O potencial da tecnologia para democratizar o acesso à educação foi justamente o que atraiu Kelly ao desafio de gerir o braço social do Grupo Movile, estabelecido em 2019. A instituição quer influenciar políticas públicas para gerar oportunidades com tecnologia, e educar 1 milhão de pessoas até o final de 2021, com investimento previsto de cerca de R$ 460 mil.
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“Das mulheres de quase 40 anos com as quais convivo, sou uma exceção”, diz a executiva, lembrando da infância carente no extremo sul de São Paulo, em que a mãe vendia pão para que ela cursasse o ensino superior na Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec) – estudo que ela deu continuidade com diversos cursos de pós-graduação.
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“Meu objetivo é alcançar milhões de jovens Brasil afora, que tiveram um início de vida como o meu para que as próximas gerações não demorem tanto para conquistar as coisas”, ressalta, acrescentando que esta meta também engloba o treinamento de pessoas mais velhas, para que possam inserir-se na economia digital.
Outra frente de atuação da Fundação 1Bi é o Jornada para o Futuro, iniciativa de ensino de programação para jovens de comunidades carentes. Antes da pandemia, o projeto era conduzido nas instalações das organizações sociais parceiras, e a Fundação entrava com a metodologia, conteúdo e com o lanche para os alunos. A oportunidade para os estudantes de estagiar em uma das empresas do Grupo Movile era uma novidade para este ano, que precisou ser estacionada por conta da Covid-19.
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Segundo Kelly, a ideia é usar as lições aprendidas com o Aprendizap nos últimos anos para digitalizar o Jornada para o Futuro, e a Fundação está em discussões com entidades como a Recode, organização social carioca que disponibiliza treinamento online para diversas carreiras de tecnologia.
O Aprendizap já alcançou mais de 140 mil usuários desde sua criação, em agosto de 2019. O número representa um crescimento exponencial na adesão da plataforma, que estava em 33 mil usuários no primeiro trimestre de 2020. Comentando sobre o objetivo de chegar a 1 milhão de usuários, Kelly diz ser uma meta ambiciosa, porém possível.
“A partir do momento que entendermos todas as nuances da plataforma, conseguirmos prototipar e testar isso – e o menino em [idade pré-escolar] conseguir ser alfabetizado através do nosso aplicativo e o grande conseguir programar – conseguiremos alavancar [o alcance] para 1 milhão de pessoas”, ressalta a executiva.
“A pandemia escancarou o abismo tecnológico que o Brasil tem. Mesmo em São Paulo, vemos uma realidade muito diferente a 50 minutos da Avenida Paulista, com crianças tendo que ir a centros de educação unificada para ter acesso à tecnologia. Não vemos histórias como as de certos meninos de classe A, que com 10 anos de idade já estão programando”, diz a executiva.
Segundo Kelly, gestores públicos precisam ter uma agenda de inovação em seus planos de governo e a Fundação quer se envolver nesses debates. Essa agenda é importante para a organização não só por conta das possibilidades de educação e trabalho para a população periférica, mas para melhorar a provisão de serviços públicos.
“Se a tecnologia está disponível na periferia, é possível reduzir o número de filas de atendimento numa subprefeitura, num posto de saúde, mas precisa ter acesso a aplicativos, pontos de internet. No momento, nem as operadoras e nem o governo olham para isso”, argumenta.
Quando o assunto é a presença de mulheres em cargos seniores de empresas, em particular no setor de tecnologia, Kelly analisa a própria trajetória e acontecimentos como a eleição presidencial dos Estados Unidos, e constata que, de maneira geral, a liderança negra feminina incomoda.
“Temos que provar o tempo todo que não estamos ali através de cotas, ou porque a empresa precisa cumprir sua meta de diversidade: não, nós estamos ali porque fomos tão boas quanto [pessoas não-negras] no processo seletivo. Mas a gente sabe que o racismo estrutural não permite – e não quer – a nossa cara preta”, diz.
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“Quando a [vice-presidente eleita dos Estados Unidos] Kamala Harris discursou depois das eleições, muitas postagens nas redes sociais mostravam meninas negras observando com admiração”, lembra a executiva. “O legado que quero deixar é esse: uma história bem escrita, para que meninas possam se inspirar.”
Angelica Mari é jornalista especializada em inovação há 18 anos, com uma década de experiência em redações no Reino Unido e Estados Unidos. Colabora em inglês e português para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros.
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