Nova cédula de R$ 200, a contramão diante da incipiente digitalização

11 de agosto de 2020
Arterra/Getty Images

Lobo-guará vai estampar a nova cédula de R$ 200

O governo federal anunciou recentemente a nova cédula de R$ 200. Ilustrada com o lobo-guará, a nota deverá entrar em circulação até o fim de agosto no país. Essa novidade não acontece há 18 anos, quando tivemos o lançamento da nota de R$ 20. Porém este anúncio despertou mais dúvidas do que certezas nas pessoas: será a volta da inflação? Por que criar essa nota se estamos vivendo um momento em que o dinheiro físico está sendo substituído por formas digitais de pagamentos?

Segundo o governo, a criação desta nota tem a ver com a demanda maior por dinheiro físico durante a pandemia. O grande motivo, segundo eles, é que as pessoas estão guardando mais dinheiro em tempos de incertezas, além do saque do auxílio emergencial por milhões de brasileiros. Porém, de acordo com o relatório da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), as pessoas físicas fizeram 74% das transações bancárias pelos canais digitais em abril (início do isolamento social).

Com esse anúncio, podemos afirmar também que o Banco Central vai na contramão do que ele mesmo pretende com a agenda de digitalização financeira no Brasil. Previsto para estar disponível em novembro, o PIX, sistema de pagamentos instantâneos brasileiro, carrega um grande potencial para reduzir a demanda por dinheiro físico, já que sua premissa é tornar as transações financeiras algo bem simples e sem a necessidade do papel moeda.

De acordo com um estudo realizado pela consultoria Boanegers, o PIX deve acelerar a redução do uso das cédulas pela metade do que ela representa atualmente em um espaço de dez anos, de 29% das transações atuais para 14% em 2030. Outra pesquisa realizada pelo Plano CDE, entre 30 e 31 de julho, aponta que 60% dos entrevistados preferem notas menores que R$ 200 para saques, enquanto 76% acreditam que a nova cédula pode dificultar o troco.

Nesse sentido, só podemos prever que a criação de uma nova cédula com valor maior só será comemorada por quem precisa guardar dinheiro ilegal em casa. Em alguns países, por exemplo, o uso da moeda física é cada vez menor. Isso acontece para dificultar a evasão fiscal e o narcotráfico, já que esse tipo de mercado foge de pagamentos capazes de rastreamento. O Banco Central Europeu, por exemplo, interrompeu e tirou de circulação a nota de € 500, já o Banco Central da Índia recolheu as de 100 rupias. Por outro lado, no Brasil, a emissão da nota de R$ 200 gerará um volume menor de dinheiro em espécie para grandes quantias, o que facilitará a logística do transporte e do armazenamento das notas para ocultação de recursos.

Além disso, o governo brasileiro também aposta na criação de um novo tributo para pagamentos digitais. Embora não tenha enviado a proposta para o Legislativo, não é de hoje que o Ministério da Economia estuda formas de taxar a economia digital. A depender dos valores de alíquotas e do pacote completo da reforma tributária, podemos de fato ter ainda mais estímulos para estocar notas. Vale lembrar sempre que a economia digital ainda é muito recente no país. Se, de largada, teremos novos tributos, como ficará o avanço das novas tecnologias nacionais?

Antes de criar qualquer tipo de novas cédulas ou imposto, o governo federal deveria ter um planejamento claro e objetivo que identifique possíveis efeitos colaterais dessas medidas. Além disso, é fundamental investir na digitalização de processos e transações financeiras. Com a pandemia do novo coronavírus, vimos muitas empresas anteciparem a sua transformação digital e no setor financeiro não pode ser diferente. Nesse período, notamos também uma grande redução nos pagamentos em dinheiro físico, o que não justifica, por exemplo, a criação de uma nova cédula. O futuro é o pagamento instantâneo e digital. Olhar para frente é encontrar soluções que mirem um objetivo claro de desenvolvimento e que facilitem o dia a dia a vidas das pessoas.

*Vitor Magnani é presidente da Associação Brasileira Online to Offline (ABO2O) e do Conselho de Comércio Eletrônico da Fecomercio/SP. Professor da FIA e especialista em Relações Institucionais e Governamentais para ecossistemas inovadores.

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