EXCLUSIVO: Com demanda reduzida, Azul testa fadigômetro, sistema que gerencia o cansaço da tripulação

21 de agosto de 2020

A fadiga pode gerar dificuldade de comunicação e interpretação, além de falta de atenção – três pilares essenciais para um voo ideal

Imagine dirigir um carro com sono. Agora potencialize a situação para o caso de um piloto de avião trabalhando por horas a fio sem descanso. Essa é a reflexão que o comandante e coordenador de fatores humanos da Azul, Caio Rosante Garcia, propõe ao apresentar o apoio da companhia ao Fadigômetro, projeto desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Física, Instituto de Biociências e Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo para gerenciamento dos riscos da fadiga na aviação. 

Pioneiro no mundo, o projeto foi financiado e desenvolvido em uma parceria entre o Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA), Associação Brasileira de Pilotos da Aviação Civil (ABRAPAC),  Associação dos Aeronautas da Gol (ASAGOL) e  Associação dos Tripulantes da Latam Brasil (ATL). Tem como objetivo a criação de um banco de dados sobre o estado de alerta das tripulações da aviação civil brasileira durante suas jornadas de trabalho, para identificar perigos relativos à queda do desempenho cognitivo e, assim, mitigar possíveis incidentes derivados do cansaço. Garcia conta que a Azul sempre se atentou a esse assunto, e que trabalhará em parceria com a tecnologia para que os resultados sejam cada vez melhores. 

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“Temos todo um sistema de mapeamento e organização aprovado pela ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil, no qual os pilotos podem fazer, no máximo, 90 horas em 28 dias de trabalho”, revela. Além disso, parte da organização se dá através dos horários de partida e chegada de um voo. Quando ocorrem de madrugada, os tripulantes precisam de um quadro de atividades diferenciado para repor as horas de sono perdidas em atuação. “Nós já temos uma atenção quanto a isso, mas o fadigômetro vai vir como uma ajuda extra. É um trabalho em equipe.”

Atenção humana e tecnologia de qualidade. Essa é a dupla infalível da segurança na aviação. No caso do fadigômetro, os pesquisadores começaram a mapear e analisar as escalas de trabalho dos aeronautas com a ajuda de um software de gerenciamento de fadiga humana chamado SAFTE-FAST (Sleep, Activity, Fatigue, and Task Effectiveness – Fatigue Avoidance Scheduling Tool, algo como Sono, Atividade, Fadiga e Eficácia da Tarefa – Ferramenta para Evitar a Fadiga). 

Baseado em um modelo biomatemático, o algoritmo leva em conta o processo homeostático e ritmos circadianos associados à atenção e à inércia do sono. A partir desses dados, o sistema elabora relatórios que podem ajudar a propor métodos para a análise do risco de cansaço. Com acesso às escalas de voos dos pilotos e comissários da companhia, fica ainda mais simples analisar o cenário como um todo e encaixar as peças da rotina dos tripulantes. 

“O cansaço é subjetivo, por isso trabalhamos junto com o fadigômetro, que é um sistema mais geral”, reforça o comandante. Para ele, é realmente importante que o projeto seja em equipe, inclusive com apoio dos pilotos, que possuem voz e liberdade para dizer quando estão cansados e preferem não voar – sem serem punidos com descontos na folha de pagamento. “Sabemos que isso é importante porque nosso trabalho se baseia na produtividade e o financeiro é afetado por isso, então não descontamos nada para que eles saibam que têm nosso apoio.” 

A fadiga pode gerar dificuldade de comunicação e interpretação, além de falta de atenção – três pilares essenciais para um voo ideal. “O piloto precisa prestar atenção em muitas coisas, tanto no aparelho, quanto no seu entorno. Então, uma simples distração pode colocar tudo a perder”, destaca. “A fadiga é capiciosa. As vezes o piloto nem percebe que está cansado, e quando vê é tarde demais.”

Por enquanto, durante a pandemia, esse cansaço extremo não é um problema. Com voos reduzidos, os tripulantes estão tendo cerca de 19 dias de folga com desconto de salário de 30%, mas, quando o ritmo da demanda voltar ao normal, o fadigômetro vai entrar em operação de forma efetiva, após os testes realizados neste período de fraca demanda. “A pandemia nos deu essa oportunidade. Destruíram nossa casa, mas nós estamos aproveitando para reformar alguns cômodos e voltarmos com tudo”, diz Garcia, bem humorado.

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