Somente em 2020, a equipe de Kuroda adicionou US$ 65 bilhões em ETFs, tornando o BOJ uma “baleia” dos investimentos no Japão. Muito acima dos US$ 38 bilhões de 2013.
Mesmo assim, em maio – e aí vem a grande provocação – o BOJ passou um mês inteiro sem aumentar suas participações em ETFs, a primeira pausa de 30 dias em oito anos. Isso fez com que muitos investidores acreditassem que Kuroda de repente estava falando sério sobre diminuir o apoio do BOJ para as ações.
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A queda de 6% do iene em relação ao dólar norte-americano explica bem o contexto. À medida que a América do Norte e a Europa se estabilizam e retomam o crescimento econômico, as forças por trás da desaceleração do Japão permanecem teimosamente negativas. Os números das vendas no varejo, da produção industrial, dos salários e da confiança empresarial têm convencido muitos economistas que o Japão pode não retornar aos níveis anteriores à Covid até 2023.
A China está fazendo isso agora, enquanto outros países esperam uma recuperação em 2022. O fato do Japão ainda precisar de dois anos para retomar sua atividade está influenciando as expectativas de inflação. Enquanto os EUA e outras economias importantes se preparam para o aumento dos preços ao consumidor, o Japão está voltando para o vermelho.
Conclui-se, então, que as participações do BOJ nos ETFs vieram para ficar – e, ao mesmo tempo, trazer lições para outros países.
Quando Kuroda chegou à sede do BOJ, o banco central já vinha brincando com flexibilização quantitativa há 12 anos. Se estamos falando sobre quando o BOJ se tornou a primeira grande autoridade monetária a reduzir as taxas de juros a zero, já se foram 14 anos. Kuroda ampliou o esforço: primeiro, ele monopolizou o mercado de títulos públicos. Depois, o mercado de ações.
No entanto, todo esse apoio de uma instituição estatal está distorcendo a dinâmica do mercado de ações. Em fevereiro, os ganhos do BOJ pelas participações em ETFs atingiram um recorde de US$ 149 bilhões na semana em que o índice de referência Nikkei 225 Stock Average chegou à máxima de três décadas. Esse ganho é mais que o dobro do PIB de Mianmar, país do sudeste asiático.
Não é impossível dizer que Tóquio criou uma espécie de Frankenstein monetário. Se o BOJ não tomar cuidado, o monstro ficará fora de controle e voltará para prejudicar seu criador.
O presidente do Fed, Jerome Powell, está em uma situação semelhante. Ele com certeza aprenderá logo que entrar em uma miríade de classes de ativos é uma coisa. Sair é outra completamente diferente. Se Powell tentar diminuir o ritmo, políticos, CEOs, banqueiros e investidores irão protestar.
Qualquer indício de que o Fed possa começar a encerrar a liquidez, provavelmente aceleraria a tendência de baixa do iene. As apostas de fundos de hedge contra o iene estão perto dos níveis mais altos desde o início de 2019. Parte da negatividade reflete o fluxo de caixa do Japão para M&As. O investimento direto no exterior, incluindo fusões e aquisições, saltou quase 30% entre janeiro e março, em relação ao ano anterior.
“Esperamos que a economia experimente outra contração no segundo trimestre devido às restrições estendidas, o que pesará muito, especialmente no setor de serviços”, disse Makoto Tsuchiya, da Oxford Economics.
A deflação, entretanto, é mais uma vez um risco muito maior do que o aumento dos preços. Mais uma razão para se pensar que o saldo de US$ 5 trilhões do BOJ poderá crescer – e não diminuir – à medida que o Japão busca se recuperar. Enquanto isso, os monstros criados ao longo do caminho podem aparecer no horizonte.
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