Carolyn Rafaelian, fundadora da Alex and Ani, é demitida da própria empresa

3 de novembro de 2020
David Livingston/Getty Images

A Alex and Ani surgiu oficialmente no interior da fábrica do pai de Carolyn

Há apenas dois anos, a fundadora da Alex and Ani, Carolyn Rafaelian, estava sentada em sua casa arejada com tema náutico, em Venice Beach, socializando com um dos maiores artistas do hip-hop. Durante um café com O’Shea Jackson Sênior, mais conhecido como Ice Cube, a joalheira traçava planos para uma oferta audaciosa de US$ 10 bilhões por quase duas dezenas de redes regionais de TV a cabo de esportes da 21st Century Fox. Carolyn, que havia investido na liga de basquete de Ice Cube, composta principalmente de ex-jogadores da NBA, estava pronta para comprometer US$ 1 bilhão em investimentos, apostando todo o seu então estimado patrimônio líquido.

Aquele negócio improvável nunca aconteceu. A dupla foi superada pelo Sinclair Broadcast Group. No entanto, Carolyn acabou sendo perdoada por desejar que seu dinheiro estivesse no canal esportivo local e não na fabricante de pulseiras de Rhode Island, Alex and Ani, que fundou em 2004.

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Foram dois anos terríveis, realmente ruins para a empreendedora e sua grife de joias celestiais. A Alex and Ani viu sua linha de crédito cortada, as vendas despencaram e pelo menos duas ações judiciais foram movidas. A empresária foi forçada a desistir de um terço de sua participação na joalheria. Ela foi primeiro convidada a deixar o cargo de CEO e, em seguida, afirma ter sido demitida como designer. Seu patrimônio líquido caiu de US$ 1 bilhão em junho de 2018 para cerca de US$ 100 milhões. (Não se sinta mal, ela ainda possui pelo menos uma dúzia de casas, em Rhode Island, Nova York e Venice Beach, Califórnia).

Essa é uma reviravolta dramática para Carolyn, que apareceu na capa da edição da Forbes das mulheres self-made mais ricas dos Estados Unidos em junho de 2017. Naquela época, a Alex and Ani estava arrecadando receitas estimadas em US$ 500 milhões. Em 2019, havia caído para perto de US$ 400 milhões, isso antes da pandemia. Carolyn, de 54 anos, mudou-se. Uma semana atrás, em frente a uma lareira acesa em sua mansão Belcourt em Newport, Rhode Island, ela anunciou, por meio de um vídeo no Instagram, que não prestaria mais seus serviços de designer para a empresa que fundou.

“Estou animada para dizer a todos que comecei uma nova empresa chamada Metal Alchemist, onde pretendo dar continuidade a todo o amor, esforço e designs que representam coisas realmente importantes para mim, como o Fundo Armênia”, disse ela, cujos avós eram imigrantes armênios. A joalheira, que se recusou a comentar sobre esta história, foi vaga nos detalhes e o site da Metal Alchemist dá poucas informações adicionais, embora pareça ter lançamentos programados para a temporada de férias deste ano.

Os problemas de Carolyn se tornaram públicos pela primeira vez em julho de 2019, quando a Alex and Ani, batizado com o nome de suas duas filhas mais velhas, entrou com um processo de discriminação de gênero contra um de seus credores, o Bank of America, buscando US$ 1,1 bilhão em danos. A empresa alegou que a instituição financeira a tratou de forma diferente porque era liderada por mulheres, especificamente por cortar a linha de crédito rotativo em dezembro de 2018, depois que executiva assumiu o cargo de diretora financeira. Como resultado, alegou a empresa, as vendas caíram cerca de US$ 80 milhões depois que ela deixou de pagar aos fornecedores, o que por sua vez atrasou o lançamento de produtos. Também disse, no processo, que sua avaliação caiu em centenas de milhões de dólares e que a moral e a produtividade dos funcionários foram afetados.

Menos de um mês depois, a Alex and Ani desistiu do processo. Seu advogado alegou que a empresa havia chegado a uma resolução confidencial. Um porta-voz do Bank of America disse à Forbes que o banco não fez nenhum pagamento e que a grife retirou o processo voluntariamente.

Quase imediatamente após o arquivamento da ação, a empresa de investimentos londrina Lion Capital – que na época possuía 40% de Alex and Ani – interveio e negociou com o banco, que alegou que a joalheria estava inadimplente em uma linha de crédito de US$ 100 milhões. O representantes da companhia de joias não foram encontrados para comentar.

