caprichada. E seus pequenos ovos são apreciados em criações frias, nas saladas e appetizers. Mais nutritivo que o da galinha, o ovo de codorna ajuda muito na remoção de metais pesados do corpo e de toxinas no sangue; na gravidez, combate a anemia; e graças a seus nutrientes pode melhorar a libido, ocupando o pódio dos principais alimentos afrodisíacos.
Mas toda a delicadeza das aves premium pode ser quebrada – mas não menos apreciada – quando se fala na galinha-d’angola. Ela é escandalosa, turbulenta e petulante. Em contrapartida, tem uma carne deliciosa. O sabor marcante decorre da dieta quase triplicada em relação à do frango. Isso a coloca no hall das aves respeitadas na gastronomia. Na mitologia africana, seu valor também é grande. Diz a lenda que uma galinha que se achava feia vagava triste por uma floresta quando ajudou um velho abandonado. Ele era um poderoso orixá que, em agradecimento, enfeitou-a com as manchas brancas e a elevou à categoria de animal mais sagrado entre os deuses. Independentemente de crenças e religiões, uma coisa é certa: seu sabor é divino.
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