“Nosso desafio não é tão diferente daquilo que o Nubank ou a XP enfrentaram lá atrás.” É assim que o CEO Reinaldo Rabelo descreve a missão do Mercado Bitcoin, considerada a maior exchange de criptomoedas brasileira e a única do país a integrar o ranking das 60 melhores do mundo da Forbes.
A plataforma, que funciona como um marketplace onde pessoas físicas e empresas podem comprar e vender criptomoedas, aposta em educação financeira e cibersegurança para mostrar aos brasileiros que criptoativos não são coisa de outro mundo e que investimentos alternativos não são apenas para alguns poucos.
Fundado em 2013 pelos irmãos Gustavo e Maurício Chamati, o Mercado Bitcoin é dono do título de primeiro unicórnio brasileiro do universo cripto. Em julho de 2021, recebeu um aporte de US$ 200 milhões do Softbank em troca de 10% de participação – a operação avaliou a empresa em US$ 2,1 bilhões.
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Até o fim de 2020, o negócio era um case de sucesso de bootstrapping, ou seja, foi fundado com os recursos dos sócios e cresceu com reinvestimentos dos lucros da própria operação, sem aportes externos.
O Mercado Bitcoin pode não ser tão famoso quanto seus colegas do restrito clube de unicórnios brasileiros – 99, iFood, Ebanx e QuintoAndar, por exemplo – mas seus números são igualmente impressionantes. Em 2021, passaram R$ 40 bilhões pela plataforma em transações de clientes.
A Receita Federal estima que a negociação de moedas digitais movimente cerca de R$ 130 bilhões por ano no país, o que daria ao Mercado Bitcoin uma fatia de 30%. O setor é dominado por exchanges estrangeiras, que operam no Brasil sem necessariamente possuir escritórios no país ou atender à legislação local.
Em número de usuários, não fica muito atrás da Bolsa de Valores brasileira: são 3,4 milhões de “pessoas de verdade, verificadas. Não é login e senha não”, garante Rabelo. O número equivale a 80% do total de investidores em renda variável do Brasil, segundo dados de dezembro da B3.
A comparação de sua trajetória com a do Nubank e da XP é esclarecedora. Por um lado, a plataforma trabalha para superar a desconfiança natural do brasileiro com instituições financeiras novatas ou pouco conhecidas. Por outro, quer democratizar o acesso a investimentos – neste caso, alternativos – começando com as criptomoedas oferecidas na plataforma (atualmente são 40, incluindo ethereum, dogecoin, cardano e solana) e indo até NFTs (tokens não fungíveis) de precatórios, por exemplo.
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“Vivemos em um país que é ‘early adopter’ de tecnologias que impactam o dia a dia, mas é megaconservador quando se fala de investimentos e operações financeiras de grandes valores”, diz o CEO. “Nubank e XP também precisaram se mostrar tão seguros e sérios [quanto os bancos tradicionais], com uma governança tão robusta quanto, mas entregando uma experiência melhor para o consumidor.”
Esse ceticismo é ainda maior quando o tema é o mundo cripto, que é ao mesmo tempo pouco compreendido e alvo constante de atenção por histórias improváveis: investidores que se tornam milionários do dia para a noite, complexos esquemas de pirâmide que fraudam centenas de pessoas – e que têm criptomoedas só no nome.
“Um dos nossos desafios é continuar a educar sobre criptoativos e entregar informações precisas para as pessoas tomarem a decisão de participar desse ecossistema”, diz Rabelo. Um mês e alguns dias depois do anúncio do aporte do Softbank, a 2TM, holding que controla a exchange (e da qual o CEO também é sócio), anunciou a compra do site Portal do Bitcoin, especializado na cobertura jornalística do mercado de criptomoedas, blockchain e fintechs.
Em fevereiro, foi a vez da Blockchain Academy, plataforma de ensino voltada para criptoeconomia e blockchain, entrar para o portfólio da 2TM. Hoje a holding controla oito startups, entre elas a Bitrust, a primeira custodiante de criptoativos do Brasil, e a MB Digital Assets, que oferece investimentos em tokens de ativos reais, como precatórios e cotas de consórcios.
As empresas da holding, que começou com o Mercado Bitcoin, respondem por negócios específicos dentro do ecossistema de serviços financeiros. “Ao longo do tempo, a gente foi separando algumas atividades do marketplace de bitcoin em função do que o mercado precisava e do que o regulador exigia”, explica Rabelo. “A gente quer ser esse portal de acesso, essa ‘one stop shop’ para atender as pessoas e as empresas quando elas quiserem interagir com a Web3, com o metaverso, com todas essas novas tecnologias.”
A ambição da plataforma não se limita ao Brasil. Em janeiro, a 2TM adquiriu o controle da exchange portuguesa Criptoloja, a primeira a obter a licença do banco central português para atuar nessa atividade.
Chamati já mencionou, em mais de uma ocasião, planos de expansão para a América Latina, principalmente Argentina e Chile – Rabelo acrescenta Colômbia, Peru e México à lista. “Vamos fazer nossa expansão internacional por meio de aquisições. Adotamos um modelo de serviço global com atendimento local porque acreditamos que as regras podem ser esticadas, mas não descumpridas. Por isso, usamos parceiros locais para aprender todos os requisitos para atuar legalmente nesses países”, diz o CEO.
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A regulação do mercado de criptomoedas é um ponto de atenção não só para as empresas do setor, mas também para os investidores e a administração pública. Um dos dois critérios com peso em dobro no ranking da Forbes de melhores exchanges é justamente “regulação”: empresas que obtiveram licenças para operar emitidas por órgãos reguladores exigentes receberam mais pontos.
No Brasil, não há lei específica que regule o setor – as exchanges atuam sem necessidade de autorização junto à CVM ou ao Banco Central. O que não significa que elas operem à margem da lei, argumenta Rabelo. “Já existem leis suficientes para fazer o que é certo. Temos o Código Civil, o Código Tributário, Código de Defesa do Consumidor, a Lei Geral de Proteção de Dados, regras de prevenção à lavagem de dinheiro… Não preciso que seja criada uma lei dizendo que devo obedecer às leis que já existem.”
Ele acrescenta que o Mercado Bitcoin atua junto aos órgãos de defesa do consumidor e cumpre as normativas do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e da Receita Federal.
O vácuo legislativo, no entanto, gera uma concorrência desleal entre aqueles que seguem a legislação brasileira (Rabelo cita também como exemplo os concorrentes Foxbit e Bitcoin Trade) e as empresas “que se dizem ponto-com mas não respeitam nenhuma das normas”. “Empresas localizadas no Brasil que pagam impostos e cumprem diversas regras de controle naturalmente vão ficar mais caras do que as empresas que estão operando de paraísos fiscais”, diz o executivo.
Ele afirma que projetos de lei que definam os órgãos competentes para fiscalizar e regulamentar os players do mercado, como alguns dos que tramitam atualmente no Congresso, trariam mais segurança jurídica para o setor.
Reportagem publicada na edição 95, lançada em abril de 2022.
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