Conheça Peter Rawlinson, o ex-funcionário da Tesla que pretende concorrer com Musk no setor de carros elétricos

9 de fevereiro de 2021
Noam Galai/Getty Images

Dono da Lucid Motors, Peter Rawlinson, fala no palco durante TechCrunch Disrupt, em Nova York, maio de 2017

Peter Rawlinson tem muitos objetivos para o Lucid Air. Um deles é que ele seja aclamado como o melhor carro elétrico do mundo. “Ninguém acredita em mim, mas estamos prestes a levar este tema a outro nível”, disse ele durante um bate-papo pelo Zoom na casa de fazenda de 300 anos em Warwickshire, na Inglaterra, que ele chama de casa quando não está no quartel general da Lucid Motors, no Vale do Silício.

É a mesma sensação que ele teve há uma década como engenheiro-chefe do Model S, da Tesla, o carro totalmente elétrico de Elon Musk que conquistou o mundo automotivo em 2012. “Ninguém acreditou em mim na época do Model S também. A hostilidade era imensa. Eu estou vivendo o mesmo com o Air. Ninguém acredita nele. ”

LEIA TAMBÉM: Ford acelera plano de investimento em elétricos e autônomos

A versão Dream do Air certamente parece destinada a impressionar. Ela supera o Model S ao apresentar um sistema de recarga mais rápido, capacidade de rodar 832 quilômetros com uma carga e aceleração de 0 km/h a 96 km/h em pouco mais de dois segundos. Até o final do ano, a Tesla garante que entregará a versão Plaid + do Model S com a mesma aceleração em menos de dois segundos e 836 quilômetros por carga. Os primeiros clientes do Air receberão seus carros na primavera norte-americana.

Mas as ambições de Rawlinson vão muito além de agradar os motoristas ricos com um carro de luxo de US$ 169 mil.

O maior objetivo do empreendedor é alavancar a tecnologia de propulsão de 1.080 cavalos do Air – que ele afirma ser a mais eficiente do mundo – para alimentar veículos elétricos mais baratos. Em cinco anos, Rawlinson quer vender centenas de milhares de carros elétricos de US$ 40 mil e ajudar grandes montadoras a vender esse tipo de veículo no mercado de massa – de US$ 25.000: exatamente a mesma meta que seu antigo chefe, Elon Musk, está perseguindo. Como se isso não bastasse, Rawlinson quer construir seus carros na primeira fábrica de automóveis na Arábia Saudita, rica em petróleo, cujo fundo soberano detém dois terços de sua empresa.

“Há um grande mal entendido sobre o nosso modelo de negócios”, diz o engenheiro galês de 63 anos. “Não se trata de fazer um carro caro para pessoas ricas. Não é por isso que estou aqui. Não é isso que me motiva. Quero fazer 1 milhão de carros por ano. A ambição da Lucid é ter um efeito profundo. Não somos um competidor minoritário neste setor ”

O elegante Air, com sua estrutura de alumínio esculpido e faróis “Micro Lens Array”, chega a um ponto de inflexão. É parte de uma nova onda de veículos elétricos que se beneficiam de baterias de íon-lítio mais baratas, expandindo o fornecimento global de peças para estes modelos e aumentando o interesse do consumidor – tudo isso fomentado pela Tesla. E, agora, a administração Biden diz que vai fazer dos veículos elétricos uma prioridade.

O novo presidente dos Estados Unidos já assinou ordens pressionando o governo federal a substituir os veículos movidos a combustíveis fósseis por elétricos, uma frota que totaliza centenas de milhares de carros e caminhões. Biden também prometeu construir milhares de novas estações públicas de carregamento de VEs e espera-se que os incentivos fiscais federais para compras destes carros – que estavam prescrevendo sob a administração de Donald Trump – sejam restaurados. As grandes empresas estão embarcando nessa nova onda. A General Motors já se comprometeu a fabricar apenas veículos elétricos até 2035, e a Ford e a Volkswagen também têm planos agressivos de abandonar os combustíveis fósseis.

Adam Jonas, analista da Morgan Stanley, prevê que as vendas de veículos elétricos podem saltar 50% globalmente em 2021. A Califórnia, o principal mercado dos EUA para VEs e lar de Lucid e da Tesla, é o marco zero para este boom e pode se tornar a Noruega da América para carros movidos a bateria. “Com mais de 50% de penetração de VEs, a Noruega está 15 anos à frente do resto do mundo”, diz Jonas. “A Califórnia deve se mover nessa direção rapidamente, influenciando um número significativo de outros estados norte-americanos que estão em posição de resolver o problema por conta própria em termos de descarbonização da frota.”

Por enquanto, a Lucid está começando em um ritmo moderado. Rawlinson quer fazer pelo menos 6 mil unidades do Air em uma nova fábrica em Casa Grande, Arizona, este ano, gerando potencialmente US$ 900 milhões em receita. O volume pode chegar a 25 mil unidades em 2022 com o lançamento de versões do Air a US$ 77 mil. Um crescimento adicional é esperado com a introdução, em 2023, de um crossover elétrico, provisoriamente chamado de Gravity, seguido por modelos ainda mais baratos e menores para competir com o Model 3, o mais vendido da Tesla.