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Na reestruturação que se seguiu, Carolyn abriu mão de 20% da empresa, reduzindo sua participação para 41% e aumentando a da Lion’s para 59%. Em troca, ela afirma, a Lion Capital concordou em financiar dois novos negócios de até US$ 1 milhão por ano durante dois anos. Sem estar mais no controle, a empreendedora deixou o cargo de CEO em setembro de 2019 e se tornou diretora de criação. Ela foi demitida dessa função em 8 de maio, exatamente quando a empresa começou a ter dificuldades com a pandemia. Ela abriu um processo contra a Lion Capital em junho, alegando decumprimento da promessa de financiar seus novos empreendimentos. A investidora, que entrou com uma moção para rejeitar o processo, recusou-se a comentar. O caso ainda está pendente.

Todas essas disputas jurídicas estavam acontecendo no pior momento imaginável. A Covid-19 bateu forte na Alex and Ani. Já saindo de moda antes do início do isolamento social, as vendas caíram 60% nos 12 meses que antecederam agosto, de acordo com a empresa de análise de dados Earnest Research. “As joias, como a maioria dos itens supérfluos não são para uso doméstico, fitness e atletismo, encontraram-se em um beco sem saída: qual é a motivação para comprar se você não tem ocasião para usá-las?”, pergunta Simeon Siegel, analista sênior na BMO Capital Markets.

“Eu moro em Rhode Island e você nem ouve mais falar da Alex and Ani”, diz Dana DiPaolo, que trabalhou na empresa como diretora do laboratório de inovação de 2011 a 2014 e dá crédito a Carolyn pelo bom trabalho na produção de pulseiras. “Quando você olha para a Alex and Ani agora vê apenas uma marca de qualquer outra joalheria por aí. As peças são  genéricas e não têm significado.”

Tem sido uma série de eventos infelizes, mas Carolyn não costuma atribuir acontecimentos ao azar. “Acredito que coincidências não existem: tudo é estrategicamente e divinamente coordenado”, disse ela certa vez à Forbes. Uma mestre do marketing que afirmava que suas joias estavam imbuídas de uma energia capaz de ter um efeito positivo em quem as usasse – ela tinha um padre e um xamã abençoando seu estoque -, Carolyn construiu sua fortuna vendendo milhares de pulseiras que comemoravam tudo, de aniversários e graduações a signos do zodíaco, passando por totens religiosos.

“Quando estava no auge, você ia ao Dunkin’ Donuts e a pessoa que trabalhava no drive-thru não conseguia tirar o braço da janela porque tinha 15 pulseiras Alex and Ani no braço”, diz Dana. “Houve muito burburinho sobre a marca.”

O crescimento do negócio representou uma grande mudança na vida de Carolyn. Seu pai fazia bijuterias de todos os tipos, mas era mais conhecido pelos broches com a bandeira norte-americana que vendia no atacado.

A Alex and Ani surgiu oficialmente no interior da fábrica de seu pai em Cranston, Rhode Island, em 2004. Seu design exclusivo foi uma pulseira de arame expansível, que ela patenteou no mesmo ano. O negócio cresceu de forma constante e abriu sua primeira loja de varejo, em Newport, em 2009. Mas não decolou até que Carolyn trouxe Giovanni Feroce, um ex-senador do estado de Rhode Island com formação em óculos, como CEO, em 2010. Negócios com lojas de departamento também ajudaram, incluindo a Saks Fifth Avenue, seguido por acordos de licenciamento com Walt Disney, National Football League e os Marines. As vendas saltaram de US$ 5 milhões quando Feroce entrou para US$ 230 milhões três anos depois.

“Qualquer coisa, o setor comercial, o Super Bowl, os locais da Main Street, a grande maioria das contratações. Tudo. Todas essas mudanças. Cada uma delas fui eu que fiz”, diz Feroce.

Um ex-executivo descreve Feroce e Carolyn como “óleo e água de maneira saudável”. Mas, apesar do que parecia uma parceria vitoriosa, Feroce diz que foi afastado em 2014, embora não revele o motivo, e que muitos de seus contratados deixaram a empresa logo depois. 

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Seu substituto foi Harlan Kent, ex-CEO da Yankee Candle. Kent durou menos de um ano. Sua substituta, Cindy DiPietrantonio, saiu após um ano. Em dezembro de 2017, a empresa contratou Andrea Ruda, então com 26 anos, como diretora financeira, cujo papel esteve no cerne do processo por discriminação de gênero contra o Bank of America.

Foi um nível épico de instabilidade executiva para uma empresa já sujeita aos caprichos da moda adolescente. Por enquanto, uma versão silenciosa da Alex and Ani está sobrevivendo à pandemia sem Carolyn Rafaelian. E alguns acham que esse é o melhor cenário.

“Quando se trata de criatividade, acho que Carolyn pode ser uma das melhores do mundo”, diz Feroce. “Quando se trata de gestão de negócios e liderança empresarial ou liderança corporativa, ela nunca sugeriu nada que mostrasse as habilidades necessárias para dirigir uma empresa de bilhões de dólares.”

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