Apple quer ser o novo Google

9 de novembro de 2020
SOPA Images/Getty Images

Apple tem mais poder de fogo que o Google para investir no desenvolvimento dos sistemas de mecanismos de busca

Não é de hoje que se sabe que a Apple testa mecanismos de busca similares aos do Google. Anos atrás, ela confirmou que havia desenvolvido um rastreador próprio intitulado Applebot, com funções praticamente idênticas às desempenhadas pela gigante da web. No entanto, um novo relatório do jornal “Financial Times” mostra que a empresa de Steve Jobs intensificou este objetivo e está mais próximo dele do que nunca, já que, cada vez mais, o Google ameaça seu modelo de negócios.

De acordo com o relatório, a Apple aumentou sua oferta de busca no iOS 14, versão mais atualizada do sistema operacional de seus celulares e tablets. Agora, quando os usuários digitam perguntas na tela inicial dos aparelhos, são mostrados resultados de pesquisa próprios e os links diretos para sites.

Isso acontece em um momento propício, de enfraquecimento da empresa liderada por Sundar Pichai, já que autoridades antitruste questionam a legalidade do monopólio do Google em múltiplos mercados. A ação contra o Google foi movida em 20 de outubro pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos e mais 11 estados aderiram a ela, que vem sendo classificada como o maior processo antitruste contra uma empresa de tecnologia desde as ações encampadas contra a Microsoft, em 1998. Até mesmo ações visando a divisão do Google vêm sendo estudadas pelas autoridades, que também miram em outras duas gigantes, Amazon e Facebook. Especialistas em tecnologia dos Estados Unidos acreditam que as outras duas empresas também poderão ser processadas nos próximos meses.

Contudo, pelo menos por enquanto, o movimento da fabricante do Iphone vem sendo feito de modo silencioso. O mecanismo de busca padrão de seus dispositivos continua sendo o Google, o que rende à Apple anualmente até US$ 12 bilhões, segundo o jornal “The New York Times”. Somente em 2018, o montante pago à Apple pelo Google foi de US$ 10 bi, o equivalente a 20% da receita total de serviços da empresa no ano.

Outro elemento que favorece esta tese do caminho que a Apple planeja traçar foi a contratação do chefe de pesquisa do Google, John Giannandrea, há cerca de dois anos, e o recrutamento de outros engenheiros também especializados em mecanismos de busca. As equipes estão dedicadas no aprimoramento da inteligência artificial da assistente virtual Siri. Informações para o “Financial Times” foram fornecidas por um outro engenheiro-chefe especialista no mercado chamado Bill Coughran, fundador da Sequoia Capital.

E o próprio Google já está preparado para este movimento. De acordo com Sridhar Ramaswamy, cofundador da Neeva e ex-chefe de publicidade do Google, a posição da Apple é a mais favorecida porque detém o mapa completo de evolução do hardware, do sistema operacional e do navegador padrão de seus equipamentos, diferente de outras empresas de tecnologia, que desenvolvem apenas algum dos sistemas. Para Ramaswamy, esta evolução da Apple parece natural, já que ela tem a capacidade de colher informações, analisá-las e incorporar melhorias no software a partir do aprendizado com os dados.

Mas a empresa do CEO Tim Cook não planeja apenas se espelhar no maior buscador da internet, e sim aprimorar seu sistema. A Apple quer se distanciar de seus rivais aplicando uma ideologia que não abre mão da privacidade, a considerando um direito humano fundamental. O comentário no mercado é que o mecanismo de busca em construção não armazenará informações pessoais nem mesmo irá rastrear seus usuários, algo que seria extremamente inovador.

E, atualmente, isso pega muito bem com o consumidor. Já não existe mais usuário de internet que desconheça seus direitos ou que não entenda que, para as gigantes da tecnologia, as pessoas não são vistas como clientes e sim como produtos. E a ideia da Apple é justamente tentar se dissociar dessa crença em relação às companhias de tech, mostrando uma empresa mais responsável e humana.

De acordo com o que vem publicizando a empresa, seu modelo de negócios não depende de criar um perfil com base em conteúdos personalizados de e-mail ou hábitos de navegação na web para vender aos anunciantes. Está na missão da Apple evitar monetizar os dados que os usuários armazenam nos dispositivos ou na nuvem, nem mesmo ter acesso a mensagens de e-mail e SMS para sugerir informações com mais chances de gerarem interesse.

Outra questão relevante do ponto de vista mercadológico, conforme pontua matéria da Forbes USA, é se, entrando nessa briga, a Apple disponibilizaria seu mecanismo de busca para todos os usuários ou se o restringiria a proprietários de equipamentos ou navegadores da Apple, tornando-se mais um motivo para comprar iPhones, iPads e Macs. Embora o navegador Safari seja usado por cerca de 25% de todas as sessões mobile, de acordo com o NetMarketShare, sua participação em computadores (PC e notebooks) ainda é pequena, ficando limitada a menos de 4% do mercado, quase todas na plataforma Mac.

E de tudo isso, o fato é que a Apple tem mais poder de fogo que o Google para investir no desenvolvimento dos sistemas de mecanismos de busca. A empresa fundada por Jobs segue mais rentável que a criada por Larry Page e Sergey Brin. No primeiro trimestre de 2020, o faturamento da Apple foi de US$ 58,3 bilhões contra US$ 41,1 bilhões da Alphabet, controladora do Google. No entanto, pode ter certeza que a Apple não ganhará todo este espaço de mercado de forma incólume: poderá esperar em breve um contra-ataque do Google. Certamente os próximos anos serão muito animados para o mercado de tecnologia, reservando um grande duelo entre as gigantes do Vale do Silício.

 

Camila Farani é um dos “tubarões” do “Shark Tank Brasil”. É Top Voice no LinekdIn Brasil e a única mulher bicampeã premiada como Melhor Investidora-Anjo no Startup Awards 2016 e 2018. Sócia-fundadora da G2 Capital, uma butique de investimentos em empresas de tecnologia, as startups.

 

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