Os feirantes do apocalipse

4 de junho de 2019
Sandra Durovic/GettyImages

Brasil, para de ouvir os feirantes do apocalipse e presta atenção ao trabalho

Um fato curioso (ou seria trágico?) passou despercebido ao Brasil, que anda cada vez mais distraído com a novela diária das redes sociais. A assinatura da MP da Liberdade Econômica, instrumento muito aguardado no combate à selva burocrática brasileira, não fez o menor sucesso nas manchetes. O Brasil estava muito ocupado com uma dessas crises de Twitter.

Apresentada didaticamente pelo secretário especial de Desburocratização, Paulo Uebel, a medida contém estímulos importantes às startups – entre outras ações baseadas na remoção de entraves ao ambiente de negócios. Ou seja: um passo concreto contra o famoso dogma de “como é difícil abrir uma empresa no Brasil”, repetido em dez entre dez discursos sobre crescimento econômico e custo Brasil.

A palavra “Brasil” não foi repetida quatro vezes na introdução acima por acaso. Foi para ver se ele escuta. Alô, Brasil! Você ouviu falar da MP da Liberdade Econômica?!

Nada. Silêncio. Ou melhor: ruído, muito ruído. O país prestou muita atenção à polêmica crucial do azul e do rosa para meninos e meninas, ou vice-versa, discutiu a fundo o dilema filosófico de se cantar ou não cantar o hino nacional nas escolas, mergulhou na interpretação de texto com viés psicanalítico para debater se o vice-presidente estava conspirando ou não, desenvolveu com afinco a tese ficcional de que uma menina tinha se recusado a cumprimentar o presidente na Páscoa, sentenciou o caos político que mataria a Reforma da Previdência na CCJ – enfim, o Brasil cuidou com abnegação de cada uma dessas miragens enquanto elas não se desfizeram no ar.

Pensando bem, não sobra tempo mesmo para falar das medidas de liberdade econômica – tocadas por Paulo Guedes, Mansueto Almeida, Campos Neto, Salim Mattar, Tarcísio Freitas, Rogério Marinho, entre outros integrantes de uma das melhores equipes de governo que o país já viu (se é que viu). É muito mais importante ficar nas redes sociais tocando as trombetas do apocalipse contra a ameaça fascista.

Por que Bolsonaro, um capitão do Exército com sucessivos mandatos de deputado que nunca esteve associado à pauta da liberdade econômica, montou uma equipe dessas? Não interessa, perguntem a ele. O fato é que a equipe foi anunciada e não era uma miragem – tanto que foi empossada e está dando duro em Brasília, enquanto as cassandras preveem o fim do mundo no Twitter a cada segunda-feira.

Não chega a ser novidade. Na época do Plano Real, a cada trombada de ACM com os tucanos, regada ao vinagre de mau-olhado petista, o mundo também acabava uma vez por semana. Enquanto isso, foi feita a estabilização monetária, o controle da inflação e privatizações fundamentais como a da telefonia – que também era golpe e foi aprovada debaixo de pedrada e sangue (tudo literal aí, licença poética só para o fim do mundo – por enquanto).

No Plano Real, a cada trombada de ACM com os tucanos, o mundo também acabava toda semana

O Brasil ama o fracasso, venera a fofoca, cultiva a crise (sempre na expectativa de ganhar um qualquer com ela), enfim, é uma grande muvuca. Quando, no início do governo Lula, foi montada uma excelente equipe econômica sob o comando de Palocci (hoje parece brincadeira, mas foi real), a síndrome da sabotagem também ocorreu – e no caso triunfou, ajudando a quebrar o princípio virtuoso que separava patrimônio público de gula fisiológica.

E aí estão novamente as cassandras, os corneteiros do fracasso, os colunistas sociais do fascismo imaginário, os democratas de butique e a resistência cenográfica, todos vendendo seu peixe por um mundo melhor. Eles merecem ter de volta um Arno Augustin no Tesouro, pedalando livremente com um Nelson Barbosa na Fazenda, porque estão com saudade de entregar seu dinheiro aos gênios da militância parasitária. Vai, Brasil, vender peixe fresco no deserto! Ou então para de ouvir os feirantes do apocalipse e presta atenção ao trabalho.

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