Abrahami invadiu os computadores de dois outros países hostis e obteve o poder de processamento deles para extrair os dados detidos pelo primeiro alvo. Uma obra magistral de espionagem — e precursora primitiva da computação na nuvem. Após sair da Unit 8200, Abrahami, hoje com 45 anos, foi cofundador da Wix, uma das principais plataformas de desenvolvimento de websites baseados na nuvem em nível mundial.
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Israel tem mais empresas listadas na Nasdaq do que qualquer outro país, exceto EUA e China. Ostenta mais capital de risco, mais startups e mais cientistas e profissionais de tecnologia per capita. Para compreender esses números, é necessário entender a misteriosa Unit 8200.
Pelos cálculos de FORBES, mais de mil empresas foram fundadas por egressos da 8200, como a Waze. As gigantes da tecnologia adoram devorar firmas da 8200. Só nos últimos três meses, a Microsoft comprou a empresa de privacidade de dados Adallom por 320 milhões de dólares, o Facebook adquiriu a Onavo, empresa de análises na área de mobilidade, por 150 milhões de dólares, e o PayPal arrematou a CyActive, que prevê invasões de hackers, por 60 milhões de dólares. O que vai no molho especial da 8200? Depois de falarmos com duas dúzias de veteranos, identificamos cinco ingredientes.
A seleção
Aquele momento exigiu uma reinicialização. A unidade passaria a ser conhecida por outro número aleatório, 8200. E seria totalmente dividida em departamentos, de modo que as diversas equipes da unidade não soubessem o que as outras estavam fazendo. Israel sentia que não podia mais correr o risco de depender de estranhos para ter acesso a novas tecnologias. Assim, a 8200 se transformou no polo interno de pesquisa e desenvolvimento do país.
Yair Cohen atuou por 33 anos na unidade — os últimos cinco (de 2001 a 2005) como comandante. Quando Yasser Arafat disse não estar envolvido no sequestro do navio de cruzeiros Achille Lauro, em 1985, que resultou no assassinato de um norte-americano, a 8200 apresentou o telefonema interceptado que provava o contrário.
Todo israelense passa por um processo de seleção quando está perto de se formar no ensino médio, e a 8200 tem o direito de escolher quem ela quiser. Em alguns casos, ela começa a acompanhar os recrutas quando mais jovens, através de um programa extracurricular para hackers e prodígios tecnológicos chamado Magshimim. “Harvard tem um ótimo processo de seleção, mas depende de quem se candidata”, diz Inbal Arieli, de 40 anos, que atuou na 8200 no fim dos anos 1990 e, aos 22 anos, chefiava o corpo docente da escola de treinamento de oficiais da unidade.
A cultura
O ex-comandante da 8200 Yair Cohen se lembra de uma tarefa que lhe foi atribuída no começo dos anos 1980. “Você precisa de 300 milhões de dólares, mas só tem 3 milhões”, disse o comandante dele. “Tem apenas três pessoas. E precisa tentar analisar o que acontecerá, antes que seu inimigo comece a usar esse negócio.” Quando saiu da Unit 8200, Cohen criou a divisão cibernética da Elbit Systems, uma das maiores empresas de capital aberto de Israel na área de eletrônica de defesa.
Skuler, o péssimo aluno do ensino médio, acabou por se tornar responsável por uma equipe voltada para a coleta e análise do tráfego de sinais dos inimigos de Israel, para gerar inteligência a partir desses dados brutos. “Ninguém lhe diz exatamente o que fazer”, diz Skuler, hoje com 39 anos. “Eles dizem: ‘Este é o problema. Vá solucionar’. Com um prazo maluco! Então você inventa, empreende, e só entende o que está fazendo depois.”
Na 8200, se os soldados acham que as decisões de seus superiores estão erradas, eles podem ignorar as patentes e procurar o comandante da unidade toda. Skuler uma vez se viu sozinho “no campo”, falando ao telefone com “os principais tomadores de decisões do país”, porque eles queriam saber a visão pessoal dele sobre algo que ele tinha descoberto. “Isso foi quando eu tinha 19 anos.”
Depois que Kira Radinsky fez seu treinamento militar inicial na 8200, ela passou para um grupo ainda mais sigiloso dentro da operação, a Unit 81, cujo foco é fornecer novas tecnologias (tipicamente produtos integrados de hardware e software) a soldados de combate. “A unidade é como uma fábrica de brinquedos de inteligência”, diz Melman, o jornalista coautor de Spies Against Armageddon: Inside Israel’s Secret Wars.
Radinsky se lembra de trabalhar com colegas “absurdamente incríveis — gente que começou a estudar em universidades aos 15 anos”. “Porém, na universidade, os alunos são responsáveis só por si mesmos. Em Israel, vidas dependem de soluções da 8200 e da 81. E essa é a motivação.” Radinsky, de 29 anos, que ficou na Unit 81 de 2004 a 2007, recorda turnos de 24 a 28 horas em “operações especiais” — quando ela e seus companheiros se revezavam para dormir no escritório — ou ao fazer seu trabalho técnico “no campo”. Depois de servir, ela levou para o setor privado sua experiência em situações de vida ou morte. Na Microsoft, desenvolveu algoritmos que permitiram prever o primeiro surto de cólera em 130 anos (em Cuba). Agora, ela cofundou uma empresa, a SalesPredict, que fornece análise preditiva de retenção de vendas — e que conta com egressos da 8200.
A Rotatividade
Ele é uma fortaleza quando se trata de discutir algo que fez na 8200. Mas há uma coisa que ele divulga: a rotatividade na unidade. Com um tempo de serviço médio de quatro anos, essa operação técnica avançadíssima tem uma rotatividade anual de 25% — um ativo excelente, segundo Zafrir, no veloz mundo da tecnologia. A alta rotatividade obriga as equipes a exercer disciplina nos projetos de produtos e sistemas. Como muitos dos desenvolvedores não estarão por lá para ver suas invenções entrarem em operação, elas têm de ser construídas de maneira que permitam que os novatos trabalhem com elas. E a rotatividade é uma via de duas mãos. Assim como todos os outros veteranos das FDI, os egressos da 8200 devem atuar como reservas por até três semanas por ano. Assim, os veteranos da 8200 dão uma espiada nas últimas tecnologias desenvolvidas por seus jovens sucessores. É a segurança cibernética de Israel como o suprassumo da educação continuada.
A rede
O pai de Elad Benjamin, Menashe, passou um quarto de século na Unit 8200, onde comandou uma subdivisão, e depois abriu uma desenvolvedora de software de imagiologia médica. “Se não tivesse levado o que levou da 8200, acho que teria tido dificuldade para abrir sua empresa”, diz Elad, 41 anos, que sente o mesmo com relação à sua própria startup, também do ramo médico. Mas a coisa é bem mais profunda. Quando a empresa de Menashe foi vendida à Kodak, ela tinha 55 funcionários — um terço dos quais era egresso da 8200. Da mesma forma, cerca da metade dos atuais funcionários de Elad é da 8200.
Esse modo de recrutar elimina várias etapas. “Você sabe que está obtendo uma combinação de alto nível de confiança e alto nível de habilidade com elas”, diz. “São pessoas de 24 anos de idade que acabaram de passar os últimos cinco ou seis anos lidando com situações, produtos e sistemas ativos, críticos, do mundo real. O que eles fizeram é real. Não é teórico.”