VEJA MAIS: Ações de tecnologia disparam, e Elon Musk fica US$ 11,5 bilhões mais rico

Por enquanto, a empresa privada com sede em Newark, Califórnia, está pagando pelo desenvolvimento e produção do Air com um investimento de US$ 1,3 bilhão em 2018 do Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita. Além disso, outros US$ 150 milhões que a empresa havia levantado anteriormente também foram destinados ao projeto. A companhia de dados Pitchbook avalia a montadora em US$ 15 bilhões.

Mas fabricar carros é caro, e Rawlinson sabe que precisa de ainda mais dinheiro. Ele está procurando ingressar na bolsa de valores, possivelmente por meio de um SPAC (Empresa de Aquisição de Propósito Específico, em português). Embora o empreendedor já tenha, um dia, considerado esse termo um “palavrão”, agora as coisas mudaram. “Essa era a visão do financista, essa era a visão de Wall Street sobre as SPACs há não muito tempo. Um ano faz muito diferença nesse setor”, diz, sem confirmar seus planos de um possível IPO.

 

O PASSADO NA CONCORRÊNCIA

Educado no prestigiado Imperial College London da Inglaterra, Rawlinson é um veterano da Jaguar que também trabalhou em veículos avançados para a Lotus e na consultoria de engenharia da Corus antes de ingressar na Tesla. Ele fica feliz em gastar horas discutindo detalhes técnicos minuciosos e comparando sua invenção com as de outras montadoras.

Ele chegou à Tesla em 2009, quando a empresa estava saindo do status de startup, e foi promovido a vice-presidente e engenheiro-chefe do Model S em 2010. “Coloquei meu coração e minha alma naquele projeto”, conta.

Musk é famoso por ser uma pessoa difícil de trabalhar, mas Rawlinson tem muitas lembranças positivas de seus dias na empresa fundada pelo bilionário. “Nós dois ficamos obcecados em alcançar as estrelas com tecnologia e engenharia”, lembra. Rawlinson está seguindo o manual de Musk quando se trata de abrir o mercado automotivo: comece com modelos ultra luxuosos e depois vá descendo agressivamente.

O clima começou a pesar quando Musk passou a insistir que o crossover do Model X, destinado a ser uma sequência rápida do S, usasse as famosas e complexas portas dobráveis conhecidas como “asas de falcão”. A decisão do bilionário acabou atrasando o lançamento do X em cerca de dois anos e trouxe enormes custos adicionais de engenharia – exatamente como Rawlinson havia previsto.

Ele, então, deixou a Tesla em 2012 para cuidar de sua mãe doente na Inglaterra, mas um ano depois estava pronto para voltar ao trabalho. Juntou-se à Atieva, startup do Vale do Silício, como CTO, em 2013, durante a transição de um fornecedor de baterias para um fabricante de veículos elétricos. A empresa foi rebatizada de Lucid Motors no final de 2016, antes da estreia do protótipo Air, mas lutava para levantar fundos até o investimento saudita. Rawlinson, que se tornou CEO da Lucid em 2019, não quis revelar qual é sua participação.

LEIA TAMBÉM: De volta ao Twitter, Elon Musk volta sua atenção para a criptomoeda Dogecoin

É claro que a Lucid e a Tesla não são as únicas a se beneficiarem da crescente demanda por carros elétricos. A Rivian, apoiada pela Amazon, começou a entregar picapes elétricas e SUVs este ano. O famoso designer de carros Henrik Fisker deve começar a vender o Ocean, seu elegante crossover elétrico de US$ 37.499, em 2022. Há rumores constantes de que a Apple está de olho no setor. Dezenas de outros veículos elétricos estão vindo da General Motors, Volkswagen, Hyundai, Nissan e outras grandes montadoras, começando este ano com o Mustang Mach-E de alta potência da Ford.

O analista do Gartner Mike Ramsey acredita que o plano da Lucid de trabalhar seu caminho para carros mais acessíveis a partir dos ultra-premium é a abordagem certa. “O que está provado até agora sobre esta tecnologia é que a forma de entrada no mercado é pelo topo, seguida da construção de uma base de clientes leais e do prestígio e reconhecimento para se expandir.”

Musk e Rawlison compartilham a paixão pela tecnologia de veículos elétricos, mas eles não poderiam ser mais diferentes na forma como administram suas empresas. A Tesla se tornou a montadora mais valiosa do mundo, fazendo de Elon Musk a pessoa mais rica do planeta por um breve intervalo de tempo graças à sua participação na companhia – apesar de vender menos de 500 mil veículos em 2020. (Atualmente ele está na vice-liderança, com US$ 187,7 bilhões, atrás apenas de Jeff Bezos, da Amazon.) O bilionário acabou se tornando um ícone global da tecnologia, com mais de 42 milhões de seguidores no Twitter. E, para o bem ou para o mal, ele é a cara da Tesla.

O CEO da Lucid, que não tem Twitter, usa uma abordagem diferente. “Eu não sou um autocrata. A Lucid é um esforço de equipe”, diz. “Essa é uma diferença grande. Além disso, eu não espero que alguém que compre um Lucid saiba meu nome. Não espero que saibam quem é Peter Rawlinson.”

Siga FORBES Brasil nas redes sociais:

Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn

Siga Forbes Money no Telegram e tenha acesso a notícias do mercado financeiro em primeira mão

Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.

Tenha também a Forbes no Google Notícias.