A previsão de Liguori é embasada em seis anos de estudo e trabalho do médico na área. O interesse pelo assunto, ele conta à Forbes, surgiu em um congresso de cirurgia cardíaca pediátrica. “Conheci uma pesquisadora que trabalhava com vasos arteriais fabricados em laboratório. Achei aquilo incrível e vi que era o futuro da medicina”, afirma. Depois dessa primeira interação com o tema, Liguori fez um doutorado na USP com extensão na Universidade de Groningen, na Holanda. A tese que defendeu foi sobre abordagens de engenharia de tecido com foco na área cardiovascular.
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Por meio de R$ 2,1 milhões de financiamento de instituições públicas de pesquisa, como a PIPE-FAPESP (Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas), e de R$ 1,5 milhão de investimento privado, Liguori, junto ao engenheiro Emerson Moretto, conseguiu colocar o projeto da TissueLabs de pé em 2019 e, comercialmente operante, em 2020. Hoje, a companhia tem operação na incubadora Cietec, em São Paulo, onde fica a produção dos materiais e equipamentos, e na comuna de Manno, no cantão de Tessino, na Suíça, local onde fica o departamento de relacionamento com clientes e parceria de pesquisas.
BIOTINTA E BIOIMPRESSORA 3D
Partindo do primeiro gel desenvolvido por Liguori, a TissueLabs conseguiu desenvolver, em pouco tempo, um portfólio de mais de 50 produtos focados na fabricação de órgãos, divididos entre bioimpressoras 3D e as chamadas “biotintas”. “Nossos materiais para impressão de tecidos conseguem replicar exatamente as centenas e milhares de proteínas que existem na natureza, ao contrário da maioria das empresas do setor que utilizam materiais genéricos, como colágeno puro ou gelatina”, afirma o CEO. Hoje, a healthtech possui 15 tipos diferentes de tecidos – que servem para a impressão de órgãos e partes do sistema cardiovascular, respiratório e digestivo, por exemplo – e cada um deles possui de duas a três variações de gel.
Tanto as bioimpressoras 3D, quanto as biotintas, não ficam restritas apenas à TissueLabs, que comercializa esses materiais e equipamentos para outros pesquisadores. “Entendemos que se a gente se fechasse em um laboratório por uma década para desenvolver um coração artificial, não teríamos validação externa [da comunidade científica] e que corríamos o risco de perder tempo e chegar ao fim com algo pouco eficaz”, diz Liguori. Embora as tecnologias da healthtech sejam patenteadas, isso não impediu a companhia de vender seus produtos para mais de 50 laboratórios em 14 países, totalizando quase 300 pesquisadores.
Com cerca de 15 funcionários no Brasil e na Suíça, a TissueLabs tem a perspectiva de faturar R$ 2 milhões em 2021, um crescimento quatro vezes maior do que o registrado no último ano. Liguori diz que o avanço e a escalabilidade da tecnologia dependerão não só do desenvolvimento científico, mas também do quanto a companhia conseguirá captar de investimento nos próximos anos. “Hoje nosso foco de pesquisa é na área cardiovascular, mas podemos abrir nosso leque de opções, dependendo dos aportes que recebermos”, afirma. “Podemos olhar, por exemplo, para a criação de pâncreas para pacientes com diabetes. O universo de possibilidades é infinito.”
OBJETIVO DE VIDA
O grande objetivo da TissueLabs se espelha na história do seu fundador. Com poucos dias de vida, Liguori foi diagnosticado com cardiopatia congênita, uma condição que impede o coração de bombear o sangue corretamente. Aos dois anos, foi operado no Incor (Instituto do Coração) e sempre teve em mente que precisava ajudar outras crianças com a mesma complicação.
A princípio, seu desejo era ser cirurgião cardíaco, mas a paixão pela pesquisa e a engenharia de tecidos mudou o seu caminho. “Quando voltei da Holanda, tive a oportunidade de começar um laboratório de pesquisa e fiquei por dois anos focado em construir um coração bioartificial para transplante”, diz. Foi a partir desse trabalho que o primeiro gel para o desenvolvimento de tecidos por impressão foi criado, abrindo portas, pelo menos em um primeiro momento, para aplicações mais palpáveis na área cardiovascular.
Para Liguori, esse tipo de tecido, inclusive, está mais próximo de ser utilizado na prática, de maneira clínica. “Antes mesmo de um coração completo ser fabricado, nós vamos colocar no mercado produtos que vão endereçar outras necessidades, como válvulas cardíacas, vasos sanguíneos e artérias”, afirma. Nesse processo de longo prazo, mirando o órgão por completo, segundo o CEO, há muito espaço para desenvolvimento de tecnologia e a realização de pesquisas.
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