De família de alemães protestantes de Porto Alegre, Karin testemunhou o “progresso” aniquilar os pomares e parreirais do bairro onde nasceu, de uma hora para outra transformado em área semicomercial sem identidade, sem memória. É uma das razões que a levou em 2017 a se instalar em Broadstairs, bucólica cidadezinha inglesa encravada em uma ilha com penhascos brancos que despencam no caudaloso mar do Norte. Neste canto esquecido da costa sudeste da Grã Bretanha onde escolheu viver, o imenso céu do final da tarde é uma abóboda com rasgos vermelhos, uma das cores centrais de sua paleta.
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A nova série está de 18 de fevereiro a 18 de março em nossa galeria de São Paulo, ao lado de um conjunto de aquarelas monocromáticas em tons de areia. As telas, lavadas por campos geométricos tintos por tons luminosos, algumas com pequeno detalhe em cobre, confrontam o vazio de cor das aquarelas com suturas bordadas em tecido diáfano. Alguns trabalhos exibem a palavra escrita, rascunhada, quase imperceptível, indicando uma paisagem exterior ou expressando uma sensação interna, que revelam estados da alma.
Em Porto Alegre, Karin frequentou o atelier de Iberê Camargo antes de se mudar para Berlim, experiência que definiu sua busca como jovem. Vivia no bairro boêmio de Charlottenburg, estudava na famosa HDK (Universidade de Artes de Berlim), onde presenciou palestra de Joseph Beuys. Em 1982, em plena Guerra Fria, ao fazer uma performance no rio Spree a jovem artista quase foi presa pela polícia de Berlim Oriental não tivesse ela dado no pé ao sacar o perigo iminente. Sabia que a polícia russa, armada até os dentes, não tinha dó, pois volta e meia era obrigada a passar pelo histórico Checkpoint Charlie para visitar os avós paternos no lado temeroso do Muro que dividiu a Europa de 1961 a 1989.
De volta ao Brasil, foi Paulo Herkenhoff quem indicou sua obra aos curadores da antológica exposição no Rio, em 1984, “Como Vai Você, Geração 80?”. Dois anos depois, fez uma residência artística na Millay Colony, no estado de Nova York, e teve seu trabalho selecionado por não menos que Louise Bourgeois.
Expôs nas Bienais de São Paulo de 1985 no segmento ‘Expressionismo Heranças e Afinidades’, depois em 1987, e mais tarde em 2002. Sua primeira exposição individual institucional em São Paulo aconteceu no Instituto Tomie Ohtake, em 2018, com curadoria de Paulo Miyada.
A extinta editora Cosac Naify publicou um livro sobre sua obra e, desde 2005, a artista expõe em nossa galeria. Karin é uma aventureira do mundo real, mas Karin, a pintora, sabe que pintar tange o mundo invisível do pensamento, dos sentimentos, do misticismo. Como ela mesma diz, a busca pela verdade liberta.
Com colaboração de Cynthia Garcia, historiadora de arte cynthigarciabr@gmail.com
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