Por outro lado, uma notícia vinda de Hong Kong no final de fevereiro dizia que um lulu da Pomerânia supostamente teria contraído o coronavírus de sua tutora, a chinesa Yvonne Chow Hau Yee, que vive no território autônomo do sudeste da China. Por meio de amostras oral, nasal e retal, o animal testou positivo e foi colocado em quarentena, apesar de não apresentar sintomas relevantes. No isolamento, fez novo exame – desta vez negativo – e, dois dias após sua liberação, o animal de 17 anos faleceu. A causa da morte é desconhecida e a dona do cão não quer fazer uma autópsia. Os veterinários de Hong Kong, no entanto, acreditam que a morte tenha sido causada pelo estresse e pela ansiedade da quarentena.
Mas, afinal, qual a verdade sobre a transmissão dos vírus em pets? De acordo com o virologista Prof. Dr. Paulo Eduardo Brandão, do departamento de medicina veterinária preventiva da saúde animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, existe uma enorme variedade de coronavírus de animais que não tem nada a ver com o novo coronavírus que está afetando os seres humanos nessa pandemia.
“Existem vários hospedeiros e várias espécies de coronavírus. Há o coronavírus de bois, cães, gatos, galinhas, morcegos, cavalos, porcos e camundongos… Até na baleia beluga já foi relatado um tipo desse vírus”, diz o especialista, que gravou um vídeo sobre o tema para a VetSmart, plataforma que auxilia profissionais na tomada de decisão clínica sobre produtos veterinários. “A diferença entre eles, no entanto, é muito grande, e a maior parte não tem um caráter zoonótico [quando é transmitido ao ser humano por animais].”
O Dr. Brandão esclarece que, ao que tudo indica, o novo coronavírus – assim como a SARS (síndrome respiratória aguda grave), de 2002, e a Mers (síndrome respiratória do Oriente Médio), de 2012 – é originária do morcego e, apenas nesses casos, a transmissão do animal para o ser humano pode acontecer.
No caso do cachorro de Hong Kong, a Dra. Shelley Rankin, microbiologista da Escola de Medicina Veterinária da Universidade da Pensilvânia, Filadélfia, afirmou ao jornal “Science”: “No momento, não há pesquisas para apoiar a disseminação entre humanos e animais. Amostras do cão de Hong Kong tinham um pequeno número de partículas virais presentes. Em um animal sem sinais clínicos de doença, é difícil dizer o que isso significa. Foi um caso único e aprendemos que precisamos fazer muito mais pesquisas sobre o potencial do vírus humano SARS-CoV-19 para infectar animais”.
OS CORONAVÍRUS EM ANIMAIS
O Prof. Dr. Paulo Eduardo Brandão explica que os coronavírus em animais domésticos são subestimados. No caso dos cães, por exemplo, existem dois tipos. O primeiro deles é entérico canino (CCoV), responsável por causar enterite, uma inflação na mucosa do intestino delgado, que acomete principalmente animais jovens e não tem grande letalidade, mas que pode conter uma subespécie em seu interior que é altamente virulenta e infecta rins, pulmões, coração e outros órgãos, levando a uma infecção generalizada. Há, ainda, o coronavírus respiratório canino (CRCoV). Os dois casos podem ser prevenidos com a vacinação anual de V8 e V10.
No caso dos gatos, o coronavírus felino (FCoV) causa a PIF (Peritonite Infecciosa Felina), uma doença grave e altamente letal para a qual não há prevenção. Vale lembrar, no entanto, que nem todos os gatos portadores do coronavírus podem desenvolver PIF.
RECOMENDAÇÃO AOS INFECTADOS
A opinião dos veterinários Paulo Eduardo Brandão e Regis Patitucci são corroboradas pela Organização Mundial de Saúde (OMS). A entidade diz que, até o momento, não há evidência significativa de que animais de estimação possam ficar doentes ou transmitir o novo coronavírus. Mesmo assim, a recomendação da OMS é que as pessoas infectadas evitem o contato com os seus pets.
A WSAVA – Global Veterinary Community vai na mesma linha. A comunidade, que contempla 200 mil veterinários em todo o mundo, indica que as pessoas positivas para Covid-19 não tenham um contato muito próximo com seus pets. Isso porque alguns vírus podem sofrer mutações e se adaptar a diferentes espécies com o passar do tempo.
ATENDIMENTO VETERINÁRIO
Por enquanto, os médicos veterinários, como profissionais de saúde, estão autorizados pelos governos estaduais a manter o atendimento normal em clínicas e hospitais. Isso pode variar de uma região para outra do país e os profissionais devem sempre observar e respeitar as restrições determinadas pelas autoridades locais.
Para manter o atendimento e, ao mesmo tempo, contribuir para conter a proliferação do coronavírus, o Conselho Federal de Medicina Veterinária estimula que o atendimento seja feito com a presença de apenas um único tutor, evitando a aglomeração de pessoas nas clínicas e pet shops. Além disso, recomenda que os tutores evitem visitar os animais internados e sugere que serviços que não são de urgência e emergência sejam reprogramados, afastando uma exposição desnecessária nesse momento crítico de propagação do novo coronavírus.
O Conselho Federal ainda orienta que os profissionais sejam mais severos com a higienização dos ambientes, limpando o recinto a cada atendimento, principalmente o mobiliário e os utensílios que tiveram contato direto com o animal ou com o tutor.
